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sábado, 6 de março de 2010

A soberba e as urnas tendem a não andar juntas.

À espera do voo tucano

A ascensão de Dilma Rousseff e a pressão do PSDB para antecipar a candidatura não alteram os planos de Serra para a sucessão.

Ele decola oficialmente em abril – e ainda sonha ter Aécio como vice
Otávio Cabral
Fotos Charles Silva Duarte/Folhapress e Alex de Jesus/AE
MÃOS À OBRA
Serra e Aécio seguem conversando sobre uma candidatura com o mineiro na vicena solenidade de inauguração do novo centro administrativo: "Se alguém me convencer,obviamente tenho de avaliar", diz Aécio

O governador de São Paulo, José Serra, esteve em nove eventos públicos na semana passada. Foi saudado como o candidato dos tucanos, discursou como o candidato dos tucanos, posou como o candidato dos tucanos, mas não anunciou formalmente sua entrada na disputa.
Ele o fará até o início de abril.

Adiar o máximo possível a decisão exasperou seus aliados. Aos olhos de Serra, porém, a estratégia se justificou. Ela o poupou por mais tempo de ser alvo preferencial de ataques, com o consequente desgaste natural que isso acarreta a quem, como ele, lidera as pesquisas de intenção de voto.
A candidata oficial, Dilma Rousseff, está em campanha há quase dois anos e já aparece nas pesquisas a apenas 4 pontos do governador.

Mas nem mesmo isso acelerou os planos de Serra. Ele se manteve fiel ao cronograma original desenhado em sua cabeça no ano passado. Essa é a parte da estratégia tucana que parece estar sob controle.
O que claramente não está é a composição da chapa que vai disputar a eleição com Dilma Rousseff neste ano. Isso ficou evidente na principal incursão de Serra na semana passada – a tentativa de convencer o governador Aécio Neves a aceitar a candidatura à Vice-Presidência.

Um bom desempenho em Minas, o segundo maior colégio eleitoral do país, com 14 milhões de votos, é fundamental para os tucanos, que pretendem compensar no Sudeste a montanha de votos que Lula provavelmente transmitirá para a candidatura da ministra Dilma.

Alistar Aécio como segundo nome da chapa tucana é, como dizem os mineiros, fácil ou impossível. Governador em segundo mandato, com aprovação expressiva em Minas, Aécio tinha legítima intenção de ser o candidato do PSDB à Presidência.

Desistiu oficialmente em dezembro passado.
O convite formal para Aécio Neves ingressar na chapa como candidato a vice-presidente foi feito pelo governador paulista durante uma longa conversa que os dois tiveram em Brasília na quarta-feira passada, que invadiu a madrugada.

Segundo aliados de Serra, no cardápio apresentado para tentar seduzir Aécio, ele ofereceu o óbvio: espaços amplos de atuação ao vice – ou seja, ministérios – num eventual governo tucano.

Quais ministérios?
Não se chegou a esses detalhes.

Serra disse que, uma vez presidente, sua prioridade de reforma política será acabar com a reeleição, restabelecendo o mandato único de cinco anos – a valer para o seu sucessor. Assim, Aécio poderia ser candidato à Presidência já em 2015.
O governador de Minas não se rendeu aos argumentos de Serra. Repetiu ao colega paulista o que vem dizendo em público – que poderia ajudar mais ficando em Minas Gerais e pedindo votos para o PSDB e que vai arregaçar as mangas, sim, para ajudar a elegê-lo o próximo presidente.

Como se vê, eles têm objetivos comuns, mas caminhos diferentes.
Dirigentes tucanos, entre eles o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, acreditam que ainda há tempo para contornar a intransigência do governador mineiro. Não é uma aposta desprovida de sentido.

As comemorações do centenário de Tancredo Neves, o político que devolveu a democracia ao país, são uma amostra de como o jogo ainda está indefinido.

Avô de Aécio, com quem o governador aprendeu a fazer política, o ex-presidente foi homenageado em Minas Gerais em uma solenidade de contornos épicos. A efeméride foi claramente planejada para ressaltar o vigor político do anfitrião, Aécio Neves.

Seu ápice foi a inauguração de um conglomerado administrativo que reunirá 16 000 servidores públicos do governo mineiro, obra projetada pelo arquiteto Oscar Niemeyer e que custou 1,2 bilhão de reais. Serra foi tratado pelo dono da festa como candidato. No fim, indagado mais uma vez sobre a possibilidade de integrar a chapa presidencial, deixou as portas abertas:

"O homem público que não resiste a pressões não merece fazer política. Sou um homem de convicções. Tenho as minhas. Enquanto elas não se alterarem, caminho no meu rumo. Se alguém me convencer do contrário, obviamente tenho de avaliar".

Como se vê, será fácil ou impossível para Serra ter Aécio como vice.
A campanha presidencial de José Serra enfrenta desafios dentro e fora do ninho tucano. Enquanto o palanque de Dilma Rousseff já abriga mais de uma dezena de partidos, Serra, até agora, conta apenas com o nanico PPS e o enrolado DEM, chamuscado pelo escândalo de corrupção que levou o único governador eleito pela sigla, José Roberto Arruda, à cadeia.

Se o tucanato não conseguir mesmo convencer Aécio a marchar com Serra, o mais provável é que a vaga de vice seja ocupada por outro tucano. Qual? Ninguém sabe.

Um dos nomes estudados é o senador Tasso Jereissati. Cearense, governador por três mandatos, Tasso é uma alternativa para tentar neutralizar a força eleitoral de Dilma e seu padrinho, o presidente Lula, no Nordeste. Mas nem isso é certo. Jereissati teve quase 2 milhões de votos no Ceará quando se elegeu senador, mas está longe de ser um dínamo com repercussão nacional como Aécio.

A última vez que Tasso foi testado nas urnas foi em 2002, há quase oito anos.

"O cenário é preocupante para os tucanos. Aécio Neves como vice em sua chapa pode ajudar, mas o efeito será mínimo até que Serra se assuma, de maneira indubitável, como candidato", diz o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília.
Serra até agora não deu demonstrações públicas de esmorecimento. Mas, como ocorre com qualquer pessoa, o governador paulista também viveu momentos de aparente dúvida. O mais recente, na semana do Carnaval. A um tucano influente, o governador reclamou que estava se sentindo abandonado por uma parte do PSDB. Nas duas últimas eleições presidenciais, de fato, o partido pouco se empenhou para derrotar Lula.

A maior parte dos dirigentes tucanos acabou priorizando seus próprios interesses regionais em detrimento da campanha presidencial da sigla. Agora mesmo, há sinais no céu de que o problema pode se repetir, como a falta de palanques para Serra em estados importantes como Amazonas, Ceará e Santa Catarina.

As dificuldades levaram o governador paulista a cogitar em desistir da campanha presidencial para concorrer à reeleição em São Paulo. Mudou de ideia ao ser convencido de que a desistência poderia se transformar em um "suicídio político". Sua debandada, ouviu do amigo, poderia ser muito mal recebida até pelos paulistas e provocar sua derrota na disputa pela reeleição. Obteve a garantia de que o partido estaria com ele.
Convicto de que não há mais espaço para recuo, Serra decidiu se dedicar ao cronograma planejado anteriormente. O tucano pretende mesmo anunciar sua candidatura até abril, apesar das pressões do próprio partido para que isso aconteça antes.

