"Tornei-me um bode expiatório. Eles conseguiram fulanizar a crise"
Por que ele ainda está aí?
Como foram as 72 horas que levaram Sarney a balançar entre a renúncia, o afastamento e a resistência
Passavam das dez da noite da terçafeira 30 quando a tensão chegou ao limite. Três partidos - DEM, PSDB e PSOL - já haviam formalizado o pedido de afastamento do presidente do Senado, José Sarney (PMDBAP), e o PT o pressionava com uma proposta de licença de 30 dias.
De seu gabinete, já cansado da sucessão de negociações e conchavos, emitiu um recado que fez chegar aos ouvidos dos principais líderes partidários:
"Tornei-me um bode expiatório. Eles conseguiram fulanizar a crise", desabafou com seus auxiliares. O fulano, no caso, era ele próprio. Sarney começava ali uma luta pela sobrevivência política. "Não me licencio. Ou fico ou saio de uma vez", ameaçou.
Aos 79 anos e com 50 de vida pública, o maranhese de Pinheiro começava aquela semana sem saber se permaneceria ou não no cargo. Em meio à sucessão de escândalos capazes de abalar as estruturas da Casa, o destino deixou de sorrir para ele. Apontado como principal responsável por esses males, Sarney viveu três dias de agonia.
E chegou a se mostrar arrependido de ter assumido um terceiro mandato.
O velho cacique ficou entre o céu e o inferno, sem ter certeza sobre seu futuro. E pensou seriamente em pôr ponto final em sua carreira política.
Em frente ao Congresso Nacional, manifestações populares ressuscitavam o "Fora, Sarney!", a palavra de ordem que ficou famosa no fim de seu mandato na Presidência da República.
PSDB e PSOL representaram contra ele no Conselho de Ética. O DEM, partido com raízes na Arena e que apoiou a eleição de Sarney à presidência do Senado, virou-lhe as costas. A legenda pediu sua licença até a conclusão das investigações sobre a participação de seu neto José Adriano Cordeiro Sarney em empréstimos consignados a servidores da Casa.
"Enquanto há investigação, que ele se afaste para que haja isenção.
Foi uma decisão de consenso", afirmou o líder do DEM, José Agripino Maia (RN), por coincidência, primo do pivô da crise, o ex-diretorgeral Agaciel Maia. Embora a decisão não tenha sido unânime - ACM Júnior (BA), Eliseu Resende (MG) e o primeiro-secretário do Senado, Heráclito Fortes (PI), votaram contra -, Sarney acusou o golpe. "Não esperava isso. Estou profundamente magoado", disse ele, em conversa com amigos. Ao DEM somaram-se o PDT, dono de uma bancada de cinco senadores, e o PSDB.
DEFENSOR A renúncia de Sarney prejudiciaria os planos de Lula para 2010
Os tucanos sugeriram que Sarney se afastasse temporariamente e nomeasse uma comissão de alto nível para levar adiante as investigações. "Se ele entende que não cabe instalar uma comissão, que se afaste", propôs o líder do PSDB, Arthur Virgílio (AM).
O presidente do PSDB, senador Sérgio Guerra (PE), também defendeu a proposta: "A grande tragédia é que não temos mais presidência do Senado. Precisamos de um banho de sensatez."
Restava a Sarney um fio de esperança. Até aquele momento, ele contava com a fidelidade do PMDB, comandado pelo senador Renan Calheiros (AL), e apostava no apoio do PT.
Mas, para sua surpresa, a bancada petista, em reunião que começou às 21 horas da terça-feira 30, dividiu-se e ameaçou abandoná-lo à própria sorte, contrariando orientação do presidente Luiz Inácio Lula da Silva.
Antes de embarcar para a Líbia na noite da segunda-feira 29, Lula advertiu que os ataques a Sarney eram uma questão política e que assim deveriam ser examinados pelo PT.
"O presidente não admite que Sarney deixe a presidência do Senado. Ele é essencial para a governabilidade", afirmou à ISTOÉ o ministro de Comunicação Social, Franklin Martins, a poucas horas de se dirigir para o aeroporto. Mas, naquele momento, para azar de Sarney, a advertência de Lula caiu no vazio.
Os senadores Eduardo Suplicy (SP), Tião Viana (AC), Marina Silva (AC), Paulo Paim (RS) e Flávio Arns (PR) disseram-se constrangidos em ter que dar apoio a Sarney. O PT passou a defender sua licença do cargo sem medir as consequências para o governo. A mando do presidente, a ministra da Casa Civil, Dilma Rousseff, recebeu Sarney em sua casa, ao lado do chefe de gabinete de Lula, Gilberto Carvalho, para transmitir um apelo para que o senador não tomasse nenhuma decisão antes do retorno de Lula ao Brasil na quarta-feira à noite. Leia na ISTOÉ.
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