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segunda-feira, 9 de agosto de 2010

Que matou Toninho do PT?



 


Quem matou Toninho do PT?




D
ois anos depois do assassínio do prefeito de Campinas, o crime continua insolúvel, cheio de versões inverossímeis.
Marina Amaral revirou o processo sobre a morte de Toninho do PT e encontrou falhas inexplicáveis.

Naquela segunda-feira, o prefeito Antônio da Costa Santos beijou a mulher pouco depois das 7 horas e, quando ela fez menção de levantar, disse: “Está frio, boba, fica na cama”.

A psicanalista Roseana Moraes Garcia achou graça na brincadeira – fazia calor em Campinas no dia 10 de setembro de 2001 –, mas aceitou o convite à preguiça.

Ele calçou meias brancas e mocassins pretos depois de vestir calças cáqui com cinto preto e uma camisa pólo Lacoste azul-clara de listas brancas que ganhara dois dias antes da filha Marina, quando foram juntos ao shopping.

Embora usasse roupas informais para ir à prefeitura – às vezes acompanhadas de tênis de futebol de salão –, acabara de comprar dois ternos, camisas sociais, meias.

Pretendia estrear um dos trajes no encontro do dia seguinte com o ex-presidente do Chile, Eduardo Frei.

Por isso precisava buscá-los ainda naquele dia na loja onde os deixara para ajustar – com 1,78 metro de altura e 70 quilos, o número 46 tinha ficado folgado.

As roupas novas foram o assunto da primeira conversa do dia, já na prefeitura, para onde Toninho do PT – como era conhecido – se dirigira com seu Palio prata, ano 2000.

Só usava carros oficiais a trabalho e recusava-se a andar com seguranças, apesar das altas taxas de criminalidade de Campinas – nos primeiros sete meses de 2001 já haviam sido assassinadas 296 pessoas na cidade de 970.000 habitantes (proporcionalmente, mais do que na capital)
.




Como prefeito, acreditava dar o exemplo andando despreocupado pelas ruas. “Temos de acabar com a arquitetura do medo, ocupar o espaço público, não podemos nos fechar em casa”, dizia, em uma cidade onde proliferam os condomínios fechados e os guardas-noturnos contratados pela Associação Comercial de Campinas patrulham armados os bairros de alta renda.

Nilson Lucílio, secretário de Negócios Jurídicos, e advogado de Toninho havia quinze anos, recebeu-o com um chiste: “Aí, de camisetinha azulzinha, que veadinho!”

Costumava tomar o primeiro café do dia com Toninho, que respondeu à provocação:

“Comprei uns ternos mais bonitos do que esses que você costuma usar. Vou buscar hoje”.

“Onde?”, duvidou o amigo. Ele citou o nome de uma loja masculina de grife, e Nilson aplaudiu.

Do núcleo de assessores mais chegados ao prefeito – que contava também com os ex-metalúrgicos Gerardo Mendes Mello, chefe de gabinete, e Durval de Carvalho, secretário de governo –, Nilson era o elegante: tinha dois carros de luxo – uma Mercedes e uma BMW –, freqüentava restaurantes caros e vestia-se bem.

Custara a aceitar o cargo de secretário e o salário de 6.000 reais, muito inferior aos rendimentos que obtinha com a advocacia.

O amigo o convenceu a aceitar o cargo, como sempre o convencia a aceitar causas difíceis e de remuneração duvidosa
.


Mesmo antes de ser prefeito, o arquiteto Toninho valia-se do conhecimento que tinha da história de Campinas – o processo de ocupação fundiária da cidade foi objeto de sua tese de doutorado na USP – para entrar com ações populares pedindo o tombamento de áreas históricas, denunciando o não-cumprimento de legislação ambiental, freando a especulação imobiliária que, como gostava de repetir, “enriqueceu a elite campineira desde que o café deixou de ser o forte da economia local”.

Foram cerca de dez ações movidas contra construtoras como a CBPO, a Mendes Jr., e contra a prefeitura de Campinas, que celebrava os contratos.

Em um dos casos mais ruidosos, impediu um empresário de Ribeirão Preto, Jaimes Almeida Jr., de construir um shopping em um terreno de 23.000 metros quadrados ao lado do estádio Brinco de Ouro, cedido pela prefeitura ao Guarani Futebol Clube.

O ex-presidente do clube, Luiz Roberto Zini, havia negociado com Jaimes a troca do terreno em área nobre da cidade por outros lotes, em regiões menos valorizadas, e já tinha conseguido maioria na Câmara Municipal para aprovar o negócio, depois arruinado pela ação movida por Toninho.

Um dos argumentos utilizados foi o fato de o terreno estar localizado a menos de 300 metros de um edifício histórico – e portanto em área tombada pela legislação do patrimônio arquitetônico: a sede da antiga fazenda Proença, um casarão do século 19 em um terreno de 2.688 metros quadrados que Toninho comprou, tombou, restaurou, habitou durante quinze anos e onde escreveu sua tese de doutorado.

O então futuro prefeito fez mais: em novembro de 1999, entregou um dossiê à CPI do Narcotráfico, em Brasília, sobre Zini e Almeida Jr., suspeitos de ligações com o crime organizado.

A passagem da CPI do Narcotráfico por Campinas, uma semana depois, conferiu à cidade mais industrializada do interior de São Paulo e um dos principais pólos tecnológicos do país o triste título de centro logístico e financeiro do crime organizado:

do tráfico de drogas ao roubo de cargas, passando pela lavagem de dinheiro, Campinas é também a terceira maior praça bancária do país.

Quarenta e nove pessoas foram indiciadas por ligações com o crime organizado – entre elas, sete policiais civis, uma dúzia de empresários e o médico-legista Fortunato Badan Palhares.
E as suspeitas de Toninho seriam confirmadas:

Zini foi indiciado por lavagem de dinheiro, receptação de cargas roubadas e sonegação fiscal.

Nas contas do Guarani, presidido por ele durante onze anos (até junho de 1999), foram encontrados depósitos do esquema PC Farias e os deputados comprovaram a ligação do ex-cartola com o empresário William Sozza, braço campineiro de uma superquadrilha com conexões no Maranhão, Acre e Alagoas, liderada pelo deputado cassado Hildebrando Paschoal, Augusto César Farias – o irmão de PC indiciado por seu assassinato – e o então deputado estadual maranhense José Gerardo de Abreu.

O advogado de Sozza, Arthur Eugênio Mathias, preso pela CPI, dirigiu o departamento jurídico do Guarani e advogou para a empresa Construbel, de propriedade de Zini.

Outro nome famoso da sociedade campineira, o corredor de stock car Alexandre Funari Negrão – dono do Medley, o maior laboratório de genéricos do país –, foi denunciado por venda de componentes para refino de cocaína através de uma das empresas de sua família, o Instituto de Química de Campinas, e indiciado por sonegação fiscal e lavagem de dinheiro por meio de campanhas eleitorais.

Negrão, agora também denunciado por lavagem de dinheiro na CPI do Banestado, contribuiu para duas campanhas: a do vereador Roberto Mingone, chamado a depor como suspeito de integrar a quadrilha de Sozza quando era líder do prefeito Chico Amaral (1996-2000) na Câmara Municipal; e a do promotor Carlos Sampaio, do PSDB, adversário de Toninho no segundo turno das eleições campineiras.

Sem medo de ser honesto

Mas é um homem que se julga sem inimigos esse que agora examina, em seu gabinete no quarto andar do Palácio dos Jequitibás, sede do Executivo, documentos que aguardam sua assinatura.

