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sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Mão de obra análoga à escravidão, sim! Ou: Estatuto do Estrangeiro será usado para manter cativos os médicos cubanos. Ou ainda: A única mercadoria que Cuba comercia é gente! E o governo do PT compra




Por Reinaldo Azevedo

Leio na Folha que “O procurador José de Lima Ramos Pereira, que comanda no órgão a Coordenadoria Nacional de Combate às Fraudes nas Relações de Trabalho, disse que a forma de contratação fere a legislação trabalhista e a Constituição.”

E se registra uma fala do procurador: “O Ministério Público do Trabalho vai ter que interferir, abrir inquérito e chamar o governo para negociar”.

A chamada precarização do trabalho, considerando-se as leis brasileiras, está dada já pela natureza do contrato que os cubanos manterão com o Brasil.

Ramos Pereira explica por que a contratação dos cubanos é “totalmente irregular”.

Diz ele: “A relação de emprego tem de ser travada diretamente entre empregador e empregado. O governo será empregador na hora de contratar e dirigir esses médicos, mas, na hora de assalariar, a remuneração é feita por Cuba ou por meio de acordos. Isso fere a legislação trabalhista”.

A reportagem da Folha ouve ainda o auditor fiscal do Trabalho Renato Bignami, que afirma ser prematuro acusar as condições de trabalho dos cubanos no Brasil de análogas à escravidão.

Diz ele: “Não são só os salários aviltantes que são considerados para essa situação. Há fatores como jornadas exaustivas e condições degradantes”.

Ramos Pereira está certo. Os contratos ferem a legislação brasileira. Já Bignami está errado. Estamos, sim, diante de um trabalho análogo à escravidão.

Pior: o Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815) acabará atuando em favor dos mercados de escravos (o governo cubano) e os compradores (o governo brasileiro). Já chego lá. Antes, algumas questões.

Em primeiro lugar, consultem, quando houver tempo, as considerações do próprio Ministério do Trabalho sobre as características do trabalho análogo à escravidão.

Nem todas precisam ser satisfeitas para que ele esteja caracterizada. Bastam algumas — ou, sei lá, uma única, mas que defina a relação.

Dou um exemplo: a servidão por dívida. Ainda que o trabalhador tivesse as melhores condições, com toda a proteção, e morasse numa casa confortável, haveria trabalho análogo à escravidão se estivesse preso ao patrão por uma dívida impagável, que lhe tivesse sido imposta como precondição para conseguir o emprego. É claro que as coisas não acontecem desse modo.

Esse tipo de servidão quase sempre é acompanhada das piores condições. Estou apenas raciocinando por hipótese para demonstrar que a essência do trabalho análogo à escravidão é a agressão à liberdade de ir e vir — ainda que fosse no paraíso.

E é o que acontecerá com os cubanos. O roubo que será praticado pelo governo cubano é, claro!, relevante. Igualmente escandaloso é o fato de que o governo brasileiro está “comprando” um lote de profissionais de um mercados — no caso, o estado cubano, que usa essa mão de obra como fonte de divisas.

Países costumam ganhar dinheiro vendendo tecnologia ou com os royalties que ela rende; costumam ganhar dinheiro vendendo commodities; costumam ganhar dinheiro vendendo manufaturados; costumam ganhar dinheiro por intermédio de multinacionais, que fazem a remessa de lucros para as matrizes.

Não se tem notícia, no mundo moderno — ou me citem um exemplo —, de um país que obtenha dividendos vendendo a mão de obra de milhares de pessoas. Trabalho análogo à escravidão, sim.

Famílias
Lá no manual do Ministério do Trabalho, vocês verão que há um capítulo sobre a família dos trabalhadores. Nos locais onde se explora a mão de obra análoga à escravidão, os familiares costumam ser parte da equação porque, também eles, dividem com o trabalhador explorado os abrigos precários que servem de moradia.

Romper a relação corresponderia, pois, a deixá-los ao relento. Melhor um teto caindo aos pedaços do que teto nenhum.

No caso dos cubanos, a família também é parte da equação, mas de modo um pouco distinto. Os profissionais chegarão sem as suas respectivas famílias. Não se trata de uma opção, mas de uma imposição.

