Ou:
Imprensa presta servilismo ético e estético a autoritários disfarçados de libertários
Por Reinaldo Azevedo
Vejam estas fotos.
Este rapaz que aparece ao lado de José Dirceu, Dilma Rousseff e Fernando Haddad é Pablo Capilé. Na terceira foto, a seu lado, está Bruno Torturra. Ambos são as principais referências da chamada “Mídia Ninja”. Os dois são os entrevistados de hoje do programa “Roda Viva”. Volto ao ponto mais tarde. Sigamos.
Prometi, no post anterior, que falaria um tantinho sobre o papel da imprensa, que certa delinquência chama da “mídia tradicional”, nos protestos de rua. E é o que passo a fazer agora. De maneira geral, os veículos de comunicação decidiram competir com a Internet, aderindo à estética, quando não à ética, dessa tal “Mídia Ninja”, um grupo que pode ser acusado de tudo, menos de ser ideologicamente neutro e de fazer jornalismo. Essa gente realiza uma suposta cobertura jornalística a partir de um ponto de vista: o dos manifestantes. Tente encontrar um só vídeo ou uma só abordagem que não caracterizem os manifestantes como anunciadores de uma nova era e os policiais como brucutus a serviço da repressão. Não há! Além da ideologia, há razões que poderíamos chamar, de algum modo, “de mercado”. A “Mídia Ninja” não quer trair o seu público… A palavra “NINJA” é uma sigla: significa “Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação”. Independente de quem ou do quê? As companhias frequentes parecem falar por si.
Não existe, de fato, isenção absoluta — não na boa imprensa ao menos, aquela que, ao longo dos anos, contribuiu para criar as sociedades mais democráticas e mais abertas do planeta. Mais do que contribuir: ela foi e tem sido um dos seus pilares.
Essa boa imprensa de que falo se torna ainda melhor a partir, justamente, do ponto em que deixa de ser isenta para assumir um lado. Qual lado? O dos valores democráticos! Isto mesmo: nas sociedades livres, o jornalismo não está comprometido apenas com a isenção no relato das partes em conflito. A depender dos atores, a depender do objeto que esteja em disputa, a depender da contenda, assumir um lado é um imperativo ético.
Que isenção pode haver, por exemplo, entre a ordem democrática e um grupo que tente solapá-la por intermédio de ações terroristas?. Ser “isento”, nesse caso, corresponde a uma forma covarde e não-assumida de alinhamento com o terrorismo. Peguemos o caso dos sedizentes anarquistas que estão nas ruas, que dizem atacar a propriedade privada como forma de ataque ao capitalismo. A imprensa que os vigaristas chamam “tradicional” estará cometendo algum adernamento condenável se defender, de maneira clara e inequívoca, a propriedade privada? Parece-me que não. Quando menos porque não se inventou ainda um sistema de liberdades públicas que não tivesse a defesa da dita-cuja como um de seus pilares.
Parece-me evidente que cumpre, sim, em respeito aos fundamentos da Constituição Brasileira, que tem um compromisso com os direitos fundamentais do homem, criticar a truculência e os exageros da Polícia. Mas calma lá! Há uma diferença enorme entre cobrar que essa polícia se comporte segundo as regras e simplesmente declarar, ainda que por vias oblíquas, como se tem feito, a sua ilegitimidade. E é, infelizmente, o que se vem verificando mesmo naqueles setores da imprensa cuja RAZÃO DE SER é a defesa da ordem democrática. Recorre-se a um sem-número de truques — não cabe outra palavra — que transformam em pacifistas os teóricos da violência e numa horda de truculentos os que detêm o monopólio do uso legítimo da força.
Ocorre, meus caros, que foram necessários alguns séculos até que esse monopólio pudesse ser garantido pela ordem democrática e regulamentado por leis. Não é coisa que se possa jogar fora assim, do nada, de repente. Sem isso, estamos de volta ao estado da natureza.
Por que é assim? Porque a imprensa está sob uma patrulha como nunca houve. A multiplicação de meios para vender versões nunca foi tão grande — e vai se expandir cada vez mais. É evidente que haverá na rede tantas versões interessadas quantos forem os manifestantes como uma câmera na mão e algumas ideias (ou titicas) na cabeça. As tais “mídias ninjas” das ruas estão tentando convencer alguns incautos de que eles são, sim, parte “dessa luta”, mas com isenção suficiente para passar uma versão crível dos fatos. Mentira! Então me digam onde estão as narrativas produzidas por essa gente que façam a apologia da ordem. De qual ordem? Da ordem fascista? Não! Da ordem do estado democrático e de direito. Não há!
Não estou aqui a acusar esses valentes de tentar usurpar um espaço que não lhes pertence. O seu papel é tentar ganhar adeptos. Não há nem mesmo ineditismo nisso. A dita imprensa alternativa é muito mais antiga do que essa gente. Não é a primeira vez que verdades parciais tentam se vender como o bem universal. Estou aqui a indagar — e dirijo a minha questão não a esses que se querem os arautos da nova ordem (mero papo-furado), mas àquela dita imprensa tradicional — é que “alternativa” é essa de que falam. Recoloco a questão: com quais valores?
Oficialismo de segunda geração
De que alternativa se cuida? Antes que responda, uma pequena digressão.