Antes de sacar a Montblanc preta e dourada, que ganhou da mulher, discute-os em detalhes com os secretários.

“Expliquem devagar, sou português”, costuma dizer, referindo-se à nacionalidade dos pais, para suavizar a cobrança.

A oito meses e dez dias de sua administração, a cidade colhe os primeiros frutos desse zelo: foram 40 milhões de reais economizados no contrato renegociado com as empresas de limpeza urbana e mais 14 milhões na merenda escolar, além do cancelamento de contratos com empresas de segurança particulares.

O Departamento de Urbanismo, foco de corrupção das prefeituras anteriores, passou a ser chefiado por um assessor de sua total confiança, o arquiteto Luís Aquino, e a fiscalização substituiu as propinas que “agilizavam” a concessão de alvarás.

O prefeito é especialmente exigente para liberar novos empreendimentos imobiliários, principalmente quando estão localizados na franja da cidade ou em áreas rurais.

Uma das metas de sua gestão é conter a expansão territorial acelerada, puxada ao norte pelos condomínios de luxo – onde, três meses depois de tomar posse, ele criou uma APA (área de preservação ambiental), apesar dos protestos de proprietários de terras na região – e a sudeste e sudoeste pelas favelas que abrigam cerca de 13 por cento da população campineira, mais de 150.000 pessoas.

“O crescimento urbano tem de ser em direção ao centro, ocupando os vazios urbanos e aproveitando a infra-estrutura, não na área rural que deve ser preservada”, repete o urbanista que entrou no PT em 1981 como militante dos movimentos populares por moradia.

Toninho chama Valda de Marchi, sua secretária desde 1989, quando ele assumiu a Secretaria de Obras e a vice-prefeitura de Jacó Bittar, do PT.

Em maio de 1991, seria exonerado por apontar irregularidades em licitações da prefeitura – confirmadas depois em sentença judicial que condenou Bittar a devolver 750.000 reais aos cofres municipais – e Valda pediu a aposentadoria para se tornar sua secretária particular.

Ela participou da campanha cujos símbolos permanecem no gabinete do chefe: a pipa branca com uma estrela vermelha que ele empinou do alto do prédio do Palácio dos Jequitibás junto com o menino que a confeccionou para comemorar a vitória, e a bandeira do PT feita de retalhos coloridos pendurada atrás de sua mesa, ao lado das bandeiras do Brasil, de São Paulo e de Campinas.

Não foi fácil conquistar os 290.132 eleitores (59,7 por cento dos votos válidos) que lhe deram a vitória.

Embora fosse um candidato carismático, considerado incorruptível e apaixonado pela cidade, enfrentou oposição ferrenha da conservadora elite campineira;

dos dois principais jornais da cidade – Correio Popular e Diário do Povo, ambos do mesmo proprietário, Silvino de Godoy;

da EPTV (a retransmissora da Globo, da família Coutinho Nogueira;

da Bandeirantes, cujos donos são proprietários de terras em Campinas;

do Judiciário; e da polícia – delegados e investigadores participaram até da boca de urna do tucano Carlos Sampaio.

Mas a cidade estava traumatizada pela passagem da CPI, pela criminalidade crescente, pelo desemprego provocado pela abertura de mercado do governo federal e pelo abandono a que tinha sido condenada na gestão de Chico Amaral.

Votou em quem representava a mudança e tinha um projeto consistente para realizá-la.

Nesses últimos dias Toninho andava tenso e irritado sem dizer por que.

Talvez fosse pelos problemas que enfrentava na região de Viracopos, onde as obras de expansão do maior aeroporto de cargas do Brasil exigiam a desapropriação de 9 milhões de metros quadrados e a transferência de 4.700 famílias para outras áreas da cidade.

Havia quase dez anos a Infraero tentava fazer a obra, mas os prefeitos anteriores não levaram o projeto adiante justamente pela dificuldade de desapropriar uma área tão grande.

Toninho considerava importante para a cidade a expansão do aeroporto e via na necessidade de reacomodar os moradores a oportunidade de realizar um projeto urbanístico digno, de acordo com suas convicções.

Inimigo dos grandes conjuntos habitacionais por acreditar que alta densidade populacional em bairros longínquos e sem infra-estrutura reforça a exclusão, Toninho queria assentar os moradores em pequenos núcleos urbanos (com escola, posto de saúde e comércio) próximos à avenida Santos Dumont, na entrada da cidade, região de grande valorização imobiliária.

O plano, batizado de Cidade Viracopos, foi discutido com as associações de moradores do local – que representavam de bairros urbanizados a loteamentos clandestinos e favelas – em diversas reuniões no salão azul da prefeitura.

Os interessados em aderir ao projeto da prefeitura visitaram sete áreas cogitadas para acomodá-los e escolheram três delas.

Só duas das dezessete associações resistiam à mudança, ambas localizadas na cabeceira da pista – uma por oposição política ao prefeito e a outra por pressões de traficantes preocupados com a remoção das favelas, usadas como esconderijo de drogas e cargas roubadas.

Foi nessa região, no limite com o município de Indaiatuba, que a Polícia Militar da cidade vizinha descobriu 341 quilos de cocaína cobertos por uma lona à beira da estrada, provavelmente aguardando transporte.

A droga pertencia a uma das maiores traficantes do Estado, Sônia Maria Aparecida Rossi, a Maria do Pó, mas o delegado titular da Dise (Delegacia de Investigações Sobre Entorpecentes) de Campinas, Ricardo Lima, reservou à traficante o inocente papel de testemunha, soltando-a em seguida.

Pouco depois, em janeiro de 1999, a droga sumiu do Instituto Médico-Legal de Campinas, episódio que esteve no centro das investigações da CPI do Narcotráfico.

O motorista de Maria do Pó, Márcio Costa Lima, contou aos deputados da CPI que sua patroa “trabalhava” sob a proteção de seis delegados e dez investigadores da polícia de Campinas e que os próprios policiais arrombaram as grades do IML e carregaram a droga em um Santana da Polícia Civil e em uma perua Quantum, para devolvê-la à traficante.

Valda, a fiel escudeira de Toninho, lembrava-se bem da última reunião com as associações de Viracopos, ocorrida no final de agosto, quando a prefeitura teve de providenciar abrigo para Míriam, representante de uma das associações, que se declarou ameaçada de morte por defender o projeto de Toninho.

Será que o prefeito estava aborrecido por temer o fracasso do projeto que era a sua menina dos olhos ou havia algo mais?

Teria sido Míriam a única a sofrer ameaças?, perguntava-se Valda, tentando adivinhar os motivos da tensão do chefe que agora se despedia com a delicadeza e a alegria costumeiras dos assessores Marco e Henrique, para acompanhar a mulher, Roseana, que o esperava para almoçar em casa, onde também o aguardava a mãe, dona Clemência.

Marina já tinha ido para a escola – embora estudasse a alguns quarteirões do prédio onde morava, ia de motorista, por medida de segurança.

Com a filha, Toninho se preocupava.

Por ela deixou transparecer em casa uma única vez o nervosismo que Valda notara na prefeitura no último mês.

Quinze dias antes, quando estava com a mulher no quarto, fechou a porta e disse:

“Estou preocupado com a Marina. Estou mexendo em coisas lá em Viracopos, não sei bem no que, é melhor a gente ficar esperto”.

Roseana garantiu que não deixaria a filha sair sem proteção, mas não ficou muito preocupada.

Estava acostumada com o marido metido em vespeiros.

