Este Brasil que manda a política para a página de polícia é uma criação genuína de Luiz Inácio Lula da Silva.
Não!
O lulo-petismo não inventou a corrupção.
Mas foi o Babalorixá de Banânia quem a transformou numa categoria de pensamento, numas das formas do “ser político”, num “fazer” supostamente respeitável, num verdadeiro “saber” que se transmite às gerações futuras.
Mais perverso do que ter transformado a corrupção num método, Lula fez dela uma forma de “resistência política”, contra supostas elites que estariam a espreitar a verdadeira revolução que ele diz ter feito no Brasil.
Essa visão de mundo ganhou adeptos, gerou peroração acadêmica, contaminou o jornalismo.
Não se leu há dias na imprensa uma análise segundo a qual o que falta a Barack Obama nos EUA é justamente um PMDB?
A corrupção seria dotada, assim, de uma virtude saneadora, que amaina os espíritos, que arredonda as agudezas ideológicas, que faz convergir para o centro os extremos, que desarma os espíritos, que transforma a convicção que divide na conveniência que une.
E se dá a isso o nome de “governabilidade”.
E Lula, como veremos, se mobiliza para que a lambança tenha longa duração.
Interessa aqui o modelo que ele erigiu de modo meticuloso, sistemático, organizado.
Ele foi o arquiteto dessa forma de exercício de poder, mas o grande engenheiro da obra, justiça se faça, foi mesmo José Dirceu.
Os dois transformaram o partido que não se coligava com ninguém no partido que se une ao capeta se o rabudo, afinal de contas, aceitar fazer a genuflexão - pelo que será regiamente recompensado.
É isto: o PT é o partido que seduziu o diabo; normalmente, é o chifrudo que seduz os incautos.
E, antes que continue, uma nota esclarecedora à margem: eu não estou afirmando que os petistas aprenderam maus costumes na convivência com os PMDBs e PRs da vida, não!
Não há nada que essa gente possa ensinar a um petista que este já não saiba de berço - refiro-me ao berço partidário.
Perto do que se tem hoje, ícones de certo modo de fazer política, como Adhemar de Barros, Paulo Maluf ou Fernando Collor, revelam-se amadores primitivos.
Fim da nota à margem.
Sigamos.
A bagunça partidária brasileira e isso que chamam “presidencialismo de coalizão” facilitam o saque.
Como explicar, por exemplo, a um estrangeiro que não conheça direito a realidade brasileira que o maior partido do país, o PMDB, concorreu com candidato próprio à Presidência da República uma única vez depois da redemocratização, em 1989?
Não obstante, está no poder desde o fim do Regime Militar, em 1985.
Os petistas tomaram uma dura lição em 1994 e 1998. Derrotados pelo Plano Real, que combateram com unhas e dentes, entenderam que FHC teve de liderar uma coligação forte para vencer, governar e implementar a sua agenda.
O PT fez uma leitura peculiar do processo.
Também ele se abriria à adesão de quem quisesse aderir, mas, dado certo déficit de credibilidade no establishment político - embora contasse com amplo apoio do eleitorado -, teria de pagar um prêmio maior do que pagava “o outro lado”, o adversário.
Lula venceu a disputa em 2002 e foi às compras.
O principal alvo foi justamente o PMDB, que se coligara com o tucano José Serra. Essa foi a costura mais importante feita, então, por José Dirceu, o “homem forte” do regime que se iniciava ali.
Políticos antes hostis ao PT, empresários, o setor financeiro, o baixo-clero do Congresso, críticos ferrenhos do partido…
Todos descobriram um Lula de uma formidável generosidade, como, de fato, nunca antes…
Ele, sim, sabia negociar e fazer concessões.
A conversa era franca, sem medo, com aquele pragmatismo sindical de que o líder tanto se orgulhava.
Para as massas, afinal, ali chegava o redentor, o que viria mostrar o valor do povo, combater as elites etc e tal.
Vocês conhecem a cascata.
Tudo, então, era permitido.
É evidente que o mensalão, por exemplo, não foi um desvio, uma vacilo, um erro, uma transgressão.
Era um método.
Não por acaso, estão envolvidos na lambança o presidente do partido, o tesoureiro, o presidente do Câmara e o chefe da Casa Civil. Até o marqueteiro de campanha foi pago com dinheiro confessadamente ilegal.
Nunca antes na história destepaiz um presidente havia sido tão generoso e, em muitos aspectos, verdadeiramente “descentralizador”.
Garantida a fidelidade exigida, Lula, vamos dizer assim, liberou as “forças fisiológicas”.
Cada aliado fizesse em seu feudo o que bem entendesse, atendidas algumas pequenas exigências.
A conjuntura favorável - e vou me dispensar dos detalhes agora - favoreceu a consolidação do seu modelo de gestão, que persiste até agora.
Reforçando…
Ontem, Lula almoçou no Palácio das Laranjeiras, no Rio, residência oficial do governador Sérgio Cabral (PMDB).
Estavam presentes parlamentares, ministros e secretários estaduais e municipais de diversos partidos da base: PT, PMDB, PDT, PSB, PC do B, PSC e PRB.
O Babalorixá mandou um recado: se todos estiverem unidos em 2012, ele estará no palanque.
Vai ficar longe das cidades em que os partidos da base se dividirem.
Como se nota, ele força a mão para que candidatos sejam verdadeiros chefes de uma arca de Noé, reunindo um pouco de tudo.
Foi assim que impôs, por exemplo, que o PT do Maranhão, adversário histórico dos Sarneys, apoiasse a candidatura de Roseana ao governo do Estado.
Ora, aonde isso leva?
Sob o guarda-chuva do lulo-petismo, abrigam-se, então, os mais diversos interesses.
Não se constroem candidaturas com uma proposta, uma agenda, um programa, um rumo.
Faz-se um amontoado para ganhar a disputa e, depois, dividir o poder. Não é um condomínio, mas um cortiço, em que cada casa de cômodo segue as suas próprias regras.
A realidade política brasileira, reitero, com suas dezenas de partidos e uma espantosa indefinição ideológica, já predispõe o país à corrupção. O “modelo Lula” leva isso ao paroxismo.
O PR e o PMDB, por exemplo, estão magoadíssimos e prometem retaliação - se possível, “retalhação” também… - a quem queira ouvir.
Sentem-se traídos.
Não foi isso o que Lula lhes prometeu.
Não é esse o acordo, vamos dizer, histórico feito com o PT.
Afinal, o combinado é que cada um tenha o “seu” pedaço, desde que colabore, é evidente, com o governo federal.
ATENÇÃO! ESSES PARTIDOS PROMETERAM FIDELIDADE AO GOVERNO, NÃO VERGONHA NA CARA!
ISSO NÃO ESTAVA NO COMBINADO.
ISSO NÃO ESTAVA NO PREÇO.
E não que o PT esteja fazendo tais exigências, entendam bem.
Mas essa imprensa, vocês sabem como é…
Se bem se lembram, Gilberto Carvalho, secretário-geral da Presidência, afirmou que ela não contribui para a “formação cidadã” - ou porcaria do gênero.
Os larápios saltaram da margem para o centro do poder.
Passaram a dar as cartas em ministérios.
E, como se conclui da reunião havida no Rio, Lula tenta dar sobrevida ao modelo.
Continua disposto a juntar todos os “patriotas” numa grande frente para tomar de assalto as cidades.
Depois é só dividir o conteúdo do cofre.
O presidencialismo de coalizão pode até colaborar com a governabilidade.
Já o lulismo de coalizão está desgovernado.
10/08/2011
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