Por Ricardo Constantino
Veja.com
Concordo que no Brasil é impossível acompanhar de perto todos os escândalos que vêm à tona, quanto mais mostrar indignação ou se organizar para protestar contra eles. Ninguém faria outra coisa da vida!
Dito isso, chama a atenção certa seletividade na revolta demonstrada, ao menos naquelas mais organizadas em atos públicos.
Por exemplo: o estranho sumiço de Amarildo, o pedreiro da Rocinha. É claro que as autoridades devem explicações, e é claro que a população tem todo direito de cobrar investigações e levantar suspeitas que envolvem a própria força policial da UPP.
Mas e o caso da estudante de engenharia, Patrícia Amieiro, cujo desaparecimento suspeito já completou cinco anos?
Somente amigos e familiares insistiram em mais investigação e eventual condenação dos policiais supostamente envolvidos. A mobilização popular faz seleção por classe? A revolta é diferente quando some um pedreiro na favela ou uma estudante de engenharia de classe média?
Outro caso que vem à mente é a ocupação da Câmara dos Vereadores no Rio, em protesto contra a CPI dos Ônibus. Os manifestantes acusam de marmelada a coisa toda, e querem impedir que tudo termine em pizza.
Objetivo louvável, ainda que seus métodos nem tanto (não devemos aplaudir quem acha que pode governar no grito e com ameaça de violência; se as instituições são falhas, lutemos para melhorá-las dentro da democracia).
Mas cabe perguntar: ninguém vai falar nada sobre a Delta, aquela construtora envolvida até o pescoço em escândalos do governo federal e suas obras? A construtora do PAC, carro-chefe do governo Dilma, não merece um protesto organizado, uma manifestação popular, uma ocupação?
Perto dos desvios da Delta, a máfia dos ônibus é “fichinha”. Claro que isso não quer dizer que as empresas de ônibus devem ser deixadas de lado; é apenas uma questão de prioridades. Tento, aqui, compreender melhor os critérios usados para o grau de revolta e mobilização popular.
O escândalo do metrô paulista foi capaz de mobilizar bastante gente, e vimos vários artigos cobrando mais investigação ou até fazendo acusações precipitadas e levianas. Sim, o caso deve ser investigado, e os culpados punidos. Mas, novamente, meu interesse é pelo critério de seleção de escândalos para a demonstração de revolta.
A Petrobras, maior estatal do país, vive envolta em escândalos de corrupção. Tivemos o estranhíssimo caso da refinaria na Califórnia, que custou centenas de milhões de dólares aos “contribuintes”, e agora mesmo tivemos nova denúncia de favorecimento do PMDB e PT em compras internacionais.
Nem uma única demonstração de revolta por parte daqueles que se mostraram tão indignados com a corrupção no metrô paulista. Por que?
Por fim, há um nome que anda completamente sumido da agenda de protestos desses guardiões da ética: Rose. Trata-se de Rosemary Noronha, aquela que era unha e carne com o ex-presidente Lula.
Ninguém mais fala do escândalo que tinha tudo para abalar a República. Rose desapareceu, escafedeu-se, sumiu! E, no entanto, nenhum desses revoltosos contra a corrupção menciona seu nome. Por que?
Em tempo: não é curioso que os mesmos que silenciam sobre alguns casos e vociferam tanto sobre outros, são os mesmos que acusam a imprensa de “golpista” e parcial?12/08/2013
segunda-feira, 12 de agosto de 2013
Revoltas seletivas
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