Ele não tocou mais no assunto e parecia relaxado naquele último almoço com a mãe e a mulher.

Maria Piedade, uma estranha personagem

Antes de tomar o primeiro cafezinho da tarde na xícara com o emblema de seu time, a Ponte Preta, Toninho foi procurado pelo vereador Sebastião Arcanjo, o Tiãozinho, hoje deputado estadual, para participar de um ato solene do Movimento Negro, no salão vermelho da prefeitura.

Ele prometeu a Tiãozinho que desceria mais tarde para o encerramento da cerimônia – queria também cumprimentar o senador Eduardo Suplicy, que vinha de São Paulo.
Recebeu uma comissão de representantes de associações de bairro para assinar um convênio e depois chamou a oficial-de-gabinete Inês de França Bento, pedindo que enviasse um e-mail a Maria Piedade Botelho Vasques Cunha e Eça e Almeida com a mensagem padrão:

“Senhora Maria Piedade, recebi e agradeço seu e-mail.

Atenciosamente, Antônio da Costa Santos”.

Uma resposta lacônica para a longa carta enviada oito dias antes pela portuguesa trazida a seu gabinete assim que tomou posse, em janeiro de 2001, por Roberto Telles Sampaio, também advogado de Toninho e seu nome favorito para a Secretaria da Segurança Pública (que ficou com Péricles Caramaschi).

Maria Piedade havia lecionado filosofia na Faculdade de Jornalismo da PUC de Campinas em 1987, período em que Toninho também era professor na Faculdade de Arquitetura e Urbanismo, e deixara um cartão de visita onde se lia embaixo de seu longo sobrenome: “Livre-docente do Instituto de Estudos Avançados da USP”.

Como representante da USP, passou a participar do Conselho Municipal de Segurança – formado por organizações da sociedade civil, universidades –, PUC, Unicamp e Unesp, e pelas duas polícias – Civil e Militar – para contribuir com a política de segurança da prefeitura.

Alguns meses depois, porém, começou a publicar artigos no Correio Popular contra a política de segurança municipal.

A linguagem e as posições defendidas por Maria Piedade nesses artigos levaram Toninho a desconfiar de sua condição de acadêmica e no dia 21 de agosto ele pediu que Inês, sua oficial-de-gabinete, fosse em sigilo à USP entregar um ofício ao reitor Jacques Marcovitch, indagando se a portuguesa tinha ligações com a universidade.

No dia seguinte, antes de Toninho receber a resposta do reitor, Maria Piedade enviou um e-mail a Luís Cláudio Bittencourt, assessor do prefeito, reclamando de sua titulação acadêmica estar sendo questionada.

O fato de Maria Piedade estar a par da investigação, sigilosa, era mais surpreendente do que a resposta que veio no dia seguinte da USP, informando que ela não tinha qualquer vínculo com o IEA.

Bittencourt chegou a suspeitar de escuta clandestina no gabinete – o marido da portuguesa, Fernando Benjamim de Almeida, é advogado de traficantes do Jardim São Fernando e do investigador Lázaro Antônio Constâncio, o Lazinho, policial muito conhecido na cidade que está enrolado em diversos inquéritos por abuso de autoridade, tortura e corrupção, e foi preso pela CPI do Narcotráfico dois anos antes.

Lazinho, como sabia Toninho – que, junto com muitos campineiros, aplaudiu quando o policial saiu algemado do Fórum de Campinas –, fez parte do DOI-Codi durante a ditadura militar e figura ao lado do delegado Sérgio Paranhos Fleury entre os torturadores apontados em uma carta dirigida à OAB em 1975 por 34 prisioneiros políticos.

O prefeito enviou novo ofício à USP, dessa vez acompanhado de documentação que a própria Maria Piedade forneceu para provar sua titulação.

A USP respondeu que ela jamais havia feito parte do quadro de professores ou de alunos, nem na graduação nem na pós-praduação, e que os documentos que fornecera eram falsos.

Foi quando a portuguesa mandou o queixoso e-mail, respondido por Inês às 16h04m desse 10 de setembro e cuja cópia o prefeito guardou para juntar aos documentos que vinha colecionando desde o início da investigação, uma espécie de dossiê que exibiria para desmascarar a professora na próxima reunião do conselho, marcada para quatro dias depois.

Em seguida, recebeu o escritor Fernando Moraes e sua mulher, Marina Maluf, que tinham uma audiência marcada para 17 horas:

a questão que levou Moraes ao gabinete foi resolvida em cinco minutos, mas o casal continuou conversando entusiasmadamente com o prefeito, que falou de seus planos para a cidade, incluindo um projeto que realizaria com Oscar Niemeyer.

Na saída, Toninho os apresentou a Roseana, que o aguardava para avisar que o encontraria mais tarde na academia de ginástica do cunhado, Paulo Roberto.

Toninho se reuniu então com os secretários Durval, Gerardo e Genival Côrtes, para discutir as mudanças no segundo escalão da prefeitura.

O secretário Nilson Lucílio também estava na sala e foi quem atendeu, a pedido de Toninho, o telefonema de Roberto Telles às 19h15, que queria saber por que estavam investigando a vida de sua amiga, Maria Piedade.
Nilson fingiu desconhecer o caso e disse que Toninho não podia atender.

Desligando o telefone, perguntou ao prefeito onde estava o dossiê sobre a falsa professora, ouvindo como resposta: “Está comigo, no meu carro”.

Valda entrou na sala para avisar Toninho que o aguardavam para encerrar a cerimônia do Movimento Negro.

Ele respondeu que iria logo e assinou o penúltimo documento como prefeito: um decreto revogando a permissão de uso outorgada pelo prefeito anterior ao loteamento Parque Alto do Taquaral, impedindo assim que os moradores fechassem as ruas do bairro, “privatizando o espaço público”.

Quando voltou ao gabinete para se despedir, Valda viu que Toninho já havia descido para o salão vermelho, onde fez seu último discurso e assinou seu último decreto, oficializando o dia 20 de novembro como feriado dedicado a Zumbi dos Palmares.

Depois Valda se daria conta de que era a primeira vez que saía sem se despedir dele desde que trabalhavam juntos.

Às 20h40, o prefeito deixou sua última mensagem, no celular da filha:

“Alô, querida Marina, orgulho da minha vida, a pessoa que mais adoro neste planeta de 6 bilhões de habitantes. Minha querida filha, não esquece de pegar o terno do seu pai no Shopping Iguatemi, tá bom? Estão as meias, as camisas e os ternos”.


De acordo com as testemunhas, o Vectra passou na contramão pelo Palio de Toninho – “fechando” o último carro perto do acesso da rodovia Dom Pedro I, quando o prefeito já havia sido baleado.

Por isso não faz sentido dizer que os assassinos atiraram porque ele atrapalhava o trânsito.

Também é importante notar que ninguém dos carros mais próximos – que aparecem em tom mais claro no croquis – compareceu para depor, o que faz pensar que Toninho estivesse “escoltado” por outros veículos envolvidos no crime.

A reconstituição da cena do crime até hoje não foi realizada e obras modificaram o traçado original do local.

O crime

Marina esqueceu de pegar os ternos, disse-lhe Roseana, quando o casal saía da academia de ginástica, pouco antes das 10 da noite.

Toninho resolveu passar no shopping e Roseana foi para casa sozinha.

Pôs a água no fogo para fazer um macarrão, tomou banho e, quando viu que passava das 10 e meia e ele ainda não tinha chegado, ligou para o celular.

