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quinta-feira, 29 de maio de 2014

Mudança de regime por decreto


Editorial


O Estado de S.Paulo

A presidente Dilma Rousseff quer modificar o sistema brasileiro de governo. Desistiu da Assembleia Constituinte para a reforma política - ideia nascida de supetão ante as manifestações de junho passado e que felizmente nem chegou a sair do casulo - e agora tenta por decreto mudar a ordem constitucional. O Decreto 8.243, de 23 de maio de 2014, que cria a Política Nacional de Participação Social (PNPS) e o Sistema Nacional de Participação Social (SNPS), é um conjunto de barbaridades jurídicas, ainda que possa soar, numa leitura desatenta, como uma resposta aos difusos anseios das ruas. Na realidade é o mais puro oportunismo, aproveitando os ventos do momento para impor velhas pretensões do PT, sempre rejeitadas pela Nação, a respeito do que membros desse partido entendem que deva ser uma democracia.

A fórmula não é muito original. O decreto cria um sistema para que a "sociedade civil" participe diretamente em "todos os órgãos e entidades da administração pública federal direta e indireta", e também nas agências reguladoras, através de conselhos, comissões, conferências, ouvidorias, mesas de diálogo, etc. Tudo isso tem, segundo o decreto, o objetivo de "consolidar a participação social como método de governo". Ora, a participação social numa democracia representativa se dá através dos seus representantes no Congresso, legitimamente eleitos. O que se vê é que a companheira Dilma não concorda com o sistema representativo brasileiro, definido pela Assembleia Constituinte de 1988, e quer, por decreto, instituir outra fonte de poder: a "participação direta".

Não se trata de um ato ingênuo, como se a Presidência da República tivesse descoberto uma nova forma de fazer democracia, mais aberta e menos "burocrática". O Decreto 8.243, apesar das suas palavras de efeito, tem - isso sim - um efeito profundamente antidemocrático. Ele fere o princípio básico da igualdade democrática ("uma pessoa, um voto") ao propiciar que alguns determinados cidadãos, aqueles que são politicamente alinhados a uma ideia, sejam mais ouvidos.

A participação em movimentos sociais, em si legítima, não pode significar um aumento do poder político institucional, que é o que em outras palavras estabelece o tal decreto. Institucionaliza-se assim a desigualdade, especialmente quando o Partido (leia-se, o Governo) subvenciona e controla esses "movimentos sociais".

O grande desafio da democracia - e, ao mesmo tempo, o grande mérito da democracia representativa - é dar voz a todos os cidadãos, com independência da sua atuação e do seu grau de conscientização. Não há cidadãos de primeira e de segunda categoria, discriminação que por decreto a presidente Dilma Rousseff pretende instituir, ao criar canais específicos para que uns sejam mais ouvidos do que outros. Ou ela acha que a maioria dos brasileiros, que trabalha a semana inteira, terá tempo para participar de todas essas audiências, comissões, conselhos e mesas de diálogo?

Ao longo do decreto fica explícito o sofisma que o sustenta: a ideia de que os "movimentos sociais" são a mais pura manifestação da democracia. A História mostra o contrário. Onde não há a institucionalização do poder, há a institucionalização da lei do mais forte. Por isso, o Estado Democrático de Direito significou um enorme passo civilizatório, ao institucionalizar no voto individual e secreto a origem do poder estatal. Quando se criam canais paralelos de poder, não legitimados pelas urnas, inverte-se a lógica do sistema. No mínimo, a companheira Dilma e os seus amigos precisariam para esse novo arranjo de uma nova Constituição, que já não seria democrática. No entanto, tiveram o descaramento de fazê-lo por decreto.

Querem reprisar o engodo totalitário, vendendo um mundo romântico, mas entregando o mais frio e cinzento dos mundos, onde uns poucos pretendem dominar muitos. Em resumo: é mais um ato inconstitucional da presidente Dilma. Que o Congresso esteja atento - não apenas o STF, para declarar a inconstitucionalidade do decreto -, já que a mensagem subliminar em toda essa história é a de que o Poder Legislativo é dispensável.

29 de maio de 2014

quarta-feira, 28 de maio de 2014

Governo escala 'tropa de choque' para controlar deputados rebeldes na CPI


Apesar da ampla maioria governista, comissão mista terá a presença de deputados considerados rebeldes pelo Palácio do Planalto

Laryssa Borges, de Brasília

 
SAIU DO PAPEL – Deputados e senadores instalam a CPI mista da Petrobras no Congresso
(Pedro França/Ag. Senado)


Com maioria das cadeiras, mas receoso pela presença de deputados rebeldes de sua base, o Palácio do Planalto conseguiu emplacar três "cães de guarda" no comando da CPI mista (com a presença de deputados e senadores) da Petrobras. A exemplo da comissão que investiga a estatal no Senado, Vital do Rêgo (PMDB-PB) também presidirá a CPI mista, e outros dois governistas fieis, o deputado Marco Maia (PT-RS) e o senado Gim Argelo (PTB-DF), ficarão com a relatoria e a vice-presidência, respectivamente.

