O discurso do velho coronel
Voz firme, apesar do tremor das mãos, que não cessou um minuto durante todo o discurso que apresentou em sua defesa, José Sarney pareceu, em vários momentos, sinceramente espantado.
Sem entender por que está sendo, segundo ele, tão duramente perseguido.
Continua fazendo o que sempre fez.
No PSD, onde começou a carreira, lá na década de 1950 do século passado. Na UDN, para onde se bandeou porque não havia espaço no PSD. Na Arena, partido da ditadura, em que foi presidente nacional. No PDS, sucedâneo da Arena, ainda durante a ditadura, partido de que também foi presidente. No PMDB, para onde se bandeou quando a ditadura começava a fazer água.
Coronelismo, nepotismo, clientelismo, fisiologismo, privatização de espaços e recursos públicos. Vaidade, vaidade, vaidade. Nada disso é desconhecido pelo senador Sarney.
Todas essas práticas são antigas a arraigadas em sua biografia. Biografia que o senador tanto preza.
Por que, então, começou-se a cobrar dele, como se fosse ele, Sarney, o único a exercer essas práticas? Ou que se ele as tivesse começado a praticar ontem.
O fato é que, talvez, Sarney, como os dinossauros, não tenha realmente percebido que os tempos mudaram.
Depois de passar mais da metade da vida como o enfant gâté da ditadura, Sarney dedicou-se, nos últimos 20 anos, a polir seu verbete nas enciclopédias da História do Brasil.
Tendo sido chamado de ladrão e incapaz por Lula e Collor durante toda a campanha eleitoral para a primeira eleição democrática desde 1960 (a eleição de 1889 está fazendo 20 anos), Sarney ocupou-se da carreira política dos filhos, da construção de um patrimônio invejável, da publicação de alguns romances de qualidade duvidosa e de construir seu mausoléu.
Naturalmente, num espaço público e tombado pelo Patrimônio Histórico, o centenário Convento das Mercês.
Ah, e aderiu a todos os governos desde Itamar Franco.
E agora, quando esperava coroar sua história de vida com a terceira presidência do Congresso Nacional, eis que sua biografia lhe cai sobre a cabeça como um paralelepípedo, estragando todo o esforço realizado nas últimas dácadas para mantê-la escondida da sociedade brasileira.
Sarney volta a ser um coronel de província. Obsoleto, anacrônico, desfuncional.
Estamos assistindo a um duelo de morte. Entre o velho coronelismo e os novos tempos de internets, blogs, twitters e julgamentos em tempo real.
Assim como os dinossauros, o coronelismo está nos estertores. Sejam os velhos ou os novos coronéis, estes donos de meios de comunicação, senhores da opinião em seus estados, proprietários de currais eleitorais.
O coronelismo está agonizando
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