Levou um susto quando ouviu de uma voz estranha:

“Quem quer falar com ele? É da Polícia Militar” – e desligou.

Pensou que Toninho tinha sido seqüestrado – como foram 39 pessoas naquele ano em Campinas.

Percebendo a mãe nervosa, Marina também ligou para o celular do pai e de novo uma voz:

“Polícia Militar, quer falar com o prefeito?” – e desligou.

Roseana telefonou então a Gerardo, o chefe de gabinete de Toninho, que também ligou para o celular do prefeito e ouviu o policial militar que atendeu se identificar como Custódio e dizer que Toninho tinha se ferido em um tiroteio e um médico do serviço municipal estava averiguando se estava vivo.

Gerardo ligou para Roseana, dizendo que ficasse em casa e que sua mulher, Márcia, estava indo encontrá-la, e dirigiu-se ao local do crime, a menos de 1 quilômetro do prédio onde morava Toninho, ao lado da rodovia Pedro I.

Sem saber como obter informações sobre o marido, Roseana ligou para o 190, perguntando se algo havia acontecido com o prefeito, e escutou, perplexa:

“Noventa e nove por cento de chance de que o prefeito tenha sofrido um atentado. Ele foi encontrado baleado em um Palio na avenida Mackenzie, na saída do Shopping Iguatemi”.

As emissoras de rádio e de televisão noticiaram o crime pouco antes das 23 horas, foi como uma bomba na cidade.

“Ficamos apavorados e envergonhados com mais esse escândalo. Um castigo para a arrogância campineira”, lembra Lúcia d’Otavianno, presidente do Conselho de Segurança do Cambuí, um dos bairros mais chiques da cidade.

Ao que tudo indica, o assassino estava em um Vectra prata que vinha na contramão da avenida Mackenzie em alta velocidade quando disparou contra o Palio do prefeito, também em movimento.

A primeira bala estilhaçou o vidro lateral esquerdo traseiro e atravessou o banco do passageiro.

A segunda atingiu Toninho, que encolheu os braços em uma reação de defesa, atravessou seu braço esquerdo, o tórax, quebrou a costela, atravessou o pulmão e saiu pelas costas.

O terceiro tiro foi disparado depois que o carro já havia ultrapassado o de Toninho, atingindo a coluna lateral esquerda do vidro da frente.

O Palio derivou à esquerda, invadiu a pista do sentindo contrário e entrou em um terreno baldio, chocando-se contra a base de um outdoor.

Os soldados do 8o BPM que encontraram o corpo – Robson Biazon, Júlio César de Carvalho e José Valmir Franco – disseram ao delegado José Roberto Mecherino de Andrade que foram acionados pelo Copom às 22h34 para verificar um veículo abandonado em um matagal.

Encontraram o Palio de motor ligado e faróis acesos “e, ao se aproximarem, notaram um homem ao volante baleado e caído, aparentemente em óbito”, chamando a ambulância.

Os soldados relataram ter encontrado duas cápsulas deflagradas de calibre 9 milímetros, a cerca de 300 ou 400 metros de distância.

O aparelho celular do prefeito, manchado de sangue, registrava seis ligações feitas depois do assassinato: às 22h56m, para retirar os recados da caixa postal e “para Joel” – que constava da agenda do celular, mas não foi identificado; às 22h57, para a filha do prefeito (deixando a mensagem de que havia sido encontrado um corpo em um Palio prata); às 22h59, para o 190; e mais duas chamadas não atendidas pelo secretário Durval de Carvalho.

O delegado José Roberto Mecherino de Andrade, do Setor de Homicídios da Delegacia de Investigações Gerais (DIG) de Campinas, passou a presidir o inquérito instaurado em seguida, e duas testemunhas depuseram nessa madrugada:

Alexandre Vicente Brandão, motorista de uma loja do shopping, que passou com sua van pelo local do crime às 22h15, “notando o Palio com faróis acesos e motor ligado”; e José Aparecido Ortiz, porteiro da concessionária Adara (ao lado do terreno onde foi encontrado o carro do prefeito), que disse ter escutado “um barulho alto que parecia ser de dois ou três disparos na parte da frente da concessionária e, em seguida, um barulho de moto acelerando alto”.

O local do crime foi invadido por dezenas de policiais, políticos, amigos, eleitores e curiosos.

O corpo foi mudado de posição e não havia mais como procurar qualquer tipo de pista depois de toda aquela gente passar por ali.

Na mesma noite descobriu-se que os óculos escuros Armani e a caneta Montblanc do prefeito tinham sumido do carro, assim como o dossiê sobre Maria Piedade.

Os papéis nunca seriam encontrados, mas os óculos e a caneta foram restituídos à família pela polícia dois meses depois, após uma reclamação da viúva ao secretário estadual de Segurança Pública, Marco Vinicius Petreluzzi.

A confusão da cena do crime repetiu-se no gabinete do prefeito, que não foi isolado pela polícia.

O senador Eduardo Suplicy, ainda em Campinas, avisou o então presidente do PT, Lula, que chegou de madrugada acompanhado de outros figurões.

A cidade amanheceu entre o luto e a revolta naquele que se tornaria o mais famoso 11 de setembro campineiro em todos os tempos, como conta o escritor campineiro Guilherme Scalzilli:

“De manhã, à cata de informações sobre o assassinato, assisti à segunda colisão no World Trade Center, em Nova York.

O mundo só falou disso, e por meses, mas a população de Campinas vivia sua própria catástrofe.

Quase não se trabalhou naquela terça-feira nublada.

O corpo foi velado no prédio da prefeitura, de onde saía uma gigantesca fila de cidadãos, contornando as principais ruas do centro.

Por todo o trajeto até o cemitério da Saudade, as pessoas foram silenciosamente se avolumando.

À tarde, quando o séquito passou, seguindo os dois caminhões forrados de flores, receberam-no quilômetros de gente triste, revoltada e confusa.

As perguntas que então fazíamos continuaram sem respostas.

Autoridades deram suas versões contraditórias e inverossímeis, das quais já estávamos preparados para suspeitar, principalmente depois de sabermos que a cena do crime havia sido adulterada pela própria polícia, sequer preservando as provas mais importantes.

E terminamos por digerir a indignação no torpor conformado dos que acompanham a mortandade cotidiana, fingindo acreditar que tamanho absurdo pudesse conter algo de ‘crime banal’”.

Fatos e versões



A teoria do crime por motivação banal a que se refere Scalzilli foi anunciada à população de Campinas no dia 8 de maio de 2002 pelo presidente do inquérito, delegado Luiz Fernando Lopes Teixeira, do Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) de São Paulo.

De acordo com ele, Toninho dirigia devagar, atrapalhando a fuga de uma famosa quadrilha da cidade, que vinha de uma abordagem frustrada a um Vectra verde, a 2 quilômetros da avenida Mackenzie.

Os tiros teriam sido disparados por Anzo (Anderson José Bastos), ao ultrapassar o Palio do prefeito em um Vectra prata roubado com placas de Uberlândia, onde também estariam Valmirzinho (Valmir Conte), Fiinho (Valdeci de Souza) e Andinho (Wanderson Nilton de Paula Lima), contra quem o Ministério Público Estadual (MPE) ofereceu a ação penal um mês depois, já que dos quatro é o único vivo.

Anzo e Walmir foram mortos pela Polícia Civil de Campinas em Caraguatatuba, três semanas depois do assassinato do prefeito, e Fiinho morreu trocando tiros com os policiais do Denarc, de São Paulo, quando estava com Andinho em uma chácara em Itu.

