Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

sexta-feira, 17 de setembro de 2010

A grande guerra


Não é uma eleição que está em jogo.

O que está em jogo é que o país Brasil escolheu ser, neste momento tão decisivo de sua história.
Charge : Sinfrônio - Diário do Nordeste (CE)



A grande guerra

Miriam Leitão

Fontes: Blog de Miriam Leitão

A demissão de Erenice Guerra do cargo de ministra-chefe da Casa Civil não desobriga o governo de investigar o caso. Ele tem indícios escabrosos de tráfico de influência no coração do governo e está ligado a uma pessoa que desde 2002 tem trabalhado diretamente com a candidata Dilma Rousseff.

Erenice é o elo entre este governo e o que pode ser o próximo.

É preciso entender o que houve.

Há casos que começam simples e só com o tempo se complicam. Esse estourou já num grau de complexidade espantoso.

A ex-ministra parecia ser um consórcio: dois filhos, dois irmãos, irmã, ex-cunhada, assessor, mãe de assessor, irmão da mãe de assessor, marido, todos de alguma forma envolvidos em negócios ou conflito de interesses dentro do governo.


Sua primeira reação, quando começaram a ser publicados os abundantes indícios de irregularidades que a cercavam, foi fazer uma nota com timbre e autoridade do Palácio do Planalto acusando o candidato adversário de ser "aético e derrotado".
Mais uma inconveniência no meio de tantas, porque o primeiro a fazer era se explicar ao cidadão e contribuinte brasileiro.


Mas essa nota foi mais uma prova de que o Brasil não tem mais governo, tem um comitê eleitoral em plena e intensa atividade.

A demissão de Erenice, que ninguém se engane, não é um tardio ataque de moralidade.

É o resultado de um cálculo eleitoral.


A dúvida era o que poderia atingir a candidata Dilma Rousseff — manter Erenice, insistindo na tese de que ela era vítima de uma jogada eleitoral, ou demiti-la para tentar reduzir o interesse no caso?


Nada do que foi divulgado pode acontecer num governo sério.

Filhos de ministra não podem intermediar negócios, não podem cobrar "taxas de sucesso";

assessor de ministra não pode ser filho da dona da empresa que faz a defesa de interesses dentro do governo;

marido da ministra não pode estar num cargo público que dê a ele o poder de decidir sobre o fechamento do contrato que está sendo negociado.

Ministra não faz essas estranhas reuniões com fornecedores do governo.

Há outras impropriedades, mas fiquemos nessas primeiras.


A manchete da Folha de ontem trouxe a arrasadora entrevista de um empresário que, munido de e-mails e cópias de contratos, diz que foi vítima de tentativa de extorsão ao pedir um empréstimo no BNDES.

Além das taxas variadas e dos milhões que ele afirma ter sido pedido para a campanha da candidata do governo, chegou a ser pedido 5% num empréstimo de R$ 9 bilhões. Se ele fosse concedido, isso seria R$ 450 milhões.


Erenice Guerra trabalhou com Dilma Rousseff desde a transição, foi seu braço-direito, a enviada especial a missões difíceis, a pessoa a quem ela entregou o cargo quando saiu, em quem tinha absoluta confiança.

O vínculo não é criado pela imprensa, não é ilação, são os fatos.

Esse não é o caso apenas do filho de uma ex-assessora, como Dilma disse no seu último debate.

Esse é um conjunto assustador de indícios de um comportamento totalmente condenável no trato da questão pública.


Não é importante quem ganha a eleição.

É importante como se ganha a eleição.

A democracia estabelece que o vencedor é aquele que tem mais votos e ponto final.

Cabe aos eleitores dos outros candidatos respeitar a pessoa eleita, a estrutura de poder que ele representa e torcer pelo novo governo.

Portanto, ao vencedor, o poder da República por um mandato.


O problema é quando um grupo, para se manter no poder, usa a máquina pública como se fosse de um partido, quando um governo inteiro se empenha apenas em defender uma candidatura, e não o interesse coletivo, quando sinais grosseiros de mau comportamento são tratados com desleixo pelas maiores autoridades do país, sob o argumento de que se trata de uma briguinha eleitoral.


Nada do que tem acontecido ultimamente é aceitável num país de democracia jovem, instituições ainda não inteiramente consolidadas e desenvolvidas.

Não importa quem vai ser eleito este ano, o que não pode acontecer é o país considerar normal esse tipo de comportamento que virou rotina nos últimos dias.


As atitudes diárias do presidente da República demonstram que oito anos não foram o bastante para ele entender a fronteira entre o interesse coletivo e o do seu partido;

entre ser o governante de todos os brasileiros e o chefe de campanha da sua escolhida;

entre popularidade e indulgência plenária para todo o tipo de comportamento inadequado.


O país pode sair desta eleição derrotado em seu projeto, o único projeto que é de todos os brasileiros: o de construir uma democracia sólida, instituições permanentes e a concórdia entre os brasileiros.


O caso Erenice Guerra é assustador demais para ser varrido para debaixo do tapete.

Os indícios são de que a punição aos envolvidos no escândalo do mensalão, que agora respondem na Justiça por seus atos, não mudaram os padrões de comportamento dentro do governo.


A Casa Civil não pode estar sempre no noticiário de escândalos. É, na definição da candidata Dilma Rousseff, o segundo mais importante cargo do governo.


Se é tudo isso, que se faça uma investigação do que havia por lá. Mas que não seja mais um "doa a quem doer" de fantasia; que não seja a apuração que nada apura, que perde prazos, que confunde e acoberta.


Não é uma eleição que está em jogo. Ela pode já estar até definida a esta altura, com tanta vantagem da candidata governista a 15 dias da eleição.

O que está em jogo é que o país Brasil escolheu ser, neste momento tão decisivo de sua história.


Essa é a verdadeira guerra.

thepassiranews

17/09/2010

0 comentários: