EditorialFolha de São PauloA 15ª sessão do julgamento do mensalão, anteontem, mostrou como são simplistas as tentativas de estabelecer elos de causalidade entre o voto de um ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) e os interesses do presidente da República que o indicou para a corte.
Se dependesse da vontade do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva, que levou ao STF seis de seus 11 membros, ninguém seria condenado. Afinal, o líder petista patrocina a tese cínica de que o mensalão não passou de uma farsa.
Entretanto, a maioria do Supremo já decidiu pela condenação de quatro dos 37 réus. Ao fim da 15ª sessão, haviam votado seis ministros escolhidos por Lula (quatro) e Dilma Rousseff (dois).
Todos concordaram que, em dois itens da denúncia, o empresário Marcos Valério e seus ex-sócios cometeram os crimes de peculato (uso de cargo público para desvio de recursos) e corrupção ativa, e que o ex-diretor do Banco do Brasil Henrique Pizzolato praticou peculato e corrupção passiva.
O andar do julgamento indica que a sessão de hoje deverá ensejar outro revés para o PT. Já se dá como provável a condenação do ex-deputado João Paulo Cunha, candidato a prefeito de Osasco (SP), pelo crime de corrupção passiva.
E não é só ao concordarem que os ministros demonstram independência, mas também quando divergem. Tomem-se os votos de Rosa Weber e Luiz Fux, nomeados por Dilma. Ao analisarem a acusação de propina a Cunha, quando presidia a Câmara dos Deputados, eles chegaram a conclusões diversas.
Algo similar se observa nos votos de José Antonio Dias Toffoli e Cármen Lúcia, alçados ao STF por Lula. Sobre o mesmo quesito, na verdade, votaram de maneira oposta.
Como esperado, Toffoli acompanhou o revisor Ricardo Lewandowski e decidiu pela absolvição do ex-deputado --o que reforçou a noção de que ambos se inclinam por condenar os operadores do mensalão e inocentar seus parceiros do PT. Para Toffoli, não há provas suficientes para condenar Cunha.
Toffoli construiu boa parte de sua carreira à sombra do partido e, por isso, deveria declarar-se suspeito, como esta Folha já defendeu. Decidiu não fazê-lo, no que evidencia mais lealdade com seu passado do que com a investidura presente na mais alta corte do país.
Apesar do inconveniente, o colegiado contraditório do Supremo tem demonstrado virtudes. A jurisprudência resultante do julgamento do mensalão --como a possível pulverização das teses da defesa sobre a insignificância do caixa dois eleitoral, a comprovação de atos de ofício para caracterizar corrupção ou a desqualificação de provas colhidas em CPI-- será forjada em discussões candentes, pois cada ministro terá de fazer distinções delicadas, em meio às práticas obscuras dos abusos de poder.
A julgar pelo que já se viu e ouviu do processo, será preciso alguma hipocrisia e muita má vontade para insatisfeitos com seu resultado dizerem, no futuro, que o debate não foi profundo o suficiente.29/08/2012
quarta-feira, 29 de agosto de 2012
Cartas na mesa
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