Vocês conhecem aquelas pessoas estranhas que se intitulam, como é mesmo?, adversárias do “Partido da Imprensa Golpista”. Já as classifiquei aqui de JEG (Jornalismo da Esgotosfera Governista). Esses caras, uns sem-vergonhas, vivem às custas do dinheiro público, especialmente das estatais, e se alinham escancaradamente com o PT. Os que têm ainda menos vergonha do que eles são petistas na esfera federal e podem ser tucanos, peemedebistas ou outra coisa qualquer nos Estados e capitais. Quem paga leva os elogios. Quem resiste ao achaque vira alvo. Fiquei sabendo que o negociador que falava em nome de certo governante gravou a conversa em que foi vítima da abordagem delinquente. Cedeu, mas gravou. Paga religiosamente a bolsa-elogio, mas guarda a prova para o caso de a relação azedar. Bandido não confia em bandido. É da tradição. Esses grandes moralistas se querem uma “alternativa” à dita “imprensa tradicional”. Faz parte da boa tradição do jornalismo deixar que o departamento comercial cuide do caixa. A redação é que cuida das notícias. Foi assim que a democracia avançou.
Muito bem. Leio no Globo que a tal “Mídia Ninja” já está de olho em financiamento público. Caso se investigue a rede de interesses a que essa gente está ligada, o capilé oficial já se faz presente por intermédio da ONG Fora do Eixo, que traz o logo oficial da Lei Rouanet. Reproduzo, em azul, trecho da excelente reportagem de Chico Otávio. Volto depois.
A reunião patinava, sem que os presentes se entendessem sobre o uso ou não de recursos públicos, até que um homem barbudo, de blusa molhada, interrompeu o recinto para anunciar: “Invadimos a Câmara Municipal!” Uma explosão de vivas e aplausos tirou o terceiro encontro da Mídia Ninja (de Narrativas Independentes, Jornalismo e Ação) no campus da UFRJ, na Praia Vermelha, da encruzilhada do impasse.
A novidade, ao ser anunciada na primeira pessoa do plural, seria um escândalo em qualquer redação. Mais ou menos como se um repórter de Política soltasse um “ganhamos a eleição” ou o colega de Esportes festejasse um gol com algo como “vencemos o clássico”. Para os ninjas, porém, não há campo neutro. O movimento que saiu às ruas do país, registrando as manifestações de protesto com transmissões ao vivo, de celulares com acesso 3G (internet de alta velocidade), não esconde seu lado: “Fazemos uma cobertura ao vivo, em tempo real, chapa quente. Nossos atos de jornalismo são multifacetados, parciais, com impressões e avaliações de cada um”, sintetiza Pablo Capilé.
Oficialmente, a Mídia Ninja não tem uma voz de comando. Mas era para Capilé, um mato-grossense de 32 anos que considera o australiano Julian Assange, criador do WikiLeaks, a versão moderna de Jimmy Hendrix, que a atenção dos 80 ninjas presentes à reunião de quarta-feira estava voltada. Fundador da ONG paulista “Fora do Eixo”, de onde saiu a estrutura e a inspiração para o grupo, ele se valia da popularidade conquistada nas transmissões ao vivo para convencer os militantes da necessidade de disputar as verbas federais destinadas à área de Comunicação. Sua defesa, recheada de termos como “midia-livrismo”, “hackear”, “downloadear” e “espraiar”, não foi suficiente para remover desconfianças.
Polêmica entrevista com Paes
Com celulares que mobilizam manifestantes, os ninjas ecoam as vozes das ruas e caçam P2 (agentes secretos da Polícia Militar) nos protestos. Entendem-se como jornalistas. Porém, ao executar suas “pautas” com a paixão de um ativista, confundem-se com os personagens de suas histórias.
Em campo, aproximam seus celulares da ponta do nariz dos policiais e exigem deles respostas sobre o desfecho da manifestação, por exemplo. Quem assiste pela web sente que eles, muitas vezes, provocam a notícia — em vez de apenas revelá-la.
(…)
Retomo
É evidente que isso pode ser qualquer coisa — jornalismo não é. Jornalistas não comemoram invasão de prédios públicos, ainda que, intimamente, possam concordar com ela e até vibrar. Isenção e neutralidade absolutas, reitero, não existem porque, numa democracia, a imprensa livre é um dos esteios da democracia e está comprometida com os seus valores.
Não estou aqui a escrever um texto para tentar demonstrar que o tal Capilé e o tal Torturra não são lá de confiança… Cada um faça o juízo que achar melhor. Meu ponto, reitero, é outro: estou, isto sim, a afirmar que a ética e a estética perturbadas dessa gente estão contaminando o jornalismo que tem compromisso com os fatos, não com a militância; que tem compromisso — ou deveria ter — com os valores de uma sociedade democrática, não com a imposição da vontade de de um pequeno grupo na base do berro.
De volta ao Roda Viva
Mas lá estão os dois representantes da Mídia Ninja numa emissora pública de TV, que é expressão, salvo melhor juízo, daquele estado democrático que os tais ninjas não reconhecem — ou não comemorariam invasões…
As companhias do sr. Capilé, como se pode ver lá no alto, são bastante eloquentes, não é mesmo? Parece que a sua suposta independência se encaixa melhor no figurino petista.
Mas estará hoje no Roda Viva. Vamos ver se assistiremos a uma entrevista de fato. O seu companheiro de programa é o notório Torturra. Já é um conhecido de vocês. Ele ficou encarregado do Twitter quando o entrevistado era o médico Ronaldo Laranjeira, que coordena o programa do governo de São Paulo contra o crack. Torturra é simpatizante do grupo “Existe Amor em SP”, que ganhou um cargo na gestão do petista Fernando Haddad na Prefeitura de São Paulo. Enquanto o entrevistado defendia seus pontos de vista, o tuiteiro o difamava. Agora o rapaz ocupa o centro da roda…
Capilé tem, com efeito, algumas ideias muito interessantes sobre o que é mídia alternativa e coisa e tal. Vejam este textinho singelo postado no Facebook.
A exemplo de Lula e da turma do Foro de São Paulo, ele acha que o Brasil tem o que aprender com os bolivarianos da Venezuela.
Isso é que é ser… alternativo!
05/08/2013
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