A tirania cubana não lhes dá licença para deixar a ilha. Assim, mantém a garantia de que esses profissionais jamais desertarão. Ora, essa situação é muito diferente, em essência, daquela outra?

Em certo sentido, é ainda pior: se um médico cubano pedisse asilo ao Brasil, não estaria apenas expondo seus entes queridos a agruras. Estaria condenado a não vê-los nunca mais.

E, sabemos, sempre estará a possibilidade de o governo brasileiro repetir a atuação gloriosa de Tarso Genro e mandá-los de volta para o colo dos facinorosos Fidel e Raúl Castro, como fez com aqueles dois pugilistas.

Assim, os médicos cubanos — ainda que todos filiados ao Partido Comunista e considerados “quadros” do socialismo (mas a gente sabe como são essas coisas nas ditaduras) — não são livres para ir e vir. Não são livres para fazer suas escolhas. Não são livres para decidir que destino dar às suas respectivas carreiras e vidas.

Em Cuba, fiquei sabendo a partir de depoimentos dados por esses médicos a venezuelanos que conheço, há duas formas de recrutamento: existe os que se apresentam voluntariamente para a tarefa, e há aqueles que são “escolhidos” pelo partido, sem a possibilidade de dizer “não”.

A commodity de Cuba é gente; a manufatura de Cuba é gente. Os tiranos exportam e reimportam quem lhes der na telha. Têm a vida desses profissionais na mão.

Estatuto do Estrangeiro
Vi o ministro Antonio Patriota a dizer que não há nada de errado nesse tipo de contrato e que é uma vontade da sociedade brasileira. Já que ele não se envergonhou, senti vergonha em seu lugar, uma vez que compartilhamos, ao menos, a nacionalidade.

Os cubanos que chegarão ao Brasil vão receber um visto provisório, o que lhes impõe limitações severas para trabalhar — que, noto, são adotadas por todas as democracias. É que as democracias de fato não costumam importar escravos…

Uma relação que, em tudo, caracteriza trabalho análogo à escravidão recebe, então, o reforço involuntário do Estatuto do Estrangeiro (Lei 6.815).

Eles entrarão no Brasil com visto temporário, que pode ser de até dois anos, prorrogável por mais um ano. O Artigo 100 da referida lei estabelece nesse caso (em azul):

Art. 100. O estrangeiro admitido na condição de temporário, sob regime de contrato, só poderá exercer atividade junto à entidade pela qual foi contratado, na oportunidade da concessão do visto, salvo autorização expressa do Ministério da Justiça, ouvido o Ministério do Trabalho.

Eis aí: ainda que quisesse exercer alguma outra função, não poderia. A ditadura cubana e a má-fé do governo brasileiro se aproveitam de uma lei que, em si, não é discricionária para manter o trabalho análogo à escravidão.

E se evidência faltasse…
De reto, se evidência faltasse, há uma outra, escandalosa, ditada pela natureza dos fatos. O Brasil abriu a inscrição para receber os médicos, inclusive os estrangeiros.

Por que os cubanos não se apresentaram?

Porque não podiam. Porque não são livres para isso.

Mas não são por quê?

Quem os impede?

Ora, o ente que detém a titularidade de sua mão de obra, que fala em seu lugar, que assina em seu lugar, que decide em seu lugar, que recebe o pagamento pelo trabalho em seu lugar: o estado cubano. E é com esse ente que o Brasil celebrou o acordo.

Há médicos de sobra em Cuba e sei lá mais onde?

Que o Brasil, então, abra as suas portas, que submeta os candidatos aos testes devidos, que eles busquem revalidar aqui seus diplomas e que passem a atuar como indivíduos livres.

Ocorre que o PT não escolheu a liberdade, mas a escravidão. Se esse negócio prosperar sem uma resposta firme do Ministério Público do Trabalho, ele estará para sempre desmoralizado.

Quero ver com que cara vai tentar combater o trabalho análogo à escravidão que remanesce, sim, em cartas áreas do país. Terá de dizer por que essa é uma prerrogativa do governo do PT.

23/08/2013

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