A CPI terá ainda a presença de petistas escalados para blindar a investigação, como Sibá Machado (AC) e os ex-ministros Iriny Lopes (ES) e Afonso Florence (BA).

A instalação da CPI mista ocorre após uma intensa disputa judicial e regimental. O governo tentou a todo custo barrar a abertura da comissão por causa da instabilidade de sua base na Câmara. “Hoje, os olhos da nação estão postos sobre esta Casa e sobre esta comissão. Há 45 dias, foi lido requerimento de instalação desta CPI, que só está sendo instalada a partir do esforço hercúleo da oposição”, disse o senador Aécio Neves (PSDB-MG), um dos principais articuladores da instalação da CPI mista.

A avaliação da oposição é que, embora o grupo de investigação seja majoritariamente governista, deputados considerados rebeldes ao Palácio do Planalto, e parlamentares que ainda negociam a formação de palanques estaduais nas eleições de outubro, podem não seguir as orientações do Executivo e provocar desgastes ao governo. Das 32 vagas na CPI mista, os partidos governistas têm 24 cadeiras, contra oito da oposição.

São considerados "titulares-problema" da CPMI os deputados Eduardo Cunha (PMDB-RJ) e Lúcio Vieira Lima (PMDB-BA), Bernardo Santana de Vasconcellos (PR-MG), que recentemente organizou um ato de apoio à candidatura do ex-presidente Lula, além do autointitulado “independente” Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP). Também há situações como a do pedetista Enio Bacci (PDT-RS), que apresentou candidatura avulsa à presidência da CPMI e cujo partido é rival do PT no seu Estado.

A oposição agora tentará aprovar as convocações do ex-diretor da Área Internacional da Petrobras Nestor Cerveró, do doleiro Alberto Youssef e do ex-diretor da Petrobras Paulo Roberto Costa, além das propostas de quebra de sigilo fiscal, bancário e telefônico. Depois de abandonar a CPI da Petrobras no Senado para pressionar a instalação da comissão mista, a oposição também pretende sugerir a criação de quatro subcomissões para apurar, em eixos separados, irregularidades envolvendo a Petrobras e a SBM offshore, a compra de refinarias, a construção de plataformas incompletas e a aquisição da refinaria de Pasadena, no Texas.


28/05/2014

No dia em que a herdeira dos gigolôs da bola anunciou a consumação do roubo, o confronto entre o exército da selva e a PM piorou o que já era um programa de índio


Por Augusto Nunes
Foto: Rodrigues Pozzebom/Agência Brasil

Até os tufos de grama dos estádios superfaturados sabiam que a Copa do Mundo tem tudo para virar um tremendo programa de índio. Mas nem o mais finório dos cartolas poderia imaginar que, nesta terça-feira, os antigos donos da terra conseguiriam piorar o que já parecia exemplarmente ruim. Como informa o site de VEJA, a proeza foi consumada pelo inverossímil combate travado nas cercanias do Estádio Mané Garrincha por uma tropa de 400 índios e um pelotão formado por 500 integrantes da PM de Brasília.

Segundo os caciques de uma certa Mobilização Nacional Indígena, os combatentes compostos por recrutas originários de 100 tribos distintas pretendiam apenas “entregar uma taça de sangue” a algum figurão do governo federal, num ato de protesto contra mortes de caciques atribuídas a policiais. Os planos mudaram quando os guerreiros que misturavam cocares com tênis ou saiotes típicos com calças jeans toparam com bando de civis que marchavam sobre uma das arenas mais caras do mundo para outra manifestação contra a gastança da Copa.

Para impedir que os inimigos se aproximassem do local onde está em exposição a taça que será entregue ao vencedor do certame, soldados a cavalo e índios pintados com as tintas da guerra protagonizaram a versão brasileiríssima de um espetáculo que só pode ser visto em velhos faroestes ou na Disneyworld. A diferença estava no armamento: as bombas de gás lacrimogêneo e as balas de borracha usadas pela PM eram tão reais quanto os arcos e flechas sobraçados pela infantaria da selva. No Twitter, a página do Conselho Indigenista Missionário garantiu que três índios foram feridos. Uma foto exibida pela PM atesta que pelo menos um fardado foi atingido por uma flechada.

As imagens do conflito, transmitido ao vivo por emissoras de TV e já noticiado com destaque pela imprensa internacional, vão exigir acrobacias retóricas especialmente ousadas dos espertalhões que miraram nas urnas e acertaram o próprio pé. Principal responsável pela transformação do Brasil em província provisória da Fifa, Lula logo estará recitando mais uma vigarice panglossiana. Talvez enxergue no episódio uma prova contundente de que, ao contrário do que ocorreu nos Estados Unidos, aqui os índios são uma espécie em expansão. Talvez prefira jurar que tudo não passou de uma inventiva homenagem a Garrincha, o mais famoso descendente de índios da história do futebol.