O crescimento das intenções de voto na ministra Dilma e a euforia que ele provocou, segundo os estrategistas tucanos, já eram esperados graças à enorme exposição pública da petista ao lado do presidente.

O problema é que isso também pode acabar produzindo efeitos colaterais que costumam se mostrar devastadores em qualquer campanha. No Palácio do Planalto já se fala em vitória no primeiro turno.

Tanto que está definido que a ministra não participará de debates com adversários e que priorizará entrevistas com temas predeterminados, que deixem a polêmica do lado de fora. Pode ser uma simples estratégia para mostrar otimismo ao grande público, mas não é o que parece.

Nos bastidores, a candidata já está fazendo sondagens entre os aliados do partido para compor o futuro ministério, o que costuma despertar outros instintos capitais no mundo político.

Nas últimas duas semanas, o coordenador da campanha da ministra, o ex-prefeito Fernando Pimentel, foi alvo de uma série de acusações, entre elas a de envolvimento no famoso esquema do mensalão.

Políticos próximos a ele atribuem a origem das denúncias a petistas que vislumbram pela primeira vez a possibilidade de uma vitória e que querem tomar seu lugar de olho, novamente, no futuro governo.

"Agora só nos resta evitar derrapadas que impeçam a ministra de vencer",
analisa um dos coordenadores de sua campanha.
A soberba e as urnas tendem a não andar juntas.

Alex de Jesus/AE
HERANÇA DE PESO
Comemoração do centenário de Tancredo Neves em Minas: a sucessão de Lula pode ser definida no estado

"Os fatos são irrefutáveis"

Campanha com verba pública

Ronaldo Soares
Wilton Junior/AE
Denunciados
Garotinho e Rosinha: contratos fajutos e empresas-fantasma



Rafael Campos

321 000 reais
na conta-corrente

A atriz Deborah Secco:
o pai dela era o operador
do esquema que
desviava verbas

Com uma trajetória pública marcada pelo populismo, por práticas fraudulentas e até por um processo em que responde por formação de quadrilha armada, o ex-governador Anthony Garotinho (PR-RJ) está enredado em mais um escândalo de corrupção, trazido à tona pelo Ministério Público do Rio de Janeiro na semana passada.

O esquema chama atenção por envolver e beneficiar, diretamente, a ele próprio e sua mulher, Rosinha – ambos denunciados com mais 86 nomes, entre eles o da atriz Deborah Secco, todos com os bens bloqueados pela Justiça.

A investigação concluiu que, durante os quatro anos do governo de Rosinha, 58 milhões de reais foram surrupiados dos cofres do estado, dos quais 600 000 reais seguiram para o caixa da pré-campanha de Garotinho.

Ele planejava sair candidato nas eleições presidenciais de 2006, mas, sob acusações variadas e depois de uma greve de fome que o expôs ao ridículo, acabou fora do páreo.

Diz a VEJA o promotor Eduardo Carvalho, à frente do caso:

"Poucas vezes numa investigação dessas foi possível rastrear o caminho do dinheiro desviado com tamanha precisão e riqueza de detalhes.
Os fatos são irrefutáveis".

O próximo passo do Ministério Público será apurar se houve participação de líderes evangélicos no esquema, sobre a qual há indícios.

Já está bem claro, no entanto, de onde as verbas do estado eram subtraídas e como, depois, chegavam à campanha de Garotinho e ao bolso dos demais envolvidos.

A operação tinha como ponto de partida a Fundação Escola de Serviço Público (Fesp), órgão do próprio governo estadual ao qual Rosinha autorizou, por lei, contratar serviços terceirizados – repassados a ONGs – para atender às várias secretarias.

Essas ONGs, por sua vez, forjavam contratos com empresas, pelo menos três delas de fachada, para executar projetos que jamais saíram do papel.

O Ministério Público concluiu que o operador do esquema era Ricardo Secco, pai da atriz Deborah Secco.

As contas-correntes dela registram depósitos provenientes de duas dessas empresas, no valor de 321 000 reais.

Defende-se a atriz: "Nunca tive nenhum envolvimento com política. De minha parte, estou inteiramente tranquila".

Com a denúncia, Garotinho, que até então se apresentava como candidato ao governo do estado, e Rosinha, atual prefeita da cidade de Campos, perigam ter, enfim, seus direitos políticos cassados na próxima década.

06 de março de 2010

A casa caiu

A casa caiu

O Ministério Público quebra sigilo da Bancoop e descobre que dirigentes da Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo lesaram milhares de associados, para montar um esquema de desvio de dinheiro que abasteceu a campanha de Lula em 2002 e encheu os bolsos de dirigentes do PT
.

Eles sacaram ao menos 31 milhões de reais
na boca do caixa
Por Laura Diniz
Montagem sobre foto Jose Meirelles Passos/ Ag. O Globo
NÃO É SÓ A BARBA QUE LEMBRA O ANTECESSOR
João Vaccari, o novo tesoureiro do PT, é o homem por trás do esquema Bancoop, diz o Ministério Público

Depois de quase três anos de investigação, o Ministério Público de São Paulo finalmente conseguiu pôr as mãos na caixa-preta que promete desvendar um dos mais espantosos esquemas de desvio de dinheiro perpetrados pelo núcleo duro do Partido dos Trabalhadore
s: o esquema Bancoop.

Desde 2005, a sigla para Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo virou um pesadelo para milhares de associados.
Criada com a promessa de entregar imóveis 40% mais baratos que os de mercado, ela deixou, no lugar dos apartamentos, um rastro de escombros.

Pelo menos 400 famílias movem processos contra a cooperativa, alegando que, mesmo tendo quitado o valor integral dos imóveis, não só deixaram de recebê-los como passaram a ver as prestações se multiplicar a ponto de levá-las à ruína (
veja depoimentos).

Agora, começa-se a entender por quê
.

Na semana passada, chegaram às mãos do promotor José Carlos Blat mais de 8 000 páginas de registros de transações bancárias realizadas pela Bancoop entre 2001 e 2008.

O que elas revelam é que, nas mãos de dirigentes petistas, a cooperativa se transformou num manancial de dinheiro destinado a encher os bolsos de seus diretores e a abastecer campanhas eleitorais do partido.

"A Bancoop é hoje uma organização criminosa cuja função principal é captar recursos para o caixa dois do PT e que ajudou a financiar inclusive a campanha de Lula à Presidência em 2002."

Na sexta-feira, o promotor pediu à Justiça o bloqueio das contas da Bancoop e a quebra de sigilo bancário daquele que ele considera ser o principal responsável pelo esquema de desvio de dinheiro da cooperativa, seu ex-diretor financeiro e ex-presidente João Vaccari Neto.

Vaccari acaba de ser nomeado o novo tesoureiro do PT e, como tal, deve cuidar das finanças da campanha eleitoral de Dilma Rousseff à Presidência.



VEJA TAMBÉM
Quadro: O esquema Bancoop

Revista Veja
06 de março de 2010

"A Bancoop virou organização criminosa" - PROMOTOR BLAT



Um dos dados mais estarrecedores que emergem dos extratos bancários analisados pelo MP é o milionário volume de saques em dinheiro feitos por meio de cheques emitidos pela Bancoop para ela mesma ou para seu banco:


31 milhões de reais só na pequena amostragem analisada.

O uso de cheques como esses é uma estratégia comum nos casos em que não se quer revelar o destino do dinheiro. Até agora, o MP conseguiu esquadrinhar um terço das ordens de pagamento do lote de trinta volumes recebidos.

Metade desses documentos obedecia ao padrão destinado a permitir saques anônimos. Já outros cheques encontrados, totalizando 10 milhões de reais e compreendidos no período de 2003 a 2005, tiveram destino bem explícito:

o bolso de quatro dirigentes da cooperativa, o ex-presidente Luiz Eduardo Malheiro e os ex-diretores Alessandro Robson Bernardino, Marcelo Rinaldo e Tomas Edson Botelho Fraga –
os três primeiros mortos em um acidente de carro em 2004 em Petrolina (PE). Eles eram donos da Germany Empreiteira, cujo único cliente conhecido era a própria Bancoop.

Segundo o engenheiro Ricardo Luiz do Carmo, que foi responsável por todas as construções da cooperativa, as notas emitidas pela Germany para a Bancoop eram superfaturadas em 20%.

A favor da empreiteira, no entanto, pode-se dizer que ela ao menos existia de fato. De acordo com a mesma testemunha, não era o caso da empresa de "consultoria contábil" Mizu, por exemplo, pertencente aos mesmos dirigentes da Bancoop e em cuja contabilidade o MP encontrou, até o momento, seis saídas de dinheiro referentes ao ano de 2002 com a rubrica "doação PT", no valor total de 43 200 reais.

Até setembro do ano passado, a lei não autorizava cooperativas a fazer doações eleitorais.

Outro frequente agraciado com cheques da Bancoop tornou-se nacionalmente conhecido na esteira de um dos últimos escândalos que envolveram o partido.

Freud "Aloprado" Godoy – ex-segurança das

campanhas do presidente Lula, homem "da cozinha" do PT e um dos pivôs do caso da compra do falso dossiê contra tucanos na campanha de 2006 – recebeu, por meio da empresa que dirigia até o ano passado, onze cheques totalizando 1,5 milhão de reais, datados entre 2005 e 2006.

Nesse período, a Caso Sistemas de Segurança, nome da sua empresa, funcionava no número 89 da Rua Alberto Frediani, em Santana do Parnaíba, segundo registro da Junta Comercial.

Vizinhos dizem que, além da placa com o nome da firma, nada indicava que houvesse qualquer atividade por lá.

O único funcionário visível da Caso era um rapaz que vinha semanalmente recolher as correspondências num carro popular azul.


Hoje, a Caso se transferiu para uma casa no município de Santo André, na região do ABC.

Depoimentos colhidos pelo MP ao longo dos últimos dois anos já atestavam que o dinheiro da Bancoop havia servido para abastecer a campanha petista de 2002 que levou Lula à Presidência da República (veja o quadro).

VEJA ouviu uma das testemunhas, Andy Roberto, que trabalhou como segurança da Bancoop e de Luiz Malheiro entre 2001 e 2005.

Em depoimento ao MP, Roberto afirmou que Malheiro, o ex-presidente morto da Bancoop, entregava envelopes de dinheiro diretamente a Vaccari, então presidente do Sindicato dos Bancários e indicado como o responsável pelo recolhimento da caixinha de campanha de Lula.

Em entrevista a VEJA, Roberto não repetiu a afirmação categoricamente, mas disse estar convicto de que isso ocorria e relatou como, mesmo depois da eleição de Lula, entre 2003 e 2004, quantias semanais de dinheiro continuaram saindo de uma agência Bradesco do Viaduto do Chá, centro de São Paulo, supostamente para o Sindicato dos Bancários, então presidido por Vaccari.

"A gente ia no banco e buscava pacotes, duas pessoas escoltando uma terceira."

Os pacotes, afirmou, eram entregues à secretária de Luiz Malheiro, que os entregava ao chefe.

"Quando essas operações aconteciam, com certeza, em algum horário daquele dia, o Malheiro ia até o Sindicato dos Bancários.

Ou, então, se encontrava com o Vaccari em algum lugar."


Os depoimentos colhidos pelo MP indicam que o esquema de desvio de dinheiro da Bancoop obedeceu a uma trajetória que já se tornou um clássico petista.

Começou para abastecer campanhas eleitorais do partido e acabou servindo para atender a interesses particulares de petistas.

Entre os cheques em poder do MP, por exemplo, está um em que a empresa Mizu, de "consultoria contábil", doa 7 000 reais a um certo Centro Espírita Redenção, em 2003.

Muitas vezes, dirigentes da Bancoop nem se preocuparam em usar as empresas "prestadoras de serviços" que montaram com o objetivo de sugar a coo-perativa para esconder sua ganância.

O MP encontrou quatro cheques da Bancoop, totalizando 35 000 reais, para uma ONG de Luiz Malheiro em São Vicente dedicada a deficientes auditivos – curiosamente, o mesmo endereço do centro espírita.

Os cheques foram emitidos entre novembro de 2003 e março de 2005.



Tanta lambança, aliada a uma gestão ruinosa, fez com que a Bancoop mergulhasse num estado de pré-liquidação. Em 2004, com Lula já eleito, Luiz Malheiro foi pedir ao "chefe" Berzoini, então ministro do Trabalho, "ajuda" para reerguer a cooperativa.

Quem relatou o episódio ao MP foi seu irmão, Hélio Malheiro.

Em 2008, dizendo-se sob ameaça de morte, Hélio Malheiro ingressou no Programa de Proteção à Testemunhas da secretaria estadual de justiça de São Paulo, no qual se encontra até hoje.


Em dezembro de 2004, depois que Luiz Malheiro já havia morrido, a "ajuda" chegou à Bancoop.

Com apoio de Berzoini e corretagem da Planner (investigada pela CPI dos Correios sob a acusação de ter causado um prejuízo de 4 milhões de reais ao fundo de pensão da Serpro), a cooperativa associou-se a um Fundo de Investimentos em Direito Creditórios (FIDC), entidade que negocia recebíveis, e captou 43 milhões de reais no mercado – 85% dos papéis foram adquiridos por fundos de pensão de estatais controlados por petistas ligados ao grupo de Berzoini e Vaccari.

O investimento resultou na abertura de um inquérito pela Polícia Federal por suspeita de que os fundos de pensão teriam sido prejudicados para favorecer a Bancoop.


O PROMOTOR BLAT
"A Bancoop virou organização criminosa"

João Vaccari Neto é do tipo que se orgulha de ser chamado de "um petista histórico", o que, no jargão do partido, significa, entre outras coisas, que ganhou boa parte da vida dirigindo entidades de classe e do partido.

Aos 19 anos, começou a trabalhar como escriturário do Banespa. Ficou lá apenas dois anos. Depois disso, entrou no sindicato de sua categoria e nunca mais pegou no pesado.

Participou de três diretorias da Central Única dos Trabalhadores (CUT), foi secretário de relações internacionais da entidade e presidiu o Dieese.

Atuou sempre como braço de apoio de Berzoini, a quem sucedeu na presidência do Sindicato dos Bancários de São Paulo em 1998. Apesar de não ter a projeção política do amigo, Vaccari conquistou a amizade de Lula, coisa que Berzoini jamais conseguiu obter.



