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segunda-feira, 19 de dezembro de 2011

A 'marola' da crise já chegou às nossas praias


A
"marola" está chegando às nossas praias e em 2012 a economia brasileira enfrentará muito mais rampa

POR MARCO ANTONIO ROCHA
O Estado de S. Paulo 

A marcha da economia brasileira neste momento indica duas coisas:

1) ela está na banguela e vai despencando;

2) ela já esteve na banguela e anda devagar porque chegou numa rampa, lotada de encargos.

As duas coisas podem ser verdadeiras.

Os números são adversos.

O chamado "PIB do BC" - na prática uma avaliação mensal do andamento do Produto Interno Bruto feita pelo Banco Central e que, projetada, ajuda a estimar o PIB do ano - registrou retração de 0,32% no mês de outubro, em comparação com setembro, pior do que muitos economistas previam.

O fato foi logo atribuído à "crise internacional" por vários comentaristas, mas, na verdade, o gráfico do PIB do BC mostra que ele já vinha caindo, depois de ter alcançado um pico antes do início do segundo semestre.

A queda de outubro apenas foi mais dramática.


E, em virtude dela, a Confederação Nacional da Indústria (CNI), que apostava num crescimento de 3% do PIB em 2011, já cortou sua previsão para 2,8%.

Do alto das minhas humildes sandálias, ouso ir além, ou seja, abaixo: o PIB de 2011, acredito, não deve superar os 2%.


Palpite que só poderá ser confirmado, na melhor das hipóteses, no final do primeiro trimestre de 2012, dado o proverbial atraso das aferições estatísticas confiáveis no Brasil (estão melhorando, estão melhorando!).

Bem, o que está acontecendo na prática é que a economia brasileira parece que hoje em dia está mais "em fase" - como se diz - com a economia internacional, o que não ocorreu na crise de 2008-2009.

Naquela época, houve uma defasagem que permitiu ao nosso guia genial dizer, como todos se lembram, que o que se passava na economia internacional era apenas uma "marolinha" que o Brasil não precisava temer.


Ao perceber que o País teria muito a temer, e que não se tratava de "marolinha", o grande gênio pediu que se improvisassem medidas anticíclicas, que de fato levaram a economia brasileira para fora do desastre.

Mas a diferença principal daquela crise, em relação à atual, é que ela era eminentemente bancária, provocada por excesso de facilitário creditício e inchaço da inadimplência - ou seja, afetava principalmente o setor bancário privado norte-americano.

Nada que o Tesouro ianque não pudesse resolver com gordas injeções de liquidez, como, aliás, acabou fazendo.

A crise de hoje é diferente.

Em primeiro lugar, é "soberana" - para usar esse modismo que esconde que se trata de crise das finanças de vários governos europeus e é resultado, fundamentalmente, da ação de governantes ineptos, demagógicos e covardes, assediados sempre por um sindicalismo altamente predador, tanto do lado patronal quanto do lado do trabalhador.

Aliás, chamar, hoje em dia, de "trabalhador" um europeu com carteira assinada e sindicalizado é quase cuspir na cara dos trabalhadores do resto do mundo.

A grande maioria desfruta de momentos de conversação amena nos locais de trabalho, vigiando a massa de imigrantes não sindicalizados que de fato trabalham.

Os déficits e dívidas monstruosos de vários governos europeus são o que se poderia esperar da falta de competência e coragem - na Grécia, na Espanha, em Portugal, na Itália e onde mais - de resistir aos vorazes comensais das pizzas orçamentárias: aposentados; funcionários públicos; assalariados de empresas públicas; mutuários e beneficiários de benesses governamentais especiais criadas pelos mais diversos títulos; máfias de empreiteiros e de empresas de equipamentos militares; bancos de investimento - enfim, a imensa clientela dos orçamentos públicos (sem esquecer, é claro, dos corruptos de diversos calibres).
Os governos da Europa que 50 anos atrás eram padrão mundial de higidez financeira e fiscal se transformaram na cornucópia de uma derrama praticamente sem limites a desafiar qualquer cálculo atuarial.

A ponto de não poder saber por onde começar para consertar alguma coisa. E a moeda única, o euro, ainda por cima opera como uma espécie de vírus disseminador do quebra-cabeças.

Se juntarmos à desordem financeira a crise maior, que é a da liderança política europeia atual, em que nenhum dos fantoches em movimento exibe o menor perfil do que antigamente se chamava de estadista - e mais se parecem, todos, com anões de jardim -, é fácil prever que essa crise terá longuíssima duração, e nada garante que não se aprofunde ainda mais.

Voltemos ao Brasil.

A população está satisfeita porque está podendo consumir mais e viver melhor.

O governo está satisfeito porque está arrecadando mais e dispõe de um colchão de reservas cambiais e bancárias para usar em caso de baque na economia.

O empresariado está menos otimista do que quando o ano começou, mas ainda aposta em melhorias.

Os políticos cuidam da sua especialidade, que consiste em encher os bolsos e a paciência do público.


Mas a queda do PIB de outubro foi um sinal de que a "marola" está chegando às nossas praias e em 2012 a economia brasileira enfrentará muito mais rampa.
19/12/11

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