Abstraídas “a praia e as medidas masculinas dos quadris femininos”, não havia nada que permitisse distinguir uma época de outra.
Em contrapartida, escancaravam-se as incontáveis semelhanças, começando pela consolidação do fenômeno que, segundo o cronista genial, configurou a mais notável singularidade do século XIX:
“a ascensão espantosa e fulminante do idiota”.
Por Augusto Nunes
Até então, os integrantes da tribo se haviam limitado a babar na gravata.
“O idiota era apenas o idiota e como tal se comportava”, explicou Nelson Rodrigues.
“O primeiro a saber-se idiota era o próprio idiota.
Julgando-se um inepto nato e hereditário, jamais se atreveu a mover uma palha, ou tirar uma cadeira do lugar.
Nunca um idiota tentou questionar os valores da vida”.
Como ocorrera desde o começo dos tempos, decidiam pelos idiotas os que tinham cabeça para pensar e sabiam o que faziam.
Os rumos eram ditados pelos melhores.
As coisas mudaram dramaticamente quando a imensidão de cretinos fundamentais se descobriu majoritária.
“Houve, por toda parte, a explosão de idiotas”, avisou a crônica que, escrita há quase 42 anos, hoje tem cara de profecia.
Neste começo de milênio, a praga que afligiu o século XIX e consolidou-se no século XX assumiu, em território brasileiro, dimensões amazônicas.
Em suas infinitas variações ─ o espertalhão, o otário, o vigarista, o fanático, o farsante, o bobo alegre, o cafajeste, o prepotente, o gatuno ─, os idiotas elegem e são eleitos, nomeiam e são nomeados.
Estão por toda parte.
No nono ano da Era da Mediocridade, a espécie em acelerada expansão é representada no governo e nos partidos da oposição, no Ministério e no segundo escalão, no Congresso, nos tribunais e na imprensa, na plateia que assiste à passagem do cortejo ou nos andores da procissão de espantos que começou há oito anos, não foi interrompida sequer pelas festas de fim de ano e seguiu seu curso no primeiro mês do governo de Dilma Rousseff.
O imenso viveiro de cérebros baldios não se assusta com nada.
De saída, Lula apareceu ao lado de caminhões de presentes que não lhe pertencem, passaportes diplomáticos expedidos ilegalmente para alegrar a filharada e um forte do Exército reduzido a pensão de governantes ociosos.
De chegada, Dilma montou o ministério mais bisonho de todos os tempos, escalou para gerenciá-lo um estuprador de contas bancárias e recolheu-se ao silêncio de quem não tem nada de aproveitável a dizer nem dispõe de ideias para trocar. Só recuperou a voz depois de surpreendida por uma tragédia anunciada em 2008.
Ao fim do passeio pela Região Serrana do Rio, Dilma prometeu fazer amanhã o que Lula jurou ter feito em 2005, solidarizou-se com as famílias assassinadas pela incompetência dos governos federal, estadual e municipal e elogiou o comparsa Sérgio Cabral.
O governador devolveu o elogio, agradeceu a Lula por oito anos de providências imaginárias e debitou o massacre premeditado na conta de antecessores populistas, de São Pedro, do imponderável e dos mortos.
Nesta quinta-feira, em depoimento no Congresso, o secretário demissionário de Políticas e Programas do Ministério de Ciência e Tecnologia, Luiz Antonio Barreto de Castro, implodiu com seis palavras a conversa fiada sobre a catástrofe que até então contabilizava 762 mortos e 400 desaparecidos.
Depois de revelar que não conseguiu incluir no PAC a implantação de um sistema de alerta com radares, orçado em R$ 115 milhões, que ajudaria a prever desastres em áreas de risco, Barreto resumiu o espetáculo do cinismo homicida:
“Falamos muito e não fizemos nada”.
Embora saiba disso há oito anos, a oposição oficial nada fala e nada faz. Há idiotas por toda parte.
Mas também há mais de 40 milhões de brasileiros que continuam enxergando as coisas como as coisas são e contando o caso como o caso foi.
Não é pouca gente.
E a munição é farta, como mostrarão os posts que pretendem retratar em preto e branco o verão brasileiro de 2011.
0 comentários:
Postar um comentário