Vaccari, como mostra agora a investigação do MP, tem mais em comum com seu antecessor, Delúbio Soares, do que a barba grisalha.

E, como Freud Godoy, está mergulhado até os últimos e ralos fios de cabelo no escândalo dos aloprados (veja o quadro abaixo).


Há duas semanas, um juiz de primeira instância contrariou decisão do Tribunal Superior Eleitoral e determinou a cassação do prefeito de São Paulo, Gilberto Kassab, por suposto recebimento ilegal de doação de campanha.

A sentença, que colocou em risco a segurança jurídica, foi suspensa. Na semana passada, o TSE divulgou as regras que vão orientar as eleições deste ano.

São medidas moralizadoras, que incluem a obrigatoriedade da divulgação de quaisquer processos ou acusações criminais que pesem sobre o candidato e que dificultam manobras de doadores que tenham por finalidade esconder a origem do dinheiro.

Tudo isso mostra quanto o país está interessado em aprimorar seu sistema de financiamento eleitoral e proteger-se dos efeitos tão deletérios como conhecidos que sua distorção pode causar.

Ao indicar pessoalmente alguém com o prontuário de João Vaccari para tomar conta das finanças do PT e da campanha eleitoral de Dilma Rousseff, o presidente Lula sinaliza que, ao contrário do resto do Brasil, não está nem um pouco empenhado em colaborar na faxina.



06 de março de 2010

Quem deu o dinheiro para o dossiê dos aloprados?

Uma pergunta que continua no ar


Quem deu o dinheiro para o dossiê dos aloprados?
Entre os envolvidos, Vaccari era o único sentado numa montanha de reais
Patricia Santos/AE
A TROCO DE QUÊ?
Lacerda (à dir.) ligou para Vaccari uma hora depois de entregar o dinheiro que pagaria o dossiê

João Vaccari Neto e Freud Godoy, envolvidos agora no esquema Bancoop, já atuaram juntos em passado recente. Pelo menos é o que sugere o registro dos telefonemas trocados pela dupla às vésperas do estouro do escândalo dos "aloprados" – como ficaram conhecidos os petistas apontados pela Polícia Federal como integrantes da quadrilha que tentou comprar um dossiê supostamente comprometedor para tucanos durante a campanha presidencial de 2006.

No caso de Vaccari, então presidente da Bancoop, os vestígios de participação no caso guardam cheiro de tinta fresca.


Foi para ele que Hamilton Lacerda – na ocasião coordenador de comunicação da campanha do senador Aloizio Mercadante – telefonou uma hora antes de fazer a entrega de parte do 1,7 milhão de reais que seria usado para comprar o dossiê.


O episódio teve início quando a família de Luiz Antônio Vedoin, chefe da máfia dos sanguessugas, ofereceu a petistas documentos que supostamente comprometeriam tucanos.


Deles, faria parte uma entrevista em que os Vedoin acusariam o candidato do PSDB, José Serra, de envolvimento na máfia que distribuía dinheiro a políticos em troca de emendas ao Orçamento para compras de ambulância.


Ricardo Berzoini, então presidente do PT, foi acusado de ter dado a autorização para a compra do dossiê.

Valdebran Padilha da Silva, filiado ao PT do Mato Grosso, e Gedimar Pereira Passos, advogado e ex-policial federal, seriam os encarregados de pagar os Vedoin com o dinheiro levado por Hamilton Lacerda.


Valdebran e Gedimar foram presos pela PF num hotel Íbis, em São Paulo, depois de terem recebido o dinheiro de Lacerda e antes de entregá-lo aos Vedoin.


Jorge Lorenzetti, churrasqueiro do presidente Lula, e Oswaldo Bargas, ex-secretário de Berzoini no Ministério do Trabalho, também estiveram envolvidos no episódio.


Eles tentaram negociar com a revista Época uma entrevista em que os Vedoin fariam falsas acusações de corrupção contra Serra.


A entrevista acabou sendo publicada pela revista Istoé.



Nas investigações que se seguiram à prisão de Valdebran e Gedimar, a PF identificou uma intensa troca de telefonemas entre os envolvidos, incluindo diversas ligações de Berzoini para a empresa Caso Sistemas de Segurança, hoje em nome da mulher de Freud Godoy.

Godoy seria o contato de Gedimar no alto escalão do PT.

Quanto a Vaccari, bem, até onde se sabe, era o único dos aloprados que estava sentado sobre uma montanha de dinheiro, a Bancoop.

O fato de Hamilton Lacerda ter ligado para ele logo depois de ter cumprido a sua missão faz fervilhar a imaginação dos que até hoje se perguntam:

de onde, afinal, veio o dinheiro dos aloprados?


Fotos Celso Junior/AE

ALOPRANDO
Lorenzetti (à dir.) e Gedimar (À ESQ.): a trapalhada terminou em prisão. Mas agora eles estão livres, leves e soltos
06 de março de 2010

Desde 2005, a sigla para Cooperativa Habitacional dos Bancários de São Paulo virou um pesadelo para milhares de associados.

Pelo menos 400 famílias movem processos contra a cooperativa, alegando que, mesmo tendo quitado o valor integral dos imóveis, não só deixaram de recebê-los como passaram a ver as prestações se multiplicar a ponto de levá-las à ruína (veja depoimentos abaixo).

Agora, começa-se a entender por quê.

O PAVOR DO DESPEJO
Manoel Marques
"O sindicato sempre foi um defensor da minha classe. Por isso, na hora de fazer um financiamento com eles, não tive dúvidas. Comecei a pagar um apartamento de 45 000 reais em 1997. Suei para honrar as prestações. Vendia coxinha e bolo para complementar a renda. Esse imóvel representava muito para a minha família.

Onde morávamos, meus filhos dormiam na sala. Em 2000, quitei o apartamento e nós nos mudamos. Seis anos depois, porém, passei a receber boletos com o valor de 470 reais. Eles diziam que precisavam cobrir gastos excedentes. Até pagaria, se pudesse. Mas a minha renda era de 600 reais. Em 2008, a Bancoop entrou com uma ação de despejo contra mim. Ela não foi concluída, mas, desde então, vivo o pesadelo de eles tirarem o meu único bem material. Durmo sob o efeito de calmantes."



Maria de Fátima Bonfim,

de 55 anos, bancária aposentada

CALOTE DUPLO

Roberto Setton
"Conheci a Bancoop em 2004, quando vi uma placa de propaganda em frente a um terreno vazio. Eles iriam construir um imóvel perto da minha casa. Achei a oportunidade ótima: o preço era bom e a instituição tinha credibilidade. Demos nossa economia de 10 000 reais de entrada e passamos a pagar as prestações.

Alguns meses depois, porém, desconfiei do empreendimento. Eu passava em frente ao terreno e não via nenhum pedreiro lá. Diziam sempre que a construção estava para começar. Não acreditei e consegui transferir o dinheiro que havia investido para outro imóvel deles. Dessa vez escolhi um local cuja construção já estava pela metade.

Como fui inocente... Esse imóvel também nunca foi concluído. Empatamos 80 000 reais nessa história. Não confio mais nas instituições."


