Related Posts Plugin for WordPress, Blogger...

sábado, 30 de janeiro de 2010

'A Genealogia da Moral' - Friedrich Nietzsche

A Auto-Destruição da Justiça

À medida que aumenta o poderio de uma sociedade, assim esta dá menos importância às faltas dos seus membros, porque já lhes não parecem perigosas nem subversivas; o malfeitor já não está reduzido ao estado de guerra, não pode nele cevar-se a cólera geral; mais ainda: defendem-no contra essa cólera.

O aplacar a cólera dos prejudicados, o localizar o caso para evitar distúrbios, e procurar equivalências para harmonizar tudo (compositio) e principalmente o considerar toda a infração como expiável e isolar portanto o ulterior desenvolvimento do direito penal.

À medida, pois, que aumenta numa sociedade o poder e a consciência individual, vai-se suavizando o direito penal, e, pelo contrário, enquanto se manifesta uma fraqueza ou um grande perigo, reaparecem a seguir os mais rigorosos castigos.

Isto é, o credor humanizou-se conforme se foi enriquecendo; como que no fim, a sua riqueza mede-se pelo número de prejuízos que pode suportar.

E até se concebe uma sociedade com tal consciência do seu poderio, que se permite o luxo de deixar impunes os que a ofendem.

«Que me importam a mim esses parasitas?

Que vivam e que prosperem; eu sou forte bastante para me inquietar por causa deles...»

A justiça, pois, que começou a dizer: «tudo pode ser pago e deve ser pago» é a mesma que, por fim, fecha os olhos e não cobra as suas dívidas e se destrói a si mesma como todas as coisas boas deste mundo.

Esta autodestruição da justiça, chama-se graça e é privilégio dos mais poderosos, dos que estão para além da justiça.

Friedrich Nietzsche, in 'A Genealogia da Moral'

0 comentários: