Mais forte que a lei
Por Dora Kramer
O Estado de São Paulo
O Estado de São Paulo
O presidente Luiz Inácio da Silva está, assumida e explicitamente, liderando uma campanha de desmoralização da lei e dos instrumentos de fiscalização do Estado que lhe provocam desconforto, Tribunal de Contas da União no destaque.
Do palanque volante ao qual deu o nome de vistoria das obras do projeto de transposição das águas do Rio São Francisco, jogou a culpa pelos atrasos nas obras federais no TCU e na Justiça, dando a entender que se não existissem o Brasil estaria muito mais avançado rumo ao desenvolvimento.
Em outras ocasiões o presidente já havia sugerido o mesmo em relação às exigências sobre impacto ambiental, bem como atacou a existência de leis que lhe criavam obstáculos, enquanto permitiu que seu governo ignorasse outras que, se respeitadas, restringiriam as ações (violentas) de seus protegidos.
Já teve oportunidade também de criticar duramente integrantes do Judiciário por manifestarem posições contrárias aos seus interesses e só é condescendente com o Congresso porque o Congresso lhe é subserviente.
Quando isso ainda não havia ficado claro, no início do primeiro mandato, Lula incluía o Legislativo entre as instituições descartáveis. "Não tem Congresso, não tem Judiciário, não tem cara feia", só Deus, segundo ele, o impediria de levar o Brasil ao lugar de merecido destaque.
Foi criticado pelo cunho autoritário da declaração. De natureza semelhante à ofensiva palanqueira contra a atuação do TCU, que recentemente ordenou a paralisação de 41 obras do PAC por indícios de irregularidades.
O presidente diz a um público desprovido de discernimento, a aliados movidos pelo oportunismo e a uma oposição entocada em seu irresponsável imobilismo, que, em havendo dinheiro e popularidade, tudo o mais se ajeita.
Sugere que, se não fossem as leis, os fiscalizadores, os controles, as regras, sua fantástica obra governamental seria ainda mais fantástica.
Não é surpreendente, pois, que admire tanto o colega venezuelano Hugo Chávez, que dominou as instituições do país a poder de populismo e dinheiro do petróleo.
Não espanta, portanto, que se encante tanto com as realizações dos governos do Brasil na época do regime militar.
Não causa estranheza que critique tanto a imprensa nem que faça isso no exercício pleno do seu dom de iludir multidões, como fez ontem quando chamou de "azedos" os meios de comunicação do Brasil na comparação com a cobertura internacional à escolha do Rio para sediar a Olimpíada de 2016.
O noticiário francamente favorável, ufanista até, não satisfez o presidente Lula. Queria unanimidade e ficou contrariado com os alertas às responsabilidades correspondentes, com as cobranças em relação ao bom trato do dinheiro público a ser empregado nas obras.
Fosse Luiz Inácio da Silva presidente de quaisquer dos países (os
democráticos e civilizados, bem entendido) que analisam os cenários sem conhecimento completo de causa, seus constantes ataques às leis e suas permanentes defesas de toda sorte de malfeitorias com certeza absoluta não seriam recebidos com a complacência oferecida pelos nacionais a sua excelência.
Entre outros motivos porque democracia que se preze não aceita que governantes eleitos pela maioria subvertam impunemente seus valores e suas regras como se fossem donos da vontade de todos.
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