A advogada Tânia de Oliveira, de 42 anos,
com o marido, Heleno, e a filha Helena

SEM FORÇAS

Alexandre Schneider
"Aos 43 anos, decidi dar um grande passo: comprar meu primeiro imóvel. Usei os 20 000 reais que havia juntado e entrei no financiamento de um apartamento de 60 000 reais. As prestações eram metade do meu salário. Um dia, recebi uma cobrança extra de 1 800 reais. Seria a primeira de muitas. Tive de tirar um empréstimo bancário.

Em dois anos, estava endividado, mas havia quitado meu imóvel. Sentia-me orgulhoso – jamais atrasei uma parcela. Mas em 2005, enquanto esperava o sorteio das chaves, soube que a Bancoop não estava honrando seus compromissos com muitos cooperados. Eu era um deles. Meu imóvel nunca saiu do chão.

No início, briguei, participei de protestos vestido de palhaço. Há dois anos, recebi o diagnóstico de câncer de pulmão, o que me deixou sem forças para lutar.

Perdi as esperanças."


Oscar Costa, 52 anos, bancário aposentado

Com reportagem de Adriana Dias Lopes, Vinícius Segalla, Kalleo Coura, André Eler e Marina Yamaoka


Revista Veja
06 de março de 2010

Entre Aspas debate indecisão do PSDB em definir sua chapa


Analistas do cenário político acreditam que a demora em assumir a candidatura à presidência é parte de uma estratégia eleitoral.

Indefinição tucana poderia atrapalhar a oposição ao governo.
Com Reinaldo Azevedo

Está todo mundo nervoso com José Serra? Ótimo!

Divirtam-se ou morram de ódio.

Por CORONEL
José Serra (PSDB-SP) tem o total domínio da situação.

É isto que está irritando a todos, por todos os lados.

Serra pode desistir? Pode!

Alguém pode fazer qualquer coisa antes que ele desista?

Não pode!

José Serra tem algum adversário à sua altura no PSDB ou na oposição? Tinha, não tem mais. O adversário correu da briga, mijou para trás, como se diz na gíria, não teve a frieza suficiente para encarar a luta democrática e, também, a luta surda da política.

Queria ombros. Chapéus jogados para o alto. Ovação. Babação. Não viram? José Serra agora tem todo o direito de agir dentro do seu próprio cronograma, pois é ele, somente ele e uma pequena equipe, quem vai arcar com todas as conseqüências.

Ainda faltam sete meses para as eleições.

Enquanto José Serra não for para as ruas, só existem pesquisas, levantamentos, números voláteis.

Está todo mundo nervoso com José Serra?

Ótimo!

Agora ele manda, não pede. E não tem caciquinho por aí que possa encará-lo fora da fofoca, da maledicência e do tiro pelas costas.

José Serra é o melhor que a oposição tem.

Querem encarar o careca?
 
Vão trabalhar, vão ter votos, vão ter competência.

A última do Serra? Lá vai:

"Pegamos o Dose Certa com menos de 40 medicamentos e vamos deixar com mais de 70."

Ao ser perguntado se deixaria o governo, corrigiu.

"Eu quis dizer no período deste governo."

O Zé está se divertindo. Bem feito para quem não tem peito e nem cacife para azedar-lhe o bom humor.

Ainda faltam sete meses.

As "melancias" querem o seu lugar na carroça.

Estão com pressa.

Menos Zé.

Bem que faz!

Recado


Avisem a esse senhor que ele foi eleito para ser o presidente do Brasil e não para ser cabo eleitoral de guerrilheira.

Respeite a Instituição Presidência da República, senhor Lula da Silva.


João Silva

Rio de Janeiro - RJ

sexta-feira, 5 de março de 2010

Segredos e intrigas, amigos e inimigos no almoço de Aécio

Aécio Neves conversa com os senadores Agripino Maia (DEM) e Tasso Jereissati (PSDB)
(foto: Leo Drumond)
Por Bob Fernandes

Ciro Gomes, PSB, pré-candidato a presidente da República, passa rente a José Serra, PSDB, pré-candidato a presidente da República. Ambos não se cumprimentam, sequer se olham.


Aécio Neves, PSDB, governador de Minas Gerais, abraça José Alencar, PRB, vice presidente da República, e lhe sussurra algo.

Geraldo Alckmin, PSDB, ex-governador e pré-candidato a governador de São Paulo, conversa com Rodrigo Maia e ACM Neto, o presidente e o deputado do DEM, enquanto Sérgio Guerra, presidente do PSDB, cochicha com os senadores Tasso Jereissati, possível candidato a vice-presidente pelo PSDB, e Agripino Maia, líder DEM. Antonio Anastasia, vice-governador de Minas e candidato a suceder Aécio, aproxima-se do governador e do vice-presidente da República.

Os garçons servem champanhe a ministros dos tribunais superiores, o cantor Fagner gargalha, o senador Wellington Salgado escreve uma mensagem no Livro dos Convidados.

Os ternos, quase todos em azul marinho. As gravatas, quase todas vermelhas.

É o bailado da sucessão presidencial de 2010.

O segundo grande ato da sucessão, este executado na tarde da quinta-feira 4 de março no Palácio da Liberdade, construção de 1897 encravada no coração de Belo Horizonte.

O primeiro ato se deu, semanas antes, na Convenção do PT que ungiu Dilma Rousseff candidata à presidência República.

Nesta quinta-feira o PSDB pretendia iniciar o seu ATO I, com o anúncio da chapa puro-sangue José Serra-Aécio Neves. Não conseguiu fazê-lo, e no almoço oferecido por Aécio as coxias fervilham.

Ainda ecoa, repercute entre os convivas, o coro de milhares de pessoas na Cidade Administrativa Tancredo Neves, inaugurada instantes atrás:
- Aécio presidente! Aécio presidente!

Coro entoado na presença de José Serra, o pré-candidato tucano à sucessão de Lula.

Aécio Neves recebe seus convidados à porta do elevador interno do Palácio ou à beira da escadaria art nouveau fundida na Bélg
ica.

Os governadores de Minas e São Paulo, Aécio Neves e José Serra, o governador de Santa Catarina, Luiz Henrique da Silveira (PMDB),e o senador Casildo Maldaner (DEM/SC)
(foto: Wellington Pedro
)
Mesas postas em três salões por onde se formam e desmancham rodas de conversas e cochichos.

Ciro Gomes, provocado, diz que ele e Serra acabaram de se cumprimentar:
- Nos cumprimentamos cordialmente como deve ser com dois rapazes educados...

(pausa)

-... uns mais educados do que outros.

Ciro e Serra não se falam, não se olham nos primeiros passos do dueto.

Serra, à soleira da porta que leva à sacada do Palácio da Liberdade, onde confabulam ACM Neto e Rodrigo Maia.

Ciro, a menos de dois metros do governador de São Paulo, conversa com o irmão, Cid, governador do Ceará. Cid recorda o pai José Euclides Ferreira Gomes e filosofa:
- Como meu pai dizia, às vezes os prognósticos são apenas a expressão dos nossos desejos...

Ciro expõe o seu prognóstico. Ou desejo, como diria o velho José Euclides:
- Serra está vivendo um drama humano, isso é profundamente humano: a dúvida, a angústia de saber se vai ou não vai, e ele...

