Sempre que o deputado João Paulo Cunha reaparece no noticiário político-policial, faço questão de homenageá-lo com a republicação de um artigo que, em dezembro de 2005, apresentou aos leitores do Jornal do Brasil o parlamentar do PT paulista que presidia a Câmara quando explodiu o escândalo do mensalão.
Embora enfiado no pântano até o pescoço, ou por isso mesmo, João Paulo começou a irritar-se já no título (“A coalizão dos vigaristas”).
Ao estacionar no ponto final, o descobridor de Marcos Valério estava grávido de indignação com tudo o que lera, especialmente com o parágrafo abaixo transcrito:
“Vocês ainda vão ouvir falar muito num carequinha chamado Marcos Valério”, avisou Jefferson dias mais tarde.
E então se deu a metamorfose.
Sumiu o João Paulo com cara de garotão, maneiras polidas, cada fio de cabelo em seu lugar, óculos de primeiro da classe, afeito a sussurros conciliadores, mas disposto a enfrentar quaisquer perigos em defesa dos oprimidos e dos princípios do PT.
Com os mesmos óculos, entrou em cena um tipo assustadiço, olheiras de porteiro de cabaré, barba implorando por lâminas, cabelos em desalinho, pupilas dilatadas pelo medo.
Esse João Paulo era o verdadeiro.
Tinha a cara da alma, modificada pelo lucrativo convívio com Marcos Valério.
No fim de 2008, o fruto da cólera foi afinal parido: nasceu uma ação judicial que fixava em R$ 100 mil o preço da honra ofendida.
Como está explicado na seção Vale Reprise, o pedido de indenização foi engavetado pela Justiça em agosto de 2009.
Antes disso, publiquei de novo o artigo e convidei os leitores a decidir o caso.
O deputado mensaleiro achava que merecia dinheiro.
Eu continuava achando que merecia cadeia.
O timaço de comentaristas, como sempre, cumpriu exemplarmente a missão.
E ficou resolvido que o que falta a João Paulo Cunha é uma didática temporada na gaiola.
Não só continua em liberdade como tem desfrutado com a habitual desfaçatez dos privilégios concedidos pelo bando governista a comparsas que perderam o sono no auge do escândalo.
No começo do ano, por exemplo, o réu à espera de julgamento no Supremo por formação de quadrilha ganhou de presente a presidência da Comissão de Constituição e Justiça.
Nesta quarta-feira, valendo-se das atribuições do cargo, infiltrou na pauta da reunião seguinte um projeto que concede anistia aos ex-deputados (e para sempre mensaleiros) José Dirceu, Roberto Jefferson e Pedro Corrêa, punidos pela Câmara com a cassação do mandato e a suspensão dos direitos políticos por oito anos.
Surpreendido pela reportagem do Estadão que denunciou a patifaria , o pecador irremissível balbuciou explicações desconexas e tratou de recolher a prova do crime.
O episódio informa, simultaneamente, que João Paulo Cunha não tem conserto e que os quadrilheiros andam agitados demais com a aproximação do julgamento no STF.
Todos parecem confiantes na bancada das togas governistas.
Mas talvez tenham descoberto que ainda é minoritária.
05/11/2011
0 comentários:
Postar um comentário