Depois de exibido à imprensa como líder da mais importante quadrilha do interior do Estado, foi enviado ao presídio de segurança máxima de Presidente Bernardes, onde está até agora.

No dia 28 de julho de 2002, o presidente do Tribunal do Júri, José Henrique Torres, instaurou o processo contra Andinho.

Até o momento, setembro de 2003, o juiz não decidiu se vai pronunciá-lo como réu pelo assassinato de Toninho e mandá-lo a júri popular, que pela lei brasileira julga os homicídios.

Ele pode optar por outras três alternativas: absolver sumariamente, arquivando o processo; desclassificar o crime, dizendo que não se trata de homicídio qualificado, como aparece na denúncia dos promotores; ou impronunciar o réu, deixando o processo em aberto até que o Ministério Público Estadual faça nova prova de autoria do crime.

Há um ano e dois meses, o processo está em fase de instrução do juiz, período em que pode interrogar testemunhas, pedir novas diligências e perícias para dirimir suas dúvidas e então se manifestar.

Os promotores Ricardo Silvares, Carlos Ayres, Alexandre Wild e Fernando Vianna não escondem sua impaciência com a demora da decisão do juiz, que interpretam como dúvida em relação à denúncia assinada pelos quatro.

O MPE acatou as conclusões do inquérito policial no que se refere à autoria do crime e às circunstâncias em que ocorreu – mas não apontou a motivação do crime, como me explicam os promotores nessa tarde de junho na sede do Ministério Público Estadual, um casarão de vizinhança abastada no bairro Nova Campinas.

Percebo que os jovens e engravatados promotores estão na defensiva, assim que faço a primeira pergunta:

“Não foi então um crime por motivo banal?”

Fernando Vianna retruca:

“E animal precisa de motivo para matar?”

Mais ponderado, Ricardo Silvares explica:

“Não temos elementos para determinar o motivo do crime”.

“E isso não é importante?”

Novamente Vianna se aborrece:

“Não. Se alguém entrar nesta sala e atirar em um de nós, podemos processar o autor dos disparos por homicídio mesmo que ninguém saiba por que atirou”.

“Mas alguém viu Anzo atirar no prefeito?”, devolvo.

“Temos outras provas”, responde Ricardo.

Os promotores passam a falar então das provas periciais obtidas durante o inquérito policial.

A principal delas é o resultado de um laudo de comparação balística entre dois cartuchos encontrados no local do crime e três outros recolhidos durante a investigação de um seqüestro de um menino de 9 anos ocorrido três dias depois do assassinato do prefeito.

Quando foi preso pelo Denarc, Andinho confessou ter participado desse seqüestro com quatro cúmplices:

Cristiano Nascimento de Faria, o Cris, e os já citados Fiinho, Valmir e Anzo.

Este último disparou três tiros de uma pistola 9 milímetros (mesmo calibre do projétil que matou o prefeito) ao abordar o carro da mãe do mesmo a alguns metros desse mesmo casarão onde me encontro.

A perícia concluiu que os cartuchos de ambos os crimes foram disparados pela mesma arma.

Como essa é minha primeira reportagem policial, peço explicações mais detalhadas.

Fico sabendo que a arma deixa uma marca no cartucho disparado, o picote, que funciona como uma espécie de assinatura.

“Por isso é possível dizer, como fez a perícia, que a mesma arma disparada por Anzo no dia do seqüestro matou o prefeito”, explica pacientemente Carlos Ayres.

“Mas foi Anzo quem disparou a pistola 9 milímetros que matou o prefeito?”

Os promotores se impacientam, mas Silvares, condescendente, explica:

Cris, foragido do presídio de Hortolândia e preso pouco depois de Andinho, deu um depoimento ao DHPP em que negou ter participado do seqüestro do menino, como havia dito Andinho, mas afirmou que estivera com Anzo em Caraguatatuba três dias antes de sua morte.

Nessa ocasião, teria ouvido dele a confissão de que disparara contra o prefeito do interior do Vectra prata, onde estavam também Valmir, o “dono” do carro, Fiinho e Andinho.

Anzo também lhe teria dito que atirou para assustar o motorista do Palio, que atrapalhava o bando em fuga depois de tentar “catar um véio” em um Vectra verde
.

Esse depoimento é peça-chave no inquérito, já que é o único a apontar a autoria dos disparos.

Também confirma que o Vectra verde teria sido abordado pela quadrilha minutos antes de matar Toninho.

“Foi por causa desse depoimento que a polícia chegou à teoria do crime banal?”

Os promotores confirmam, acrescentando que duas outras provas periciais sustentam a versão da abordagem do bando ao Vectra verde, de propriedade do auditor fiscal aposentado Uilson Franco, ambas feitas pela perita Cristiane Dias, do Instituto de Criminalística de Campinas: no dia 27 de setembro, a perita concluiu que os dois Vectra – o prata e o verde – colidiram entre si, confirmando os depoimentos prestados no dia anterior pelo auditor fiscal e pelo pedreiro Celso Alves dos Santos (que estava com Uilson), de que o Vectra prata bateu diversas vezes no carro, tentando fazê-lo parar.

Cristiane também encontrou três furos de bala no carro e no dia 4 de fevereiro submeteu dois cartuchos calibre 45, que teriam sido encontrados no local onde Uilson foi atacado, a um exame de comparação balística, concluindo que esses foram disparados por outra arma usada no seqüestro do menino.

Minha cabeça deu um nó:

“Mas os cartuchos encontrados no seqüestro do menino não eram da pistola calibre 9 milímetros que matou o prefeito?”

“Sim, mas também havia um cartucho de calibre 45 no local do seqüestro do menino”, responde Carlos Ayres.

Confiro minhas anotações. “Mas Andinho não disse que foram três tiros que Anzo disparou naquele dia?

A mãe do menino disse o mesmo em seu depoimento.” Silvares confirma: “Mas esse cartucho, encontrado depois, também foi encaminhado à perícia”.

“E as armas?”, pergunto e descubro, surpresa, que nenhuma das armas, nem a pistola 9 milímetros que matou Toninho nem essa que disparou os tiros de calibre 45, foi encontrada.

As provas parecem frágeis.

Além de a arma do crime não ter sido encontrada, o depoimento de um bandido contando uma história que diz ter ouvido de outro bandido é o único a dizer que Andinho e Fiinho estavam no carro (Valmir e Anzo foram vistos no Vectra prata por outras testemunhas).

Por fim, aparece esse misterioso quarto tiro no seqüestro do menino.

“Como o Ministério Público pôde apresentar denúncia contra Andinho apoiado nessas provas?”, pergunto.

Os promotores se irritam de vez.

Vianna assume tom acusador:

“Você está querendo livrar a cara de um marginal como Andinho? Ele era líder da quadrilha, ninguém fazia nada sem ordem dele. Se você quer mesmo saber, a Polícia Federal já havia descoberto a participação de Andinho no crime uma semana depois do assassinato de Toninho”.

Antes que eu consiga esclarecer a participação da Polícia Federal no caso – não há nada sobre isso no inquérito –, os promotores pedem licença e encerram a entrevista.

Quando estou saindo da sala, Vianna me alerta:

“Olha, veja bem quem são suas fontes.
A viúva é candidata”.


Confirmo então a impressão que tive assim que os encontrei: estavam na defensiva.

Desconfiam que Roseana Garcia, a viúva de Toninho, está por trás da reportagem, já que é sempre a primeira a levantar dúvidas sobre a investigação do crime nas matérias publicadas pela imprensa.