Ciro acha, ao menos diz de público, que Serra não vai.

Fiel ao seu estilo, o pré-candidato do PSB aproxima-se de Rodrigo Maia e ACM Neto e brinca:
- Como é que vocês, dois jovens, ficam com "O Coiso" e não comigo?

Sorrisos amarelos dos jovens DEM. Cara de paisagem de uma involuntária testemunha da cena; Geraldo Alckmin gostaria de não estar ali, mas Ciro aponta para o ex-governador enquanto dirige-se à dupla DEM:
- Ele fica p... da vida quando eu faço isso.

Mãos cruzadas abaixo da cintura, Alckmin vê-se obrigado a abandonar a paisagem. Sorri, discretamente.

Aécio passa por Serra e chega à sacada. Cumprimenta Maia e ACM Neto, puxa Ciro para o lado e com ele confabula por minutos.

Os garçons enchem taças. Segue o bailado da sucessão 2010.

Cabe a José Alencar a primeira mensagem no Livro dedicado ao dia, data do Centenário de Tancredo, da inauguração da Cidade Administrativa que leva seu nome, e data da chapa que não nasceu, a puro-sangue do PSDB.

Sucessão à tucanos. Com dois candidatos e ainda sem nenhum.

Horas antes, sob o arco desenhado por Oscar Niemeyer para a Cidade Administrativa, o coro:
- Aécio presidente! Aécio presidente!

Não uma, mas duas vezes. No segundo ensaio do coro, já no palco, capacete na cabeça e ladeado por alguns dos 13.048 operários da obra monumental, Aécio sorriu e com as mãos fez o gesto de "manera, manera". Foi atendido e o coro se esvaziou.

E Serra, o que teria pensado ao ouvir o estrondoso clamor de Minas à sua volta?

Ele não ouviu:
- ... Gritos? Eu estava ocupado na hora, não prestei atenção, nem percebi...

Segue o bailado.

Serra exercita a arte da abstração. Por exatos seis minutos e 45 segundos escreve uma mensagem para Aécio Neves.

No Livro, a ele oferecido por Dona Jovi, funcionária do Cerimonial, o governador de São Paulo constrói a mensagem. Caneta na mão direita, pensativo, Serra escreve o que a história registrará:
- Ao governador Aécio, sua equipe e os mineiros e mineiras, meu abraço e meu contentamento pela "Cidade" Tancredo Neves e por todo o notável avanço de Minas Gerais na direção do desenvolvimento, da justiça social, do equilíbrio regional, na contribuição maior ao Brasil,

José Serra

Antes dele, Ciro Gomes ocupa a segunda página do Livro. Com o estilo de sempre. Direto. Em dois minutos e meio:
- Aos mineiros do tempo do grande governador Aécio Neves. O Brasil tem uma dívida com Minas e seu povo. A cada transe, sempre Minas é quem acode o Brasil. De Felipe dos Santos a Itamar Franco, passando por Juscelino - de todos o maior - e Tancredo. Privilégio meu sua amizade,

Ciro.

Aécio se desloca, circula entre os convidados, os grupinhos, faz as honras da casa. Instigado, comenta notícia de que Lula pretenderia se licenciar por dois meses para mergulhar na campanha:
- Ele tá confiante, hein?

Serra, ao lado, ouve e mantém o silêncio.

Num pequeno púlpito, Dona Jovi de guardiã, avança o ritual das mensagens no Livro.

Wellington Salgado, senador do PMDB de Minas, expoente da tropa de choque governista alcunhado de "Cabelo" pela oposição, descreve o que lhe vai n'alma:
- Governador, duro é ter tudo que se imagina de um grande político da minha geração e por questões políticas ter que admirá-lo comportadamente e sem tê-lo no meu partido,

Wellington Salgado.

Um tucano se aproxima do Livro. Passa os olhos pelas mensagens, detém-se na página com a confissão de Wellington e murmura a sua confissão:
- ...está todo mundo doido pra trair...

Murmura, mas nada escreve no Livro.

Quem quer trair? E a quem?

Wellington Salgado, por exemplo, deixa escapar para um amigo:
- Na verdade, no PMDB ninguém está feliz, feliz mesmo, com a Dilma.

E no PSDB?

Segue o bailado.

João Almeida, da Bahia e líder do PSDB na Câmara, vê Serra passar. Analisa:
- Ele tá demorando muito...

Sérgio Guerra, presidente do PSDB expressa (prognóstico ou desejo?):
- E agora? O Serra é candidato. Não tem mais "e agora?", ele é candidato...

Aécio e Serra se despedem, um diz algo no ouvido do outro. Aécio provoca:
- ...e todos os dias os jornalistas perguntam se falamos, o que decidimos, o que falamos nas nossas conversas...

Serra sorri, Aécio sorri e emenda:
- ...nossos destinos estão traçados... nossos destinos já estão traçados.

Serra e Aécio têm conversado, dias e dias de conversas telefônicas, encontro reservado na noite-madrugada de terça para quarta, em Brasília.

Aécio já comunicou, e repetiu, e repetiu, e repetiu:
- Eu não serei vice!

Conversaram também sobre mais, muito mais do que isso, sondaram até o inimaginável.

Aécio e Serra se despedem no Palácio que já abrigou, já assistiu à urdidura do poder feita por Juscelino, Tancredo, Milton Campos, Benedito Valadares...

Serra se vai. Aécio murmura, como se fosse pra si mesmo:
- ...nossos destinos já estão traçados...

Fim do bailado tucano, ATO I.

Sexta, 5 de março de 2010, 14h15
Atualizada às 16h56

Inflação acelera...

Inflação oficial acelera para 0,78% em fevereiro, maior taxa em 21 meses


Índice é pressionado especialmente pelos reajustes nas mensalidades escolares; no primeiro bimestre, o IPCA acumula alta de 1,54%


Jacqueline Farid

RIO - A inflação medida pelo Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) ficou em 0,78% em fevereiro, ante 0,75% em janeiro, segundo divulgou nesta sexta-feira, 5, o Instituo Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). 

Trata-se da maior taxa mensal apurada pelo IBGE desde maio de 2008 (0,79%).

O índice de fevereiro de 2010 foi pressionado especialmente pelos reajustes nas mensalidades escolares. 


O grupo Educação registrou alta de 4,53% no mês, contribuindo sozinho com 0,32 ponto porcentual, ou 41% da taxa. 

Vale tudo para se alcançar o objetivo político

Vale tudo


Por Merval Pereira
 O Globo


A reação foi tão ruim que provavelmente a intenção de Lula de se licenciar da Presidência da República para entrar de corpo e alma na campanha de sua candidata, Dilma Rousseff, sem os empecilhos da legislação eleitoral não se concretizará.

Até mesmo o senador José Sarney, que teoricamente seria beneficiado pela manobra pois voltaria à Presidência, rejeitou a ideia com um argumento imbatível: um ex-presidente não pode voltar ao cargo como interino de ninguém.

A intenção de Lula de se licenciar do governo já havia sido revelada em algumas ocasiões, inclusive como explicação para seu apoio incondicional ao presidente do Senado durante a crise que quase lhe custou o cargo.

Além da retribuição ao apoio que recebeu de Sarney na crise do mensalão, o presidente Lula queria a garantia de que um aliado confiável assumiria o governo durante sua ausência.

