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terça-feira, 8 de janeiro de 2013

Segundo Marco Aurélio Garcia, o incorrigível, Dilma apoia solução golpista na Venezuela





Por Reinaldo Azevedo

Caro leitor,
sempre que você sentir falta, assim, de uma leitura desavergonhada do mundo, nem que seja só para secretar alguma bile, conte com Marco Aurélio Garcia, que era assessor especial para assuntos internacionais do governo Lula e se manteve na função no governo Dilma.

Não há ideia estúpida que ele não abrace, não há absurdo que não diga, não há lógica que não fraude. E ele o faz de maneira sistemática, organizada, metódica mesmo.

Sozinho e por sua conta, não é ninguém.

Quando se expressa, quem fala é a chefia — antes Lula, agora Dilma. Ainda lembrarei neste texto algumas das suas. Vamos à questão da hora.

Garcia esteve em Cuba, informa o Estadão Online, para se inteirar sobre o estado de saúde do ditador da Venezuela, Hugo Chávez:

 “A informação que eu tive é que o estado dele é grave e que, portanto, qualquer previsão é impossível de ser feita, neste momento”.

Sei. O brasileiro não esteve com Chávez, que estaria lúcido. Falou apenas com os dois carniceiros que tiranizam a ilha: Raúl e Fidel Castro.

Na reportagem do Estadão, leio o que segue:


“Em suas declarações, Garcia deixou claro que o governo brasileiro apoia a ideia de prorrogar por até 180 dias o prazo para a posse de Hugo Chávez. Garcia citou o artigo 234 da Constituição da Venezuela para explicar que, se Chávez não assumir no dia 10 de janeiro, novas eleições serão convocadas daí a 30 dias se o impedimento do atual presidente for definitivo.

Mas, caso o impedimento seja temporário, essa situação poderá se estender por seis meses, 90 dias, prorrogáveis por mais 90 dias. Ele lembra que há uma lacuna na interpretação na lei, mas a avaliação é de que, neste caso, quem assume é o vice-presidente Maduro.”


Por que estamos diante de uma escandalosa mentira?

Vamos ver o que diz o Artigo 234 da Constituição da Venezuela:

“A ausência temporária do presidente ou da presidenta da República será preenchida pelo vice-presidente ou pela vice-presidenta por 90 dias, prorrogáveis por mais 90, por decisão da Assembleia Nacional.

Se uma ausência temporária se prolonga por mais de 90 dias consecutivos, a Assembleia Nacional decidirá por maioria de seus integrantes se há ausência permanente.”


Por que a situação não se aplica?

Pela simples e óbvia razão de que, para se chegar ao conteúdo do Artigo 234, é preciso passar pelo crivo do Artigo 231.
Relembro:


“O candidato eleito ou candidata eleita tomará posse do cargo de presidente ou presidente da República no dia dez de janeiro do primeiro ano de seu período constitucional, mediante juramento diante da Assembleia Nacional. Se, por qualquer motivo, o presidente ou presidente da República não puder tomar posse diante da Assembleia Nacional, ele o fará diante do Tribunal Supremo de Justiça”.

Não haverá como declarar a ausência temporária de um presidente que nem tomou posse, ora bolas! Sem que Chávez faça, na quinta-feira, o juramento diante da Assembleia ou do Tribunal Supremo de Justiça (caso houvesse algum impedimento do Legislativo), chega ao fim o mandato velho, e o novo não terá começado.

Nessa situação, aplica-se o Artigo 233:

“(…) se procederá uma nova eleição universal, direta e secreta, dentro dos trinta dias consecutivos seguintes”. Enquanto não se tem o novo presidente, “se encarregará da Presidência da República o presidente ou presidente da Assembleia Nacional”.

Se o que disse Garcia corresponder à posição de Dilma, então o governo brasileiro está apoiando um… golpe na Constituição!

Garcia, o incorrigível


Tanto Chávez como Rafael Correa, presidente do Equador, abrigavam — abrigam ainda? — narcoterroristas das Farc. Em 2008, o Exército da Colômbia atacou um acampamento que ficava no lado equatoriano. Na operação, morreu Raúl Reyes, um dos chefões do grupo. O governo Lula, claro!, não censurou Correa por acoitar narcoterroristas. Ao contrário: mobilizou-se para tentar condenar o governo democrático da Colômbia!

As Farc, numa ofensiva de propaganda, anunciaram, naquele ano, a disposição de libertar alguns dos reféns que mantêm em campos de concentração na floresta amazônica. Quem se apresentou para ser o “interlocutor” da bandidagem? Hugo Chávez! Faz sentido. E quem resolveu ajuda-lo nessa tarefa? Marco Aurélio Garcia, que meteu na cabeça um chapéu Panamá e partiu para o coração das trevas. Também faz sentido.

Quando Reyes morreu, Garcia concedeu uma entrevista ao jornal francês Le Figaro. Traduzi e puliquei aqui. Relembro um trecho.

Volto depois.
Le Figaro – Que impacto terá a morte de Raúl Reyes para a libertação dos reféns ?
Garcia -
De imediato, fiquei bastante apreensivo, mas as Farc disseram que sua morte não criará obstáculos à busca de um acordo humanitário. Tecnicamente, ela [a morte] pode criar alguns problemas: eu mesmo estava no terreno [de batalha], no fim de dezembro, quando as Farc retardaram a primeira libertação de reféns por causa da operação militar das Forças Armadas colombianas. Eu lhes lembro que o Brasil tem uma posição neutra sobre as Farc: nós não as qualificamos nem de grupo terrorista nem de força beligerante. Acusá-las de terrorismo não serve pra nada quando a gente quer negociar. A Colômbia expressa o desejo de não querer internacionalizar seu conflito com as Farc, mas, de fato, ele já tem repercussão internacional.

(…)

Retomo
É isso aí. Como se vê, o governo brasileiro se dizia “neutro” sobre o caráter narcoterrorista das Farc… Agora, apoia uma solução na Venezuela que viola, de maneira insofismável, a Constituição. Não obstante, em passado recente, puniu dois países — Honduras e Paraguai — por terem cumprido suas respectivas disposições constitucionais.

É com essa política externa que o governo brasileiro reivindica um assento permanente no Conselho de Segurança de ONU. Não há causa ruim na América Latina a que os petistas não tenham dado o seu apoio nos últimos dez anos.

O país colecionou vários atrasos nesse período, mas é na política externa que a estupidez chegou mais longe. O estupefaciente é que cedo ou cedo a Venezuela terá de realizar novas eleições (ver post de ontem). Os trogloditas que disputam o espólio chavista tentam retardá-las ao máximo porque ainda não chegaram a um entendimento sobre a divisão do butim.

Ao governo brasileiro, com suas aspirações de liderança regional, só caberia uma posição: a fiel observância do que vai na Constituição do país. Dilma, como se nota pelas palavras de Garcia, decidiu fazer o contrário e dar apoio à solução discricionária.

É um vexame sem fim.

                        08/01/2013

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