Ligo para Roseana Garcia – a quem tinha entrevistado dias antes – para checar a informação de Vianna.

Ela confirma que pensou em candidatura, mas desistiu:

“Sou psicóloga, nunca fui política. Não posso substituir Antônio”.

Ela também conta que ganhou a antipatia dos promotores por reclamar de o inquérito sobre as mortes de Valmir e Anzo, investigadas pela Corregedoria por suspeita de execução, não ter sido anexado aos autos.

Sem saber, eu havia feito a mesma pergunta aos promotores.

Afinal, os dois já eram suspeitos do crime quando foram mortos pela polícia.

Mas os promotores insistem: são casos diferentes e devem ser investigados separadamente.

Um parêntesis importante

Antes do estarrecedor relato de uma chacina ocorrida em Caraguatatuba, litoral de São Paulo, cabe uma explicação.

O inquérito que apura a morte de Toninho ficou sob responsabilidade do Setor de Homicídios da Delegacia de Investigações Gerais de Campinas desde o dia do crime até janeiro de 2002.

Quatro dias depois de tal chacina, em 6 de outubro de 2001, o delegado seccional Osmar Porcelli anunciou ter solucionado o caso do assassinato do prefeito:

Toninho tinha sido vítima de um latrocínio praticado por quatro rapazes moradores de uma favela próxima ao local do crime, um deles menor de idade, todos com passagem pela polícia por pequenos delitos. Os quatro estavam em duas motos e um deles disparou contra o carro do prefeito porque Toninho tentou fugir. Um dos rapazes já havia confessado o crime e apontado seus comparsas, afirmava Porcelli.

Alguns dias depois, outros dois confessariam, inclusive o que teria atirado. Só um negou ter participado do crime.



No final de 2001, no entanto, descobriu-se que os rapazes tinham confessado sob tortura e que a polícia coagira uma testemunha para dizer que havia visto as motos no local do crime, já que isso não havia sido mencionado por ninguém.

O que constava do inquérito, naquele momento, era o depoimento de quatro pessoas que haviam visto um Vectra prata ou cinza no local do crime.

Apesar disso, os dois Vectra pratas que foram encontrados na madrugada do crime já não estavam mais com a polícia.


Um deles tinha placas de Campinas, fora roubado duas horas antes do assassinato e devolvido na mesma madrugada ao dono, Dionísio Barnabé de Oliveira, dispensado sem depor.

O outro, roubado em Uberlândia cinco meses antes, circulava com placas clonadas e foi apreendido e periciado por Cristiane Dias, que produziu os laudos citados pelos promotores e retirou as impressões digitais que mais tarde seriam comparadas às dos suspeitos.

Em dezembro, o Ministério Público descobriu que esse carro – peça fundamental na investigação do crime – já havia sido devolvido à seguradora Itaú e o localizou em uma oficina de funilaria.

Diante de mais esse escândalo, o secretário de Segurança Pública, Marcos Vinicius Petreluzzi, designou o Departamento de Homicídios e Proteção à Pessoa (DHPP) da capital para “ajudar a polícia de Campinas”.

A partir daí apareceram diversas testemunhas que haviam visto o Vectra em alta velocidade na contramão, quando ouviram os disparos, e comunicado o fato à polícia sem que seu depoimento formal fosse tomado.

Em janeiro de 2002, nova ordem da Secretaria da Segurança transferiu a presidência do inquérito para o DHPP, afastando o delegado da DIG de Campinas.

Quatro meses depois, o inquérito foi concluído e entregue ao Ministério Público, que então ofereceu a denúncia contra Andinho.

Muito antes disso, como disse o promotor Fernando Vianna, a Polícia Federal já havia apontado o envolvimento de Andinho no crime.

Segundo o delegado Ademir Tozzo, diretor da Polícia Federal em Campinas, foi entregue um relatório para o Ministério da Justiça “que continha apenas informações que circulavam sobre o crime entre os próprios policiais e não foi anexado ao inquérito porque nenhum órgão competente requisitou formalmente a participação da PF no caso”.

O fato é que, dias depois do assassinato, a polícia de Campinas já suspeitava do envolvimento de Andinho no crime e antes do final do mês de setembro conhecia as provas periciais que respaldam a ação penal oferecida contra ele ao juiz.

O episódio de Caraguatatuba, que relato a seguir, mostra até que ponto alguns policiais estavam dispostos a encobrir os fatos que poderiam elucidar o assassinato do prefeito.

A chacina de Caraguatatuba

Às 4 e meia da manhã do dia 2 de outubro de 2001, o delegado do 4o Distrito Policial de Campinas, Marcos Antônio Manfrin, os investigadores Rogério Diniz, Nelson da Costa e Alcir Biazon Jr. e os carcereiros Fábio Arruda Campos e Sandro José da Costa invadiram o condomínio Maré Mansa, em Caraguatatuba, onde mataram quatro rapazes que dormiam em um dos apartamentos, Fábio Soares Menengrone, de 22 anos, Alessandro Renato Pereira de Carvalho, 23 anos – ambos sem antecedentes criminais –, e os dois procurados, Valmir e Anzo.

Os corpos foram alvejados por dezoito tiros, no rosto, na cabeça e no tórax.

Depois de ouvir os disparos, o porteiro e o zelador viram os policiais retirando dois corpos do apartamento – depois reconhecidos por fotografia pelo zelador como os de Anzo e Valmir – e colocando-os no porta-malas do Passat que as próprias vítimas usavam.

Pouco depois, acionada por um vizinho, chegou a Polícia Militar, que chamou uma ambulância para transportar os corpos de Fábio e Alessandro.

Flagrados pela PM, os policiais de Campinas tiveram de retirar os corpos de Valmir e Anzo do porta-malas do Passat e comparecer à delegacia para registrar o BO.

Se a PM não tivesse chegado, é provável que ninguém tomasse conhecimento das circunstâncias em que foram mortos os dois acusados pelo assassinato do prefeito, até porque os policiais não apresentaram nenhum documento que os identificasse ao porteiro, assustado demais para exigi-lo.

Na delegacia, Manfrin disse que os quatro mortos haviam recebido os policiais a bala e, ao justificar por que estava tão longe de sua área de atuação sem avisar a polícia de Caraguatatuba, afirmou que Anzo e Valmir estavam envolvidos no seqüestro de Eduardo Ragazzi, que ainda se encontrava no cativeiro, e no assassinato do prefeito de Campinas.

Disse ainda que havia apreendido a arma que matou o prefeito no apartamento das vítimas – uma pistola Glock 9 milímetros –, que entregou ao delegado de Caraguatatuba junto com as armas que teriam sido disparadas pelos policiais na ocorrência.

A perícia das armas dos policiais mostrou que os projéteis que mataram os rapazes não haviam sido disparados por essas armas que Manfrin entregou.

A pistola 9 milímetros, enviada para o Instituto de Criminalística de Campinas, também não era a que matou o prefeito.

Quinze dias depois do crime, descobriu-se que a presença do carcereiro Sandro José da Costa na chacina fora omitida por Manfrin.

A participação do investigador Rogério Salum Diniz também foi omitida pelo delegado de Campinas e descobriu-se ainda, mais tarde, que uma escuta telefônica feita pelos policiais da Delegacia Anti-Seqüestros flagrou Rogério passando informações que recebia do investigador Eudes Trevisan, da Anti-Seqüestros, para Andinho.