Lula mesmo já havia dito que, se fosse preciso, se licenciaria para apoiar a campanha de Dilma. Portanto, nada de estranho na notícia do Ilimar Franco de que Lula já teria decidido se licenciar nos meses de agosto e setembro.

O que certamente o Palácio do Planalto não esperava era uma reação tão grande a essa manobra, que nada mais é do que uma tentativa de burlar o espírito da lei eleitoral, que pretende colocar os candidatos em igualdade de condições na disputa presidencial.

Esse conceito da legislação é difícil de ser atingido quando um membro do Executivo - tanto faz seja prefeito, governador ou presidente da República - está tentando a reeleição.

Mas vários casos de perda de mandato por abuso de poder político ou econômico estão acontecendo em estados e municípios.

Por muito menos do que o presidente Lula tem feito, vários já perderam o mandato.

O que acontece com a campanha presidencial é que não há ainda a oficialização das candidaturas, e o governo se aproveita desse detalhe técnico para forçar os limites da legislação, com a condescendência do Tribunal Superior Eleitoral (TSE).

O presidente Lula já inaugurou a mesma obra várias vezes, ou até mesmo pedras fundamentais de obras que ainda nem começaram, sempre com a sua candidata no palanque.

Deveria bastar um fato desses para ficar evidenciada a tentativa de usar o cargo para promover sua candidata, ferindo o espírito da legislação.

Certa ocasião, Lula disse ao povo presente a um desses comícios que eles deveriam tomar nota dos responsáveis pelas obras - e citou explicitamente a ministra Dilma entre eles - para que, depois, quando eles já não pudessem mais ir a inaugurações, se lembrassem de quem fez aquela intervenção.

Mais ilegal do que isso não é possível. Maior abuso de poder político e econômico é difícil de se ver.

Na verdade, depois que o PT lançou-a como "pré-candidata", o TSE deveria impedir que a ministra Dilma inaugurasse obras.

Nada acontece com Lula por ser ele o presidente da República e, mais do que isso, ter uma grande popularidade.

Se o PT estivesse na oposição e um presidente tucano fizesse o que Lula faz, já haveria protestos dos chamados "movimentos sociais" por todo o país.

De qualquer maneira, a partir de 3 de abril, com a desincompatibilização dos candidatos, ficará mais difícil a quem quer que seja burlar tão explicitamente a lei.

Quanto ao presidente Lula, licenciando-se do cargo ou não, continuará tendo as mesmas limitações legais, embora licenciado não constrangesse tanto os ministros do TSE.

Como não renunciou ao cargo, Lula continua sendo o presidente, e por isso não poderá pedir votos para Dilma afirmando que ela será a continuidade de seu governo, por exemplo.

Nem poderá fazer campanha em horário de trabalho.

Além disso, há constitucionalistas que não vêem respaldo na Constituição para que o presidente da República se licencie para fazer campanha política.

Mesmo que não se leve em conta o artigo 37 da Constituição, que coloca a moralidade como um dos requisitos fundamentais da função pública, no mínimo porque ao servidor público é permitido apenas o que está explícito na lei. E fazer campanha política não é um dos casos previstos na Constituição para que o presidente se licencie do cargo.

É previsível que teremos boas batalhas jurídicas nesta campanha, porque Lula já disse que só se considerará realizado se conseguir eleger sua sucessora.
Como fala muito, e não tem medidas, chegou a dizer que um governo só é exitoso quando o presidente elege seu sucessor.

Se fazendo o que faz já provoca reações na parte da sociedade que não convive bem com as transgressões, caso se licenciasse do cargo, Lula estaria explicitando na prática o que já disse publicamente, sem nenhum constrangimento: sua prioridade é eleger Dilma Rousseff.

Governar passou a ser secundário neste último ano de mandato.

Essa atitude de Lula, afrontando a legislação com pequenas espertezas, talvez seja uma das piores heranças que ele deixa para o país.

A prática política passou a ser nivelada por baixo, valendo mais quem é mais esperto, não o mais preparado.

Vale maquiar os números do PAC, vale fingir que não é candidata, mas fazer campanha política abertamente, vale trocar apoio político por cargos, vale ter em seu palanque o adversário de ontem apenas porque ele tem votos naquela região.

Como tudo isso dá certo, a prática se dissemina a ponto de não haver uma diferença fundamental entre os principais atores da cena política, mesmo que uns sejam mais comedidos do que outros.

A esperteza passa a ser elemento fundamental da prática política, colocando como secundário o conteúdo dos debates e propostas.

Vale tudo para se alcançar o objetivo político.




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Ressuscitar o escândalo do mensalão

Em texto, PT se diz vítima de
‘guerra de extermínio’


José Cruz/ABr




O PT reúne em Brasília, nesta sexta (5), o seu diretório nacional. Na pauta, o “debate da conjuntura e de procedimentos para as eleições de 2010”.

Entre as peças que irão a voto está um texto assinado pelo presidente da legenda, José Eduardo Dutra (foto).


O documento confere ares oficiais a uma tese que se dissemina pelo petismo. Anota que o partido é vítima de uma “guerra de extermínio”.


Em termos genéricos, elege como inimigos a “mídia” e “setores do empresariado”. Segmentos que, na visão do PT, aliaram-se à oposição.


Como parte da “guerra” aberta com o propósito de “exterminar”, diz-se que há na praça uma tentativa de ressuscitar o escândalo do mensalão.



Dutra não é defensor solitário da tese da “guerra”. Acompanham-no os demais integrantes da cúpula do PT.

O documento escala o diretório com o aval da Executiva do partido, que realizou em Brasília, nesta quinta (4), uma reunião preparatória.


No processo de discussão, o texto de Dutra pode sofrer emendas. Depois de aprovado, será divulgado na forma de manifestação oficial.


Recém “renovado”, o diretório petista é integrado por
83 pessoas. Entre elas, a propósito, expoentes do pedaço mensaleiro do partido.

Foram reacomodados no órgão diretivo máximo do PT personagens como José Dirceu, José Genoino e João Paulo Cunha.


Todos réus na ação penal que apura, no STF, os malfeitos praticados, em 2005, pelo grupo que o Ministério Público chamou de “quadrilha”.


Ou seja, tomando-se a sério o enredo da “guerra”, o PT desce ao front no papel de provedor de munição.


Na parte da reunião dedicada aos “procedimentos” eletorais, o diretório deve aprovar resolução destinada a disciplinar as suas próprias guerras.


Pelo script esboçado na Executiva, o partido deseja inibir a realização de prévias nos Estados em que há disputas internas pelas candidaturas de senador e governador.


Para evitar que o periférico –as disputas regionais— contamine o essencial –a candidatura presidencial— o PT tentará dissolver suas encrencas em acordos.

Entendimentos que passem pela mesa de negociação com os demais partidos que integram a superaliança formada ao redor de Dilma Rousseff.

STF decide manter Arruda na prisão


Por nove votos contra um, o plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) negou na noite desta quinta-feira pedido de habeas corpus do governador do Distrito Federal, José Roberto Arruda.

