‘Lamento muito que estejamos hoje diante desse impasse constitucional absurdo’, afirma presidente do STF
O ministro Joaquim Barbosa recebeu o prêmio José de Alencar de Ética da Associação Comercial do Rio
Marcelo Carnaval / O Globo
RIO — O presidente do Supremo Tribunal Federal (STF), ministro Joaquim Barbosa, lamentou nesta sexta-feira, a decisão da Câmara de manter o mandato do deputado federal Natal Donadon (sem partido-RO), preso há dois meses no Complexo Penitenciário da Papuda após ser condenado pela Corte a pena de 13 anos pelos crimes de formação de quadrilha e peculato por desvios na Assembleia Legislativa de Rondônia. Para o ministro, agora há um “impasse constitucional absurdo”, e o Congresso Nacional deve encontrar rapidamente uma solução para isso.
No Rio, onde recebeu o prêmio Presidente José de Alencar de Ética da Associação Comercial do Rio de Janeiro, Barbosa afirmou que a decisão da Câmara tem que ser respeitada, embora não se possa fugir das consequências que ela traga:
— Lamento muito que estejamos hoje diante desse impasse constitucional absurdo. Mas o Congresso Nacional é soberano, tomou a sua decisão. Ele terá que conviver e lidar com as consequências desse ato.
Barbosa afirmou que, durante julgamento na Corte, advertiu para eventuais consequências “que lamentavelmente vieram a acontecer”. Contrariando um entendimento adotado no ano passado no julgamento do processo do mensalão, o Supremo, com dois novos membros, decidiu no início de agosto que caberia ao Congresso definir o destino do mandato de parlamentares condenados. A mudança de entendimento ocorreu na análise de ação penal contra o senador Ivo Cassol, condenado a 4 anos e 8 meses de prisão por fraude em licitação.
— Quando nós julgamos no ano passado e neste ano, nós decidimos sobre a perda do mandato, eu disse muito claramente que seria uma incongruência constitucional muito grande manter no Congresso Nacional um parlamentar condenado criminalmente ou eventualmente um parlamentar a cumprir pena. Chamei atenção para a impossibilidade física até disso — lembrou o presidente do Supremo.
Barbosa falou que até os parlamentares que deverão cumprir pena em regime semiaberto também estariam, segundo ele, numa situação de improvável e impossível conciliação do exercício do mandato. No caso do processo do mensalão, João Paulo Cunha (PT-SP) foi condenado a regime fechado. José Genoino (PT-SP), Valdemar Costa Neto (PR-SP) e Pedro Henry (PP-MT) deverão cumprir regime semiaberto.
— Mesmo o parlamentar a cumprir pena no regime semiaberto, em princípio deve cumprir essa pena em uma colônia penal. Só na possibilidade de não existir esse tipo estabelecimento é que ele vai ter o regime que vocês já conhecem: dorme na prisão e sai para trabalhar durante o dia. Chamei atenção para a improvável e impossível conciliação do exercício do mandato com essa condição.
O ministro lembrou a necessidade de o Congresso Nacional aprovar a PEC dos Mensaleiros. O projeto determina perda imediata do mandato em caso de condenação definitiva de deputado ou senador pelo STF, em casos de improbidade administrativa ou crimes contra a administração pública.
— Aliás, a Constituição diz isso , no artigo 15. Diz que o condenado por pena criminal tem os seus direitos políticos suspensos. Ora, a posse dos direitos políticos é um requisito indispensável para o exercício da representação do mandato eletivo. Não pode nem se candidatar, muito menos exercer o mandato e conciliar essa condição de parlamentar com a de presidiário.
Perguntado se a decisão do Congresso sobre Donadon influenciará no Supremo, para que condenados com sentença transitada em julgado percam automaticamente o mandato, Barbosa disse:
— Não faz nenhum mês (no julgamento do caso do senador Ivo Cassol), numa nova composição, o próprio Supremo decidiu que cabia ao Congresso a palavra final sobre mandato.
Barbosa foi questionado se o mesmo vale para condenados no processo do mensalão.
— A não ser que algum dos membros do Supremo que tenham figurado na maioria estabelecida agora em agosto resolvam mudar de ideia... — disse. — Eu espero que o Congresso Nacional encontre rapidamente uma solução para esse impasse incontornável no qual nos encontramos.
Salário de R$ 30 mil
Quando foi questionado pelos repórteres sobre o pedido para que o salário dos ministros do Supremo chegue a R$ 30,6 mil, Barbosa desconversou?
— Eu não queria falar, não.
Apesar de não responder, o ministro contou que, em Cingapura, um ministro da Suprema Corte ganha 1,5 milhão de dólares por ano.
— Porque lá em Cingapura todos acham isso é normal. Um juiz tem que ganhar um salário de mercado porque ele é recrutado no mercado. Se ele não tiver uma remuneração nesse nível tendo em vista as atribuições, as responsabilidades altíssimas que ele tem, ele não terá como exercer com independência as atribuições do seu cargo — disse. — Não estou dizendo que nós aqui no Brasil devamos ganhar 1,5 milhão de dólares. Eu simplesmente contei uma história — encerrou.
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