Por Dr.Ives Gandra Martins*
Sociedade Brasileira
Discute-se, na Comissão de Relações Exteriores do Senado Federal, a permissão ou não da entrada da Venezuela no MERCOSUL.
Se a Venezuela for admitida, poderá impugnar qualquer deliberação da União Aduaneira, no que diz respeito ao próprio MERCOSUL, assim como impugnar acordos com terceiros países de qualquer uma das nações signatárias.
Aliada do Irã, poderia, por exemplo, se já fizesse parte do MERCOSUL, opor-se, mediante o direito de veto (falta de consenso), ao acordo que o Brasil está firmando com Israel.
Na audiência pública da qual o Ministro Celso Lafer e eu fomos convidados a participar, ambos mostramos a necessidade de maior aprofundamento no conhecimento da realidade venezuelana atual, antes de o Senado Federal avalizar a entrada daquele país no bloco.
Apresentei, pessoalmente, questões de natureza econômica, política, jurídica e técnica. Economicamente, reconheço que os superávits da balança comercial com a Venezuela, em face do acordo que temos até 2011, são expressivos.
São superávits que foram obtidos, sem necessidade de a Venezuela ingressar no MERCOSUL. E são superávits inferiores àqueles que conseguiram os Estados Unidos, objeto principal das críticas de Chávez, e Colômbia, país não dos mais simpáticos para o líder bolivariano.
O argumento, portanto, carece de relevância, principalmente levando-se em consideração que a Confederação Nacional da Indústria e a Fecomercio de São Paulo vêem, ainda, com muitas restrições, o ingresso imediato da Venezuela, enquanto a instabilidade emocional do presidente Chávez continuar a repercutir na expropriação de empresas e críticas à economia de mercado.
Os principais interessados no comércio externo são muito menos propensos ao imediato ingresso venezuelano do que os que argumentam com dados econômicos para justificá-lo.
Politicamente, a Venezuela é uma democracia formal, com cinco poderes, dos quais só dois são considerados relevantes: o popular e o executivo. O poder popular é normalmente convocado PELO EXECUTIVO e não pelo LEGISLATIVO, ou seja, sempre que o presidente deseja.
A perseguição aos políticos que derrotaram Chávez em eleições regionais, a limitação do direito a comícios nos mesmos locais em que Chávez os fez e a perseguição aos meios de comunicação - que a principal entidade internacional da imprensa condena - estão a demonstrar, que, para uma real democracia, há uma longa caminhada a ser empreendida por aquele país.
Ora, o MERCOSUL apenas admite democracias reais como seus membros, tal como ocorre, aliás, na União Européia. Ora, o presidente Chávez, que declara ser a democracia cubana mais perfeita que a americana, está longe de compreender o que é uma democracia.
Do ponto de vista jurídico, se a Venezuela entrar no bloco, não só terá direito a opor-se ao consenso, podendo paralisar o MERCOSUL, como, o que é pior, a interferir nas relações bilaterais ou plurilaterais do Brasil condicionadas ao MERCOSUL, o que representará para o País uma preocupação a mais, dentre aquelas que já tem com os outros países do pacto de Assunção.
Por fim, do ponto de vista técnico, a Venezuela não concordou ainda com 169 das 783 normas que regem o espaço do Cone Sul, condição prévia para sua adesão, nem definiu a lista de produtos para a adoção da tarifa externa comum, como também não se manifestou sobre o cronograma de liberalização do comércio entre Brasil e Venezuela. Tampouco definiu as condições para não se opor a que o Brasil negocie com terceiros países.
Em outras palavras, nada obstante ter havido algum avanço na reunião de Salvador do mês de Maio, entre o Presidente Lula e Chávez, os cronogramas dos grupos de trabalho criados desde 2005 não foram cumpridos até agora, exclusivamente por culpa da Venezuela.
O argumento de que a Argentina e o Uruguai concordaram com a integração imediata, num momento em que Chávez estava fornecendo dinheiro à Argentina e energia ao Uruguai, não deve servir de parâmetro para o Brasil.
No dia de nossa audiência, após as manifestações dos Senadores Fernando Collor, Mozarildo Cavalcanti, Rosalba Ciarlini, Arthur Virgílio, Eduardo Azeredo e outros, o Senado Federal pareceu não ser contra o ingresso, mas entender que só poderá decidir, após a resposta de todos os requisitos técnicos, que desde 2005 a Venezuela não complementa.
Por esta razão, minha posição naquela audiência de 09 de junho foi de que o Senado não deve dizer nem "sim", nem "não", mas "talvez", deixando para apresentar seu veredicto final a partir do exame de todos estes elementos, que deverão ser enviados para sua análise em futuro não determinado.
Dr.Ives Gandra Martins
Professor Emérito das Universidades Mackenzie, UNIFMU, UNIFIEO, UNIP e das Escolas de Comando e Estado Maior do Exército-ECEME e Superior de Serra-ESG, Presidente do Conselho Superior de Direito da Fecomercio e do Centro de Extensão Universitária - CEU - ceu@ceu.org.br e escreve quinzenalmente para o Jornal Mundo Lusíada.
enviada por João Alves das Neves
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