Além do relator, ministro Marco Aurélio, votaram pela legalidade da prisão preventiva, decretada pelo Superior Tribunal de Justiça, os ministros Cármen Lúcia Antunes Rocha, Ricardo Lewandowski, Joaquim Barbosa, Ayres Britto, Cezar Peluso, Ellen Gracie, Celso de Mello e Gilmar Mendes.
O único voto a favor de Arruda foi dado pelo ministro Dias Toffoli.

quinta-feira, 4 de março de 2010

A vingança triunfal dos antigos intelectuais ressentidos transformados em arrogantes apologistas da ignorância consagra, de maneira aparentemente definitiva, a completa destruição da vida intelectual e da educação no Brasil.

Onde começou a queda
Olavo de Carvalho

Que pode haver de mais sedutor do que vingar-se de um sentimento pessoal de exclusão sob a desculpa de lutar em favor dos pobres e oprimidos?

Até hoje, nos EUA, discute-se acaloradamente se Thomas Jefferson teve ou não um filho com sua escrava Sally Hemmings. A suspeita, se comprovada, lançaria, segundo entende a sensibilidade politicamente correta, uma nódoa infamante sobre a reputação daquele Founding Father, o qual, para maior constrangimento geral, não foi nenhum exemplo de conservador religioso que o establishment intelectual e midiático atual tivesse especial prazer em surrar, mas um deísta voltaireano, iluminista de quatro costados, laicista radical, contestador da fé cristã, o santo patrono ideal, enfim, de todo o "progressismo" do Partido Democrata.

Barack Obama, deixando a família à míngua enquanto subia a jato na vida montado num discurso assistencialista, não faz figura pior num país onde cada político, se não quer ser exposto ao ridículo, tem de encarnar uma nova mulher de César.

No Brasil, ninguém se pergunta sequer quantas negras ou índias passaram pelas camas dos nossos condes, barões e senhores de terra em geral, admitindo-se aliás que dos desmandos lúbricos desses cavalheiros se originou, não uma horda de renegados, sepultada sob o tapete da História, mas, pura e simplesmente, o núcleo inicial da população brasileira.

É fato sabido que, nas nossas velhas classes dominantes, anteriores à imigração maciça de italianos, alemães, japoneses e polacos, dificilmente se encontrava um branco sem alguma gota de sangue africano ou índio.

Ainda hoje, um presidente ou senador brasileiro ter uma ou muitas amantes em nada depõe contra sua reputação, mas até contribui para o maior glamour da sua biografia.

Fala-se mais mal de D. João VI por seus excessos à mesa que de seu filho Pedro I por suas aventuras amorosas, embora o primeiro fosse o verdadeiro criador do Estado brasileiro e o segundo o inventor da nossa primeira ditadura.

Nas preferências populares, a reputação deste último supera até mesmo a de seu filho Pedro II, exemplo de tolerância e de administração honrada, talvez o melhor governante brasileiro de todos os tempos, mas homem arredio e distante, encerrado em sua biblioteca, devotado a estudos de ciência nos quais o povão enxergava não um mérito, mas uma esquisitice.

Essas duas séries de fatos condensam, ao menos simbolicamente, uma diferença essencial não só entre o Brasil e os EUA, mas entre o nosso país e a maioria das grandes nações do Ocidente.

Cada uma destas nasceu sob a inspiração de uma casta de clérigos, que traziam consigo a memória civilizacional e os princípios da educação intelectual e moral.

Quando digo "clérigos", uso o termo no sentido amplo que tinha na Idade Média, incluindo não só os sacerdotes ordenados mas todos os homens cultos imbuídos do espírito da religião.

Nesse sentido, os fundadores dos EUA foram todos clérigos, com as únicas exceções -- não por incultos, mas por anti-religiosos -- de Jefferson e Franklin.

O Brasil, em contraste, foi criação de senhores de terra vorazes, incultos, impudicos e brutais, que na religião não viam senão uma incomodidade incontornável e na cultura superior um adorno importado a recobrir mal e mal a mesquinharia, a feiúra de seus costumes.

Assim constituída a nação, nela só podiam florescer dois tipos de intelectuais: os áulicos, protegidos da classe dominante, satisfeitos de si, ocupando com gratidão que raiava o puxa-saquismo os escassos lugares abertos em raras instituições de alta cultura, e, em torno deles, uma multidão de fracassados e marginalizados, vivendo de empregos infames e bradando contra a injustiça do mundo.
 

Homens de talento, sempre houve em ambos os grupos.

Os exemplos respectivos de Machado de Assis e Lima Barreto -- ou, nada mudando decorrido um século, os de Gilberto Freyre e Otto Maria Carpeaux -- personificam às mil maravilhas os dois tipos.

Mas é evidente que a situação existencial de uns e outros só poderia, a longo prazo, corromper os dois grupos por igual, negando a um e a outro um papel histórico decente e estreitando, pouco a pouco, o horizonte da sua vida mental.

Como poderiam resistir os primeiros à tentação de produzir uma literatura que se limitasse a ser, na fórmula célebre de Afrânio Peixoto, "o sorriso da sociedade"?
Que não é fácil, prova-o a afeição constante da Academia Brasileira às mediocridades coroadas, em prejuízo da genuína alta cultura.

Quanto aos segundos, seu destino estava selado desde que, nas primeiras décadas do século XX, entraram no Brasil os discursos revolucionários do anarquismo, do marxismo e do fascismo.

Pouco a pouco, esses homens foram se convencendo de que a dignidade da sua existência não devia se fundar na qualidade insígne da sua criação intelectual, mas na sua colaboração ou adesão a movimentos políticos empenhados, ao menos da boca para fora, em corrigir os males do mundo.

Que pode haver de mais sedutor do que vingar-se de um sentimento pessoal de exclusão sob a desculpa de lutar em favor dos pobres e oprimidos?

Gradativamente, os escritores e professores ditos "de esquerda" foram abdicando de seus deveres intelectuais e passando a buscar uma legitimação existencial na mera aprovação solidária de seus companheiros de militância.

O golpe de 1964 forneceu-lhes o pretexto final.

Os romances Quarup, de Antonio Callado, e Pessach: a Travessia, de Carlos Heitor Cony, ambos de 1967, soaram o apelo fingidamente heróico à transformação dos letrados em militantes.

A universidade foi o forno alquímico onde se consumou a transmutação dos intelectuais em "intelectuais" no sentido gramsciano do termo, isto é, ativistas políticos sem nenhuma obrigação mental específica, diferenciados tão somente pela instrumentalização da sua atividade soi disant artística, educacional ou científica a serviço da causa esquerdista.

A redução da vida intelectual a megafone de interesses partidários e a conseqüente debacle da alta cultura no Brasil estão bem documentadas no meu livro O Imbecil Coletivo, de 1996.

Depois disso, porém, muita água rolou.

A casta gramsciana chegou ao poder, já no governo Fernando Henrique Cardoso, consolidando-se no governo Lula a versão tupiniquim da trahison des clercs no momento em que, tirando por fim a máscara, os representantes nominais da alta inteligência passaram a celebrar a abjeta incultura presidencial como uma prova de méritos sublimes, se não de algum carisma profético.

A vingança triunfal dos antigos intelectuais ressentidos transformados em arrogantes apologistas da ignorância consagra, de maneira aparentemente definitiva, a completa destruição da vida intelectual e da educação no Brasil.

04 Março 2010
Artigos - Cultura


Diário do Comércio, 4 de março de 2010.