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quarta-feira, 30 de maio de 2018

Agência de inteligência deixa Planalto 'vendido' na crise dos caminhoneiros

 
Temer não recebeu nenhum relatório de inteligência sobre a gravidade da paralisação

Por Letícia Fernandes / Robson Bonin
O Globo
Reunião do gabinete formado para acompanhar a paralisação dos caminhoneiros, no Planalto
Marcos Corrêa/Presidência/29-05-2018


 BRASÍLIA — Criada para gerenciar crises e alertar o presidente da República sobre situações com “potencial de risco à estabilidade institucional”, a Agência Brasileira de Inteligência (Abin) não conseguiu detectar qualquer ato que pudesse ter chamado a atenção do governo para a gravidade do movimento que estava sendo arquitetado pelos caminhoneiros com o apoio financeiro de empresários do setor. Nas palavras de um auxiliar presidencial, a Abin deixou o governo do presidente Michel Temer completamente “vendido” e no “escuro” durante uma das maiores crises de abastecimento do país.

LEIA: Crise mostra disputa de poder entre ministros do núcleo duro do Planalto

Um auxiliar direto do presidente disse ao GLOBO que Michel Temer não recebeu da agência nenhum relatório de inteligência sobre o caso e que as reuniões do governo “já começaram em cima do incêndio”.


— Não é que o palácio tenha dormido no ponto. Ninguém no governo imaginava que as empresas de transporte fossem atuar nos bastidores para transformar os atos em uma tentativa de derrubar o presidente da Petrobras. As empresas operaram os caminhoneiros para atacar a política de preços da Petrobras e ninguém na inteligência nos avisou — disse.

A falta de atuação da Abin foi percebida na segunda-feira, durante a reunião do comitê de crise instalado no Palácio do Planalto. O ministro do Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República (GSI), Sérgio Etchegoyen, quis saber da advogada-geral da União, Grace Mendonça, como estava a aplicação de multas a empresas de transporte envolvidas na paralisação dos caminhoneiros. Até aquele momento, disse a ministra, o órgão não havia processado nenhuma penalidade porque ainda desconhecia a identidade dos infratores.

Contrariado, Etchegoyen pediu a lista de empresários envolvidos nas paralisações a Janér Tesch, diretor da agência. Era o oitavo dia de bloqueios em estradas. Com o país mergulhado no caos, Etchegoyen ouviu uma resposta constrangedora. O serviço secreto brasileiro, encarregado de abastecer o presidente da República de informações de inteligência, também não possuía uma lista de empresários a apontar.

Organizada a partir de grupos de WhatsApp, a greve dos caminhoneiros cresceu em volume e só conseguiu chegar ao décimo dia, nesta quarta-feira, por causa do suporte financeiro e logístico dos empresários do ramo de transportes. A Abin, além de não identificar ameaças durante a organização do movimento, também não conseguiu identificar o crescimento das paralisações.

— Nas reuniões, a gente perguntava para o pessoal da Abin o que aconteceria e eles só diziam que melhoraria no dia seguinte. Só que não melhorou — diz um integrante do comitê de crise.

Com um orçamento previsto para 2018 de R$ 670 milhões, de acordo com levantamento feita pelo Contas Abertas a pedido do GLOBO, a Abin tem escritórios em todas as capitais brasileiras e em 14 países. Até segunda-feira, a agência já havia gasto R$ 194 milhões desse orçamento sem conseguir prever um único ato dos caminhoneiros organizado a partir do WhatsApp.

— Esses caras da Abin são analógicos. Esse tipo de comunicação horizontal, feita via WhatsApp, está fora da capacidade deles — diz um auxiliar da área de Segurança do governo.

Por causa da ausência de informações de inteligência, o Palácio do Planalto acreditou que estava negociando o fim das paralisações com um grupo de “líderes” sindicais que, na verdade, não representavam a categoria. Na quinta-feira, anunciou um acordo que acabou rejeitado pelos caminhoneiros.

Ao perceber o envolvimento de empresários nas paralisações, outros órgãos de segurança, como a Polícia Federal e a Polícia Rodoviária Federal passaram a agir. A PF anunciou a abertura de inquéritos para investigar empresários por locaute. E a PRF, com a ajuda das Forças Armadas passaram a registrar placas de caminhões nos bloqueios para identificar os proprietários e, com isso, levantar que empresas dariam suporte aos grevistas. Foi a partir desse levantamento de placas que a PRF conseguiu apresentar ao governo, nesta terça-feira, o primeiro relatório de multas, com 718 autuações.

Diante da continuidade da greve, Temer foi obrigado a entrar pessoalmente no gerenciamento da crise na manhã de sexta-feira. Um dia antes, ele havia cumprido agendas oficiais no Rio de Janeiro e em Minas Gerais, como se nada estivesse acontecendo no país. Com o governo atordoado, Temer anunciou em um pronunciamento no Planalto o emprego das Forças Armadas na desmobilização da greve. O ato acabou inflamando o país e desagradando os militares, que foram chamados de última hora, sem serem consultados a respeito da viabilidade da operação.

— Nesse processo de desgaste do governo, qualquer gripe vira pneumonia. Para não agravar a situação, o comando orientou as tropas a negociar sempre, sem violência. O caminho foi abrir os eixos de logística, garantir a retomada do abastecimento de combustíveis e o bem-estar social — disse ao GLOBO um general ligado ao comando do Exército.

Depois de Temer assinar um decreto nacional de Garantia da Lei e da Ordem e ameaçar confiscar os caminhões dos grevistas, os relatórios de monitoramento de redes sociais da Presidência mostraram um avanço no apoio dos brasileiros ao movimento. A greve chegou a ter 90% de apoio dos usuários das redes no fim de semana.

— A Abin falhou muito ao minimizar a ebulição desse movimento nas redes sociais. Quando o governo viu, a situação já tinha saído do controle. A inteligência deveria ter monitorado o tamanho disso nas redes — disse um auxiliar de Temer.

O número só começou a cair a partir do anúncio do governo de um segundo acordo, quando o Palácio do Planalto decidiu aceitar todas as exigências dos caminhoneiros.

— A gravidade do desabastecimento de combustíveis e de alimentos no país, com desdobramentos na área da saúde começou a pesar. As pessoas perceberam que, com o atendimento das reivindicações, era chegada a hora de encerrar as manifestações. O apoio nas redes caiu de 90% para 35% — disse um integrante do comitê de crise.

A Abin foi procurada, mas ainda não se manifestou.

30/05/2018

1 comentários:

Anônimo disse...

Essa agencia realmente tem inteligência????