Embora
ninguém consiga entender direito o que querem Marina Silva e Eduardo
Campos, vejo muita gente dar certo suspiro de alívio, como se houvesse
um sopro renovador na política. Ele é, a meu ver, enganoso (ainda
teremos muito tempo para tratar do assunto), mas entendo os motivos.
Ainda que Lula continue a ser o político mais popular do Brasil e
pudesse se reeleger presidente no primeiro turno, há um crescente
cansaço com sua ladainha. O programa de TV do PSB, diga-se, explorou
essa sensação. O próprio Eduardo Campos sintetizou: “Chega de dizer que
no passado já foi pior”. Isso, convenham, pode ser uma síntese da
pregação de Lula. O ex-presidente participou, nesta quinta, do
encerramento da 3ª Conferência Global de Combate ao Trabalho Infantil,
promovido pela OIT (Organização Internacional do Trabalho), órgão ligado
à ONU. É evidente que convidar alguém como ele para discursar num
evento como esse implica dar um viés partidário, de política local, ao
que deveria ser, como diz o nome, um acontecimento global. E o homem
estava num daqueles dias em que foi pródigo, generoso mesmo, nas
bobagens. Ficou claro por que ele e seus tontons-maCUTs odeiam tanto a
imprensa livre. Lula nunca entendeu para que serve e qual é o papel dos
jornalistas. Demonstrou isso mais uma vez.
Referindo-se ao trabalho da imprensa, afirmou:
“Você [Tereza Campello, ministra
do Desenvolvimento Social] foi criticada agora porque clonaram 80 carnês
do Bolsa Família. Em vez de a manchete do jornal ser uma crítica aos
clonadores, era uma crítica dizendo que tinha fraude no Bolsa Família.
Se tivessem roubado um banco, dizia: ‘assaltante rouba banco’. Como foi
assaltante roubando o Bolsa Família, é o Bolsa Família que tem problema.
Nós estamos acostumados a tomar bordoada e eles sabem que temos casco
de tartaruga, somos teimosos e estamos no caminho certo”.
A
afirmação tem casco, sim, mas não é de tartaruga, um bicho meio
mal-encarado, convenham, mas que não escoiceia ninguém nem emite
estranhos zurros à guisa de pensamento. Se aparecem fraudes no Bolsa
Família, está entre as atribuições da imprensa denunciá-las ou, quando
menos, noticiar a sua existência. A comparação com o banco é estúpida.
Dificilmente um assalto poderá ser atribuído a mecanismos ineficientes
de controle, menos ainda, por razões óbvias, a uma manejo fraudulento de
uma política pública. Ainda assim, caso a imprensa constate que a
segurança da agência é ineficaz ou errada, isso será notícia.
Lula finge
ignorar a dimensão pública do trabalho da imprensa. Gostaria que
jornalistas se comportassem como meros policiais do regime petista: dada
uma falcatrua qualquer, o jornalista se concentraria, então, nos erros
do “bandido”, ignorando as falhas da administração que eventualmente
facilitaram a ação de larápios. Há mais: a depender do caso, o bandido
em questão e os próprios gestores estão associados, em conluio. Pior
ainda: larápios e gestores públicos podem estar unidos a um partido
político, e a safadeza pode fazer parte de um projeto de conquista do
Estado, como foi o caso do mensalão, o maior escândalo — VIU, MINISTRO
BARROSO? — da história da República. Tratou-se, como se sabe, de uma
tentativa de golpe nas instituições.
O
principal papel do jornalista que se respeita, senhor Luiz Inácio, não é
caçar bandido. Isso é tarefa da polícia. Um jornalista deve é se ocupar
de corrigir as instituições, segundo as regras estabelecidas pelo
estado democrático e de direito. É por isso que não pode se contentar
apenas com a crítica ao pé de chinelo que fez isso ou aquilo. Mas essa,
claro!, é a visão que Lula tem da imprensa depois que chegou ao poder,
em 2003. Quando ele estava na oposição, jamais reclamou do jornalismo,
que sempre, com raras exceções, lhe puxou o saco. Ele mesmo já disse,
num rasgo de lucidez, certa feita, que ele próprio era produto da
imprensa livre. E é! Mesmo quando dizia bobagens cabeludas em economia,
política e o que mais fosse, era tratado como uma força da natureza, um
pensador original, o portador de uma verdade revelada.
O ombudsman
O líder político que gostaria que
jornalistas se comportassem como meros policiais também resolveu ser
ombudsman da imprensa. Afirmou:
“Quero confessar que eu tinha a
impressão de que esse evento estava proibido para a imprensa porque um
assunto dessa magnitude, com os resultados extraordinários conquistados
por muitos países do mundo e pelo Brasil, mereceu menos atenção do que
qualquer outro assunto banal do noticiário brasileiro. É uma pena que,
muitas vezes, as coisas sérias não são tratadas com seriedade, é uma
pena que as coisas banais, as coisas secundárias, sejam tratadas de
forma quase sensacionalista.”
“Coisa
séria” é tudo aquilo que serve ao propósito de Lula e de seu partido.
“Sensacionalismo” é a notícia que não é do seu interesse. O petismo
gasta muitos milhões do dinheiro público para alimentar o sistema
oficial de comunicação e para pagar a rede suja que presta vassalagem ao
petismo. Fazem isso assegurando que representam a novidade e que todo o
resto é a chamada “velha mídia”. Por que, então, não conseguiram tornar
influente assunto tão relevante? Se a “velha mídia” não está com nada,
como querem os petistas, deixem-na, então, em paz e regozijem-se com
seus próprios meios, não é mesmo?
A grande farsa
Lula só consegue articular um discurso
imaginando que há um inimigo à espreita. Voltando a seu esporte
predileto, que é brincar de arranca-rabo de classes, referiu-se nestes
termos ao Bolsa Família:
“O que dá para os ricos é
investimento e, para os pobres, é gasto, a ponto de dizerem na minha
cara que nós estávamos criando [com o Bolsa Família] um exército de
vagabundos”.
O primeiro
a dizer que os programas de bolsas deixavam os pobres vagabundos foi
Lula. E o fez de maneira explícita, arreganhada. No vídeo abaixo, ele
aparece dois momentos: exaltando o Bolsa Família, já presidente da
República, e no ano 2000, quando chamava os programas de assistência
direta (como o Bolsa Família) de esmola. Vejam.
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