PT ataca a Vale para engolir a mineradora
A outra forma de ver a Vale é pelo ângulo do oportunismo.
Há duas maneiras de olhar para a Vale, maior empresa privada do país. A primeira é com orgulho pelo colosso empresarial que se tornou, principalmente, depois da privatização, em 1997.
A outra forma de ver a Vale é pelo ângulo do oportunismo.
A empresa tem a capacidade rara de agradar governos - e ajudá-los a recolher votos - com sua força para construir ferrovias, estradas, portos e siderúrgicas.
E é assim que a enxerga o governo do PT. Seu ponto de vista ficou mais claro nos últimos dois meses, quando se intensificaram as ações para desestabilizar a direção da empresa e enquadrá-la no ideário petista.
Os números da mineradora são inquestionáveis. Ela mantém 60 000 pessoas empregadas e recolhe 2,8 bilhões de dólares em impostos. Com seu resultado financeiro, de 38,5 bilhões de dólares no ano passado, foi responsável por metade do superávit primário do país.
No primeiro trimestre deste ano, ela garantiu o superávit inteiro. Avaliada em 125 bilhões de dólares, ela perde em valor de mercado apenas para a anglo-australiana BHP Billiton e, sozinha, equivale quase à soma da terceira e quarta colocadas.
Guerra - Fizeram parte do arsenal para desestabilizar a empresa uma torrente de críticas de integrantes do governo e a tentativa de uma mudança no controle, com estímulo ao empresário carioca Eike Batista para que entrasse no quadro de acionistas com direito a voto.
Na superfície, as ações são movidas pelo descontentamento do presidente Lula em relação a três fatos ocorridos no último ano: a compra de 12 navios na China, em detrimento de estaleiros nacionais; o atraso na construção de cinco usinas siderúrgicas no país, que acabou virando compromisso de campanha da candidata oficial, a ministra da Casa Civil, Dilma Roussef; e a demissão de 1 500 funcionários.
Interesse do governo - No fundo, o ataque tem o cheiro inconfundível do ranço estatizante e intervencionista do PT, que nunca se conformou com a privatização da Vale do Rio Doce, antigo nome da companhia. Aliás, com nenhuma privatização, como demonstraram as cenas de socos e pontapés em todos os leilões.
A reestatização da Vale é uma velha ladainha que ressurge com frequência. Mas nos últimos tempos essa parte fossilizada do pensamento petista ganhou fôlego e um banho de loja, inspirado no modelo chinês, de forte dirigismo estatal na economia.
Assim como faz na Petrobras, que sozinha sustenta mais da metade do PAC, o governo pressiona a Vale para atender a seus interesses, sem levar em conta que sua missão principal, como empresa privada, é gerar riqueza a seus acionistas.
Nisso a Vale é exemplar.
Até 1997, seu faturamento era de 4,9 milhões de dólares. No ano passado superou os 38 bilhões. A produção de minério triplicou.
Os investimentos feitos somente no Brasil saltaram de 600 milhões de dólares para 9 bilhões, dado de 2009.
O Brasil não pode aspirar um papel de liderança mundial sem empresas globais. Fora essa "visão estratégica", que se integra bem com a imagem que o governo quer projetar interna e externamente, existem ambições menos proclamáveis.
A mais forte delas é a utilidade eleitoral inestimável que o PT enxerga no fabuloso caixa da Vale. O presidente da empresa, Roger Agnelli, não menosprezou as delícias que essa situação traz junto aos centros de comando do Planalto. Desde o início do governo petista, Agnelli cultivou uma relação privilegiada com o Palácio do Planalto.
O atual presidente da Vale deve seu acesso ao Planalto ao ex-ministro José Dirceu, que mantém uma antiga e amistosa relação com o Bradesco e com o presidente do conselho do banco, Lázaro Brandão. Ex-executivo do Bradesco, Agnelli foi introduzido por ele no gabinete de Lula.
Hostilidades - Esse canal começou a ser obstruído há um ano. Lula, que classificou o solavanco na economia de "marolinha", não engoliu a demissão de 1 500 funcionários, para compensar os efeitos da crise mundial.
O presidente temeu que a decisão da Vale fosse seguida por outras empresas, o que poderia agravar a crise econômica e reduzir sua popularidade.
O presidente e seus assessores já vinham cogitando forçar a substituição de Agnelli. Faltava um candidato. Há dois meses, depararam-se com Eike Batista, o homem mais rico do Brasil, o empreendedor ousado, trovador de um discurso nacionalista à feição do gosto petista.
"Sou homem da iniciativa privada. Não participo de movimentos políticos. Não sou homem do Lula ou do PT ou de qualquer partido. Ninguém me usa como andou saindo nos jornais" disse Eike a VEJA.
Dois diretores executivos da empresa, Carla Girassol e Fábio Barbosa, também entraram na alça de mira, por serem identificados com o governo tucano.
Para aplacar a ira de seus adversários, Agnelli esteve a ponto de ir ao conselho da empresa e pedir uma declaração pública de que a diretoria executiva estava executando as diretrizes determinadas e formuladas pelo próprio conselho.
Desistiu da ideia. Pelo menos por enquanto. Não há sinais de que o governo tenha desistido de seus planos.
É inegável a força do núcleo jurássico do PT, do qual fazem parte colaboradores muito próximos do presidente. O discurso contra a privatização da joia da coroa da era estatal ainda tem o poder de seduzir parte do eleitorado.
O marketing petista sonha em reavivar esse sentimento em 2010, a despeito de suas falácias. Se conseguir pode até levar vantagem nas eleições, mas todos os brasileiros perdem.
17 de outubro de 2009
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