Quando soube de sua prisão iminente, Rogério, homem abastado, inteligente e articulado, tentou uma última cartada: para desmoralizar os colegas que tinham feito a escuta telefônica, pediu ao investigador Trevisan que armasse uma entrevista para o foragido Andinho na EPTV – o que ele fez depois de ameaçar um conhecido que tinha contatos na emissora – e entregou a lista com os nomes dos que o haviam incriminado no telefonema com o seqüestrador.
No dia 26 de dezembro, a entrevista foi ao ar. De rosto coberto, Andinho disse que policiais da Anti-Seqüestro indicavam vítimas à sua quadrilha em troca de parte do resgate, e que havia dado 200.000 dólares a eles para escapar da prisão.

Quando o repórter perguntou os nomes dos policiais corruptos, Andinho obedientemente recitou a lista recebida de Diniz.

As ligações entre Andinho e a banda podre da polícia campineira ficaram ainda mais claras quando descobri quem eram os policiais responsáveis pela prisão e interrogatório dos motoqueiros apresentados por Porcelli, três dias depois da chacina de Caraguatatuba, como autores do assassinato do prefeito.
Também tinham sido eles os responsáveis pela coação da testemunha que “confirmaria” a presença de motos no local do crime:

Renato Teixeira Reis Neto, o Reizinho, cuja violência é conhecida dos moradores das favelas campineiras;

Élcio Gonçalves Sotelo, que acabara de sair da prisão e respondia a processo por tortura e desvio de carga;

e Fernando Arruda Penteado, condenado em março deste ano por formação de quadrilha.

Segundo a sentença do juiz, que o condenou a cinco anos de prisão, Arruda Penteado oferecia segurança à organização de William Sozza – aquela descoberta pela CPI do Narcotráfico –, “cuidando para que cargas ilícitas não fossem roubadas por outras quadrilhas e também para que seus integrantes não fossem extorquidos por outros policiais”.

Como no caso de Caraguatatuba, outro policial participava extra-oficialmente da investigação, até por trabalhar em São Paulo, apesar de morar em Campinas:

Lázaro Antônio Constâncio, o Lazinho do DOI-CodiI, cuja prisão – aplaudida por Toninho durante a CPI – não durara mais de um mês.

Foram as informações desses quatro policiais convocados por Osmar Porcelli para o caso que afastaram a quadrilha de Andinho do cenário do crime até que o DHPP a colocasse de volta no centro das investigações.

Breve biografia do acusado

Wanderson Nilton de Paula Lima, o Andinho, 24 anos, é freguês da polícia desde os 14 anos, quando passou a furtar toca-fitas de carros e a freqüentar o 10o Distrito Policial, que fica perto do bairro pobre onde morava, o Jardim São Fernando, e onde o investigador Rogério Diniz trabalhou.

Filho de um casal de delinqüentes, o garoto foi internado duas vezes na Febem Imigrantes e, segundo sua ex-mulher, Luciana Bernardino Seixas – hoje presa por tráfico de entorpecentes –, foi apelidado de Andinho pelos próprios policiais:

“Ele era novinho e os policiais, para brincar, diziam anjinho e acabou ficando Andinho”.

Semi-alfabetizado, magrinho e baixinho, teve uma meteórica ascensão no mundo do crime a partir de 1998, quando se tornou assaltante de casas e carros-fortes, sempre municiado de informações quentes.

Em meados de 2000, passou a seqüestrar, além de roubar.

As vítimas dos seqüestros eram previamente escolhidas – algumas já haviam sido assaltadas por ele antes – e retiradas de dentro de suas residências.

Esse último ponto é ressaltado pelo procurador Sílvio Artur Dias da Silva, sorteado como defensor público do seqüestrador no processo do crime cometido contra Toninho.

“O Andinho escolhia suas vítimas, não as abordava na rua, por isso fica difícil imaginar um motivo para que atirasse no prefeito. Além do mais, ele nega o crime desde a primeira vez que foi interrogado. Não faria nenhuma diferença para ele assumir mais esse crime entre os dezenove processos que responde. Ele já foi condenado a décadas de prisão.”

Pergunto ao doutor Sílvio por que Andinho tem um defensor público no caso Toninho, se contratou advogados para representá-lo nos outros processos.

Ele sorri, orgulhoso.

É um criminalista famoso, Andinho teve sorte quando seu nome foi sorteado para defendê-lo.

Como já era procurador antes da lei que exige dedicação exclusiva dos membros do Ministério Público, pode advogar em casos particulares em seu próprio escritório e tem clientes que pagam por seus serviços.

Um deles é Eudes Trevisan, o policial da Delegacia Anti-Seqüestro acusado, como Rogério Diniz, de fazer parte da quadrilha de Andinho.

O delegado do 4º DP

O 4o Distrito Policial de Campinas está entre os mais cobiçados por delegados e investigadores.

Localizado em uma bela avenida, em frente ao Parque Taquaral, cobre uma área nobre, incluindo a do Shopping Iguatemi.

Por isso, embora o inquérito de Toninho fosse presidido pelo delegado do Setor de Homicídios da DIG de Campinas, muitos dos policiais do distrito estiveram no local do crime no dia do assassinato de Toninho e participaram de alguma maneira das investigações.

O atual titular do 4o DP, delegado Cláudio Alvarenga, foi um deles.

Na ocasião era titular do 6o Distrito, mas já havia trabalhado no 4o DP, para onde voltou depois que Manfrin – o delegado envolvido com a chacina de Caraguatatuba – foi transferido para São Paulo.

Ele é o típico “tira” e se orgulha disso.

Fala alto e grosso, usa óculos escuros, cabelos meio compridos, roupas desleixadas.

Não gosta de delegado de terno, como os do DHPP.

Diz que Andinho foi “mitificado pela polícia e a imprensa, mas não passa de um pé-de-chinelo”.

E que continua a acreditar, contra todas as evidências, que foram os quatro meninos nas duas motos que mataram o prefeito:

“Eu que interroguei o Boca (o primeiro a confessar o crime), ele não foi torturado nada. Contou tudo direitinho”.

E prossegue:

“Eu nem gosto de confissão, prefiro descobrir o crime investigando. Você sabia que o crime teria sido filmado se acontecesse quinze minutos antes?”

Surpresa, escuto a explicação:

o hipermercado Carrefour tem uma câmara na área externa que fica girando para cobrir o entorno; a partir das 22 horas, no entanto, a câmara se volta para as docas – onde ficam armazenados os produtos – e pára de girar.

“Lembrei disso na hora e corri para lá, dava para ver o corpo dentro do carro”, diz ele.

“No dia do crime?”
, pergunto, cada vez mais perplexa.

Mas ele corrige:

“No dia seguinte. Daria para ver o corpo no carro”.

“E o senhor viu as fitas gravadas pela câmara?”

“Vi, eram imagens digitais, bastante nítidas. Aparecia o Palio do prefeito e um Vectra prata de passagem.”

“E as motos?”

“Apareciam também, perto do Vectra. O problema é que, quando foi feita a transposição das imagens digitais para vídeo, elas perderam a nitidez. E agora não temos como recuperá-las: os disquetes foram mandados para a matriz do Carrefour na França.”

Entre tantas revelações, pergunto o que acha das provas apresentadas pelo DHPP para acusar Andinho.

Ele dá de ombros.

“Esse tipo de prova com cápsulas só é válido quando há rastreabilidade, ou seja, quando elas são entregues lacradas imediatamente após serem encontradas, para que se tenha certeza de que realmente foram disparadas no local. Do contrário, você pode pegar qualquer cápsula e dizer que estava lá.”

“Mas eu li no inquérito que o soldado da PM que encontrou os cartuchos no local do crime do Toninho os entregou para o senhor!”