Se os caçadores de votos são forçados a correr atrás do prejuízo, os mais notórios caçadores de dólares já dormem em paz. “O que tinha que ser gasto, roubado, já foi”, informou há poucas horas Joana Havelange. Eis aí o que se pode qualificar de “fonte bem informada”. Mais que integrante do comitê local da Copa, Joana é filha de Ricardo Teixeira, que hoje gasta em Miami o que embolsou enquanto presidiu a CBF, e neta de João Havelange, o ex-chefão da Fifa que transformou a dona do futebol mundial na Casa da Moeda dos Supercartolas. Esses se afastaram da cena do crime antes da chegada do camburão.

Continuam em ação os que, além de muito dinheiro, querem ganhar a eleição. De olho na divisão do produto do roubo, podem perder a chance de escapar. E nunca estiveram tão perto de cair fora do poder.
Foto: Laycer Tomaz/Câmara dos Deputados

28/05/2014


Quem foi que disse que a “nova classe média” não se importa com a qualidade dos serviços?




Por Rodrigo Constantino
 
A “nova classe média” está feliz com esse tratamento?

“Se o João é um cara pobre, está feliz; o João do meio da distribuição também está, talvez nem tanto quanto o primo pobre dele. Agora, o primo rico tem todas as razões para não estar gostando muito da situação. Além de a renda dele não estar crescendo muito, ele está tendo problemas, como ter que dividir aeroporto com quem nunca fez check-in, enfrentar engarrafamento com mais carros nas ruas. Os dados mostram que existe uma transformação profunda, não percebida por quem está em cima.”

Quem disse tal barbaridade acima foi o economista Marcelo Neri, ministro da Secretaria de Assuntos Estratégicos, em entrevista recente ao GLOBO. O governo Dilma tem endossado este mito, de que os “ricos” estariam incomodados porque houve um grande crescimento no acesso aos mesmos serviços por parte dos mais pobres, aqueles que formam a “nova classe média”. Mas faz algum sentido isso?

Claro que não. Como tudo aquilo que vem do PT, isso não passa de um engodo, de mais uma mentira que procura segregar a população brasileira entre “pobres” e “ricos”, colocando uns contra os outros. Quem foi que disse que a “nova classe média” não se importa com a qualidade dos serviços? Quer dizer então que aqueles milhares nas ruas em junho de 2013 eram todos “ricos”? Conta outra!

Tem sido vergonhosa a postura de Marcelo Neri, ao emprestar seu nome a esse projeto nefasto de poder do PT. O economista deveria lembrar que a ascensão dos mais pobres não precisaria e nem deveria se configurar em um estorvo para os mais ricos ou mesmo para a classe média. Todos os países desenvolvidos do “primeiro mundo” são bem mais ricos do que o Brasil, e nem por isso o acesso dos mais pobres aos mesmos serviços representa um incômodo às elites.

Marcelo Neri já deve ter visitado muitos aeroportos nos Estados Unidos, na Europa e na Ásia. Deve ter visto milhares de pessoas circulando por eles, de todas as classes. Nem por isso há a mesma lentidão, precariedade e burocracia dos nossos aeroportos administrados pela estatal Infraero. Dividir os aeroportos com quem tem menos dinheiro não é problema algum; encarar aeroportos sem ar condicionado, banheiro decente e conforto, isso sim, é um problema, tanto para ricos como para pobres.

O mesmo vale para o trânsito. É verdade que houve um crescimento acelerado da frota de automóveis, em boa parte pelos subsídios e estímulos irresponsáveis do próprio governo. Seria natural algum aumento no engarrafamento. Mas não na proporção que vimos. Isso já é culpa da falta de planejamento e investimento do governo.

Em países mais ricos, quase todos possuem carros, mas nem por isso vemos o mesmo trânsito que temos no Brasil. As estradas são muito melhores, o transporte público é decente, e inclusive os mais ricos dividem com os mais pobres o mesmo metrô sem problema algum, pois se trata de um metrô limpo e que funciona direito.

Como fica claro, o problema não está em ricos e pobres dividirem o mesmo ambiente, utilizarem o mesmo serviço; o problema está na qualidade do serviço em si, que costuma ser precária quando se trata de Brasil. Quem foi às ruas protestar pertencia a todas as classes. Ricos e pobres estão cansados da incompetência e corrupção deste governo.

Essa narrativa fantástica produzida por Marcelo Neri não cola, não se sustenta, não encontra respaldo nos fatos. Todos nós queremos um retorno melhor para a quantidade absurda e imoral de impostos que pagamos. E quase todos estamos insatisfeitos, como mostram as pesquisas de opinião, com cerca de 70% demandando mudanças. Será que o Brasil, por acaso, tem 70% de ricos?
28/05/2014