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sexta-feira, 8 de novembro de 2013

Depredando caravelas



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Por Reinaldo Azevedo

Folha de S.Paulo 

Que bom que os excluídos do mercantilismo, a primeira globalização, não decidiram depredar as caravelas gritando "uhu", "uhu"!

O único mídia-ninja presente ao evento, em espírito ao menos, era Camões, caolho e meio marginal.

Em "Os Lusíadas", ele ouve o "outro lado".

Quem conhece o poema sabe que o Velho do Restelo advertiu os portugueses: "Vai dar tudo errado!" Sempre há um reacionário para rosnar pessimismos.

Depois de flertar com os black blocs, o Planalto anuncia a disposição de enfrentá-los. Sem muita convicção.

É que alguns pensadores estão convencidos de que os mascarados representam a reação humanista à atual fase de dominação do capital.

Marginalizados pelo processo, eles desafiariam com a sua destruição criativa o economicismo sem rosto da nova globalização.

Depois que o socialismo acabou, restou às esquerdas a luta sem classes. Para elas, as vanguardas de opinião, não mais a extinta classe operária, é que portam o futuro, organizadas segundo "ismos" de suposto valor universal.

Marxistas de fato morrem de tédio.

O capital incorporou e sustenta a militância.

O "sedizente" neomarxista Slavoj Zizek pode até emprestar algumas prosopopeias e metáforas aos "ativistas", mas quem financia as causas, aqui e mundo afora, é o multibilionário George Soros.

É fato, não teoria conspiratória.

Há esquerdistas em penca nos institutos culturais dos grandes bancos, por exemplo, mas não em Pequim.

A guerra promovida pelas minorias organizadas se dá na esfera dos valores, é cultural. Seu campo privilegiado de batalha são as redes sociais.

Já os "black blocs" --que, segundo Caetano Veloso, "fazem parte" (sei lá do quê)-- são admirados por sua prontidão para o confronto físico, por seu muque, por sua descrença nas palavras. A truculência desorganizada das ruas seria uma resposta à violência institucional do Estado.

Nesse novo mundo, pode-se ser "fascista" por comer um bife, mas não por rachar cabeças; por se opor às cotas raciais, mas não por depredar o Parlamento; por admitir o uso de animais em laboratórios, mas não por considerar "coisa" o feto humano.

Na quarta-feira, o Instituto Royal, o dos "simpáticos beagles", anunciou o fechamento das portas. Militantes não querem mais que estudantes de medicina treinem traqueostomia em porcos. Médicos teriam de praticá-la, pela primeira vez, em humanos.

Na nova ordem, o homem é o porco do homem.

Nem George Orwell foi tão longe.

Pululam na imprensa candidatos a Jean-Paul Sartre desse humanismo estrábico. Falam de certo "malaise" social, de um mal-estar subterrâneo, de que os baderneiros seriam a manifestação visível.

São obcecados pela tese de que o crime é um sintoma indesejável, mas fatal, da luta por justiça e de que o bandoleiro é só a expressão primitiva do libertador.

Marcola seria, então, um Lênin que cometeu os crimes errados. Voltam-se até contra o PT, mas não por abrigar falanges da intolerância, financiadas com dinheiro público.

Ao contrário!

O partido, advertem, não teria avançado o bastante na agenda dos ditos vanguardistas. Cobram ainda mais intolerância.

Alguém indagaria: "Mas por que o país não pode ser entregue às vanguardas de opinião? Que mal há nisso?"

Quem disse que não?

Era o que Robespierre tinha na cabeça.

Caravelas... Globalizaram a escrita, a matemática, a astronomia, a física...

"Mas também a gripe, a sífilis, a fé, a lei e o rei", gritam os justos.

Ora, também sou justo.

O pecado original foi sair da caverna.

Uhu.
08.11.2013

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