Ele faz cara de desentendido. Não lembra, talvez o ex-presidente do inquérito, José Roberto Mecherino, saiba.

“Ele foi meu escrivão aqui nesse distrito antes de ser delegado”, explica, enquanto disca o número do 6o Distrito onde Mecherino trabalha agora.

Diz que estou indo para lá e me passa o telefone. Uma voz assustada responde:

“Olha, estou ocupado. Quem comandava as investigações era o doutor Alvarenga e o doutor José Roberto Rocha Soares, do 7o DP, eu só presidia o inquérito”.

Hesito em procurar Rochinha, como é chamado o delegado que ele citou: foi ele o seccional substituído por Osmar Porcelli depois do episódio do sumiço da cocaína no IML investigado na CPI do Narcotráfico.

E o doutor Alvarenga já se despede, tem consulta marcada no dentista.



A última foto de Toninho (de pé), na homenagem a Zumbi dos Palmares. Pouco depois ele seria assassinado.

Dúvidas

A “rastreabilidade” dos cartuchos é um dos pontos investigados pelo juiz José Henrique Torres junto às testemunhas por ele convocadas a depor.

As versões são contraditórias em relação aos encontrados no local do assassinato do prefeito.

Dois soldados da PM que estavam na primeira viatura a chegar ao local do crime disseram ter entregado os cartuchos a Mecherino quando registraram a ocorrência.

O soldado Robson Biazon disse ao juiz que os recebeu de dois soldados que chegaram depois dele ao local, mas seu companheiro de viatura afirma ter sido o delegado Cláudio Alvarenga quem lhe entregou os cartuchos na noite do crime.

Para complicar, Robson é irmão de Alcir Biazon, investigador que estava na chacina de Caraguatatuba.

Como o local do crime não foi preservado, fica a pergunta: será que alguém começou a destruir as provas naquele momento?

Com relação aos cartuchos calibre 45 que ligam o Vectra verde ao Vectra prata – e que, portanto, estão na base da teoria do crime banal do DHPP –, a coisa é ainda mais complicada.

Uilson Franco, proprietário do Vectra verde, conta ter recebido um telefonema do delegado Rochinha informando que estava no local onde ele sofreu o atentado e havia encontrado duas cápsulas deflagradas.

É tudo que se sabe sobre o aparecimento desses cartuchos, já que ninguém assinou papel nenhum ao entregá-los ou recebê-los.

No local do seqüestro do menino, a situação é ainda pior: além de aparecer um quarto tiro, depois de seqüestradores e vítimas afirmarem ter sido três os disparos, o cartucho apareceu vários dias depois do crime respaldado por uma versão estranha.

O vigilante Pedro Bordon disse ter encontrado a cápsula na rua, em frente à casa do menino, entregando-a a um vizinho, Armando Henrique, que a pediu.

O vizinho diz que a guardou por curiosidade, mas deu a um delegado cujo nome não recorda, alguns dias depois.

A advogada da família de Toninho, Dora Cavalcanti Albuquerque – que substituiu Márcio Thomaz Bastos no caso quando ele foi nomeado ministro da Justiça –, acredita que “as circunstâncias duvidosas em que foram encontrados os projéteis prejudicam o vínculo entre os crimes”.

Como essa seria a principal prova de que a quadrilha de Andinho está envolvida no assassinato do prefeito, fica fragilizada a denúncia do MPE. Além disso, “a prova testemunhal (o depoimento de Cris) leva à suposição de que eram quatro os ocupantes do Vectra prata”, mas as testemunhas da noite do crime viram no máximo três pessoas no carro.

Cris também negou ao juiz a maior parte das afirmações que teriam sido feitas por ele no depoimento ao DHPP, único a apontar Andinho, Fiinho, Valmir e Anzo como ocupantes do Vectra prata.

Não reconhece nem sua assinatura.

Confirma que falou com Anzo, mas por telefone, quando este teria dito apenas:

“O prefeito morreu porque estava na hora errado no lugar errado” – frase que permite diversas interpretações.

Por fim, as impressões digitais recolhidas no Vectra prata não batem com as de nenhum dos quatro bandidos que estariam no carro.

Há ainda mais uma questão: muitas denúncias feitas no inquérito não foram suficientemente investigadas.

Existem depoimentos de mais de um preso dizendo que o assassino de Toninho recebeu dinheiro para matá-lo, apontando nomes e valores pagos.


Um deles diz até que foi o próprio Andinho, contratado por alguém que teria pago 500.000 reais pelo serviço.

A hipótese de o crime estar relacionado às atitudes de Toninho como fiscal da cidade antes de ser eleito e depois, como prefeito, também nunca foi investigada.

Nenhum dos muitos empresários que tiveram interesses prejudicados – em alguns casos, em milhões de reais por contratos rompidos ou obras embargadas – foi nem sequer convocado a depor.

Nem mesmo aqueles acusados de participar do crime organizado, apesar da atuação suspeita de policiais de Campinas denunciados pelo mesmo motivo.

O caso da portuguesa Maria Piedade, que apresentou falsos documentos para dizer que era livre-docente do IEA, da USP, também não foi esclarecido.

Entre os dezesseis volumes do processo, encontrei o rastreamento telefônico de Valmir Conte do mês de setembro de 2001 e fiz uma interessante descoberta:

no dia 21, Valmirzinho, um dos suspeitos assassinados em Caraguatatuba, fez uma breve ligação para Fernando Benjamin de Almeida, marido da portuguesa e advogado do policial Lazinho e de Paulão, o maior traficante do São Fernando, bairro de Andinho.

O mais estranho é que ele nega que Valmir fosse seu cliente.

Por que então teria recebido o telefonema de um bandido?

A viúva Roseana e os amigos mais próximos também acreditam que o prefeito não reagiria a um assalto nem a uma tentativa de seqüestro.

Um episódio é tido por eles como revelador:

no dia do último debate do segundo turno das eleições municipais entre Toninho e seu adversário tucano, o promotor e agora deputado Carlos Sampaio, quando Roseana o levava para o debate foram abordados por homens armados que fizeram Toninho sair do carro sob a mira de uma escopeta.

O futuro prefeito não esboçou nenhuma reação, nem de nervosismo.

Em seguida, participou do debate sem se abalar mesmo quando o tema era segurança, o tema preferido do adversário que defendia os condomínios fechados, a guarda municipal armada e até hoje é lembrado por policiais, como o atual seccional Miguel Voigt, quando agradecem uma nomeação.

Só quando o debate acabou, o prefeito desabafou e chorou.

O carro dele seria encontrado a alguns quarteirões do “assalto” sem que nada tenha sido roubado, a não ser o toca-fitas e material de campanha.

3 comentários:

"Política sem medo" disse...

Excelente apanhado do acontecimento lamentavel com o Toninho do PT. Marverde. Ele assim como Celso Daniel era um dos raros petistas que prestava. O resto e lixo. Agora em 10 de Setembro de 2010 serao 9 anos de sua morte e nada foi feito quanto a prisao dos assassinos.Para mim os dois foram assassinados a mando de Lula e Ze Dirceu. O onus da prova e meu? Que se dane o PT e toda a sua corja. La no meu blog sempre posto alguma coisa sobre esses dois assassinatos.Abracos, Tereza

Anônimo disse...

very good!

Anônimo disse...

quem sabe toda a historia é Rogerio investigador, que na época de faculdade era conhecido por "Santista", ele é capaz de esclarecer o fato, motivo, autoria etc...