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quinta-feira, 9 de junho de 2011

A ANATOMIA DA CORRUPÇÃO

O raio X da corrupção

Veja

Parte 2

Os três órgãos responsáveis por elaborar as tabelas de referência – o IBGE, a Caixa Econômica Federal e o Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes (Dnit) – alegam que elas representam o teto do que o governo pode pagar, e não a média dos preços do mercado. Ocorre que, obviamente, as empreiteiras sempre preferirão – e darão um jeito de fazer valer seu desejo – receber pelos valores de “tabela cheia”.

Há diversos formas de conseguir isso.

A primeira é contar com a conivência de quem organiza a licitação.

Segundo o Ministério Público Federal, foi o que aconteceu na licitação para a construção do trecho da Ferrovia Norte-Sul que corta o estado de Goiás.

O trabalho foi dividido em sete lotes. Havia diversas empreiteiras interessadas em participar da concorrência, mas a Valec, a estatal que cuida da construção de ferrovias, habilitou apenas sete empresas, uma para cada lote. Ou seja, não houve disputa alguma.

Todos os que entraram no certame sabiam que iriam ganhar um lote. Com isso, jogaram o preço lá no alto, cientes de que não seria preciso superar nenhum concorrente.
Quando os envelopes da licitação foram abertos, os preços oferecidos pelas empreiteiras para cada um dos lotes eram apenas 0,5% mais baixos do que o teto previsto no edital, com valores baseados no Sinapi e no Sicro.

O governo pagou 245 milhões de reais apenas pela construção de um dos sete trechos.
Desse valor, concluíram os peritos da PF, 50 milhões de reais foram superfaturados.

A outra forma de conseguir cobrar o preço cheio é adotar o acerto direto entre as empresas – o que se chama, no jargão dos investigadores, de conluio.

Os empresários que vivem de obras públicas se reúnem e acertam quem ficará com cada uma das obras tocadas pelo governo. Um não invade o território do outro e todos ficam satisfeitos.

Nesse tipo de acordo, várias empresas entram em uma licitação para “fazer número”. Mas apenas uma oferece um preço um pouco abaixo do teto das tabelas. Todas as demais extrapolam os valores.

Na contabilidade dos ratos da corrupção, mais vale tocar uma única obra com “tabela cheia” do que conseguir vários contratos com margem de lucro apertada.

Os peritos enfileiram uma relação de mais de uma dezena de obras públicas em que, teoricamente, houve licitação, mas as propostas vencedoras, como no caso da Norte-Sul, ofereciam menos de 1% de desconto em relação ao teto das tabelas.

“Quando não existe competitividade no certame licitatório e o vendedor oferece desconto irrisório em relação ao orçamento de referência, há uma considerável margem ‘legalizada’ para superfaturamento”
, diz o relatório da PF.

Para os investigadores, é dessa margem que as empreiteiras retiram os milhões de reais que doam aos partidos políticos a cada eleição.

Não era fácil entender como as empresas desses ramos conseguiam operar com boa margem de lucro, dentro do limite legal, e ainda despejar milhões de reais nas mãos dos políticos. “A margem oculta de negociação muitas vezes é utilizada para manter organizações criminosas”, crava o relatório dos peritos.

Falar em organização criminosa aqui não é força de expressão.

Depois de ler os relatórios da PF, o Ministério Público Federal abriu um novo inquérito por suspeita de que as empresas teriam cooptado pessoas das equipes que formulam as tabelas oficiais de preços para inflar as cotações.

Nos últimos meses, as descobertas da PF foram compartilhadas com o Ministério Público Federal, o Tribunal de Contas, a Controladoria-Geral da União e a Secretaria de Direito Econômico, ligada ao Ministério da Justiça.

O governo já foi informado do descalabro, mas, até agora, não esboçou reação. Já as empreiteiras se mexeram rápido: antes que o trabalho da PF e a investigação do MP resultem em qualquer medida que venha a ferir seus interesses, elas deram início a um lobby frenético para reajustar os valores do Sinapi e do Sicro. Sim, querem subir ainda mais os já inflados valores de referência.

Uma montanha de verbas públicas está prestes a ser despejada nas obras destinadas à Copa do Mundo de 2014.

Pelos cálculos da PF, dos 24 bilhões de reais que serão gastos no Mundial, 5 bilhões ao menos podem ir pelo ralo da corrupção com a providencial ajuda das tabelas de referência.

O objetivo dos ratos da corrupção é roer o dinheiro público sem deixar rastros.


O do governo deve ser exterminá-los - e acabar de uma vez por todas com essa farra.

06/06/2011

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