A Dilma da Dilma
Guilherme Fiúza
O Globo
Dizem que agora o governo Dilma vai começar. O Globo
Mas, para que a pressa?
O país já esperou sentado quase seis meses pelo tiro de largada.
Não custa nada dar mais um tempinho para a "presidenta" decidir com que ministros, afinal, pretende governar o Brasil.
Ainda faltam três anos para a próxima campanha eleitoral, dá tempo de sobra.
No auge da crise, Lula disse a senadores do PT que "se tirarem o Palocci, o governo dela (Dilma) vai se arrastar até o final". Tiraram o Palocci, mas isso não é motivo para pânico.
A ideia de um governo que se arrasta não é de todo má. Com a administração pública em banho-maria, sobram muito mais tempo e energia para o que realmente importa: a propaganda ideológica que garante a empregabilidade dos companheiros, a reciclagem de slogans falidos como o Fome Zero (agora Brasil Sem Miséria) e, claro, o lucrativo investimento no fetiche das mulheres no poder.
Neste sentido, a saída de Palocci foi uma bênção. Abriu espaço precioso para a retirada de mais uma coelha da cartola. A nomeação da senadora petista Gleisi Hoffmann como ministra-chefe da Casa Civil vem corrigir um tropeço do destino. Antes da escolha de Palocci, esse cargo estava reservado à inesquecível Erenice Guerra - que com seu instinto maternal acolhera parentes e amigos no banquete da Casa Civil.
Unha e carne com Dilma, Erenice era classificada como "gestora" - na curiosa acepção que esse termo adquiriu a partir do perfil da própria Dilma.
Convém traduzir aos desavisados: "gestora", agora, significa militante partidária que ganhou cargos na burocracia estatal, que não necessariamente sabe fazer conta, mas que se especializou no uso da máquina para mandar nos outros (à base de caneladas) e, eventualmente, fazer dossiês políticos.
Não se sabe se a gestora Gleisi Hoffmann tem toda a tecnologia de uma Erenice, mas cumpre os requisitos essenciais: é célula do PT na máquina pública, é desconhecida, não tem relevância política e, acima de tudo, é mulher.
Dizem que ela chega à Casa Civil para ser a Dilma da Dilma. Não poderia haver definição mais exata. É a invenção da invenção.
Gleisi já começou fazendo tudo certo. Na posse, chorou ao citar o marido, Paulo Bernardo, que é ministro das Comunicações. Era um choro de gratidão. Afinal, o marido ajudou-a a conspirar contra Palocci.
Quando Lula tentava bancar a permanência do ex-ministro, o casal buzinou no ouvido do ex-presidente que Palocci era um homem morto. A causa era nobre: nunca antes na história deste país houve um casal de ministros. Mais uma bonita lenda deste governo que se arrasta de forma revolucionária.
Dilma também chorou ao se despedir do "amigo" Palocci. Essas gestoras que choram são um sucesso. Em meio a tanta emoção, pode-se dizer que o governo Dilma teve o seu final feliz antes de começar.
E há fortes indícios de que esse tenha sido mesmo o fim.
Qual foi a grande discussão que sucedeu à queda de Palocci, o ex-homem forte do governo, de quem tudo se esperava?
Não caia da cadeira: a substituição de Luiz Sérgio por Ideli Salvati na coordenação política.
Se isso não lhe diz absolutamente nada, é sinal de que você está começando a entender a fundo a era Dilma.
Prosseguindo com a análise da conjuntura, não se sabe o que será do Ministério da Pesca sem a gestão da senadora Ideli.
Uma solução possível seria o deslocamento do ministro da Educação para a pasta. Sua defesa do livro ensinando que "nós pega o peixe" o credencia para o cargo (ele nunca defendeu a frase "nós perde o peixe").
Outra opção para ministro da Pesca pode ser Antonio Palocci. Em lugar de "nós pega o peixe", ele ensinaria logo que "nós pega o dinheiro" - difundindo sua experiência de pescaria em terra firme.
Apesar dessa especialidade, o fato é que, nas suas férias como consultor, era Palocci quem dava alguma massa cinzenta ao governo. Lula sabia que deixar a política econômica, por exemplo, nas mãos de Dilma - e tendo um figurante na Fazenda - era abusar do esporte radical.
Na crônica deste governo que não começou, já está registrada a voz solitária de Palocci defendendo os fundamentos monetários e fiscais ante o avanço da companheirada.
Por isso é que, com a queda de Palocci, emergiu como grande assunto nacional a "coordenação política".
O que é isso, afinal?
Tradução ao pé da letra: encher a barriga do PT e do PMDB. Este é o verdadeiro expediente da "presidenta" por trás dos fetiches feministas e slogans reciclados.
É por isso que, na saída de uma grande crise, no momento em que cai uma peça central do governo e o país se pergunta para onde vai, as manchetes falam de Luiz Sérgio.
Quem é Luiz Sérgio?
Luiz Sérgio é a metáfora do vazio, do vácuo político que tomou conta do Brasil, no governo acéfalo de uma "gestora" dedicada a engordar partidos chantagistas para poder fazer nada em paz.
Pobre país que confunde gestão com digestão.
GUILHERME FIÚZA é escritor.
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