O homem disse pouco, preferia não falar ao telefone e queria um encontro ao vivo. Mas avisou que o que ele tinha era a prova toda, as 180 questões dos dois dias, já impressas. Eu falei que tinha interesse em verificar a veracidade do material e então marcamos para as 19h15 em um café perto do jornal.
A direção decidiu que eu fosse acompanhada de duas pessoas e então o editor do Ponto Edu, Sergio Pompeu, e o fotógrafo Evelson de Freitas, foram escalados para isso. Sentamos os três no café e esperamos. Não sabíamos nome algum ou rosto de quem procurar, mas um dos informantes chegou primeiro e nos identificou. O outro chegou poucos minutos mais tarde, com uma pasta cheia de papéis.
Segundo eles, o material tinha sido vazado por alguém em Brasília, no Inep/MEC. Eu pedi para ver a prova e eles a colocaram, sem cerimônias, na mesa do café. Estavam lá os logotipos do governo federal, das empresas contratas para organizar a prova, do Inep. Ao folhear a prova, não acreditava no que via. As questões tinham o perfil do Enem, um exame que cobra competências e habilidades, usa temas cotidianos. Vi lá tiras da Mafalda, do Garfield, trechos da Canção do Exílio e de uma reportagem da revista Veja. Tratei de decorar o máximo de questões possíveis.
Queriam dinheiro e deixavam claro isso. Pediram R$ 500 mil e tinham a convicção de que fariam o negócio com algum veículo de imprensa. Deixamos claro que o Estado repudiava esse tipo de comportamento, que aceitaríamos denunciar o vazamento desde que não pagássemos por isso. Eram homens simples, pareciam não ter qualquer experiência com provas ou conhecimento do sistema educacional do País. Os dois, por volta dos 30 anos de idade, viam no material que "tinha caído no colo deles" como uma "oportunidade única". Um deles tinha comportamento mais truculento, falava de maneira mais agressiva. O outro aparentava nervosismo, medo. "Não somos bandidos. Queremos nos livrar disso o mais rápido possível", dizia.
Pouco antes da 1h da manhã veio a confirmação de que o Enem seria cancelado. A prova que tive em mãos era verdadeira.
01.10.09 - por Renata Cafardo, Seção: Educação básica
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