O empresário Jacob Barata Filho chega à Justiça Federal para prestar depoimento Gustavo Miranda / Agência O Globo
RIO — Em depoimento à Justiça Federal nesta sexta-feira, o empresário Jacob Barata Filho, conhecido como "Rei do ônibus", admitiu pela primeira vez que os donos de empresas de transportes contribuíam para o caixa dois da Fetranspor com a finalidade de pagar agentes políticos. Segundo ele, a captação desses recursos começou há aproximadamente 20 anos, e o objetivo era contribuir com campanhas eleitorais. O ex-presidente da Fetranspor Lélis Teixeira também prestou depoimento hoje e admitiu a "caixinha" da federação.
Barata Filho não usou a palavra propina para se referir aos pagamentos, que ocorreram, segundo o Ministério Público Federal (MPF), inclusive em anos não eleitorais. Ele disse que não poderia afirmar se houve pagamentos ilícitos, porque quem administrava o caixa e era o responsável pela interlocução com os políticos era o empresário José Carlos Lavouras, que presidia o conselho de administração da Fetranspor. De acordo com Barata Filho, Lavouras tinha toda autonomia.
O empresário afirmou ainda que, depois de 2009, a contribuição dos donos das empresas para o caixa dois da Fetranspor chegava a R$ 6 milhões por mês. Ele disse que não sabia como era a liberação desses recursos para os políticos, se eram em época de campanha ou não. Ele citou que houve repasse de recursos para o presidente afastado da Assembleia Legislativa do Rio (Alerj), Jorge Picciani, e o ex-presidente da Casa Paulo Melo.
— Realmente existia um caixa gerado pela Fetranspor para pagamentos a agentes públicos no sentido de tentar melhorar o sistema de transportes — disse Barata Filho.
O juiz Marcelo Bretas pediu que o empresário explicasse melhor a declaração. Barata Filho afirmou, então, que "existe um pensamento o que é bom para a empresa não é bom para o usuário" ou vice-versa e "é justamente o contrário".
— O objetivo desse caixa da Fetranspor era buscar a satisfação do usuário e evitar projetos que viessem a prejudicar o setor — disse.
Ele declarou que os presidentes da Alerj eram pessoas importantes nesse contexto e que faziam a interface com outros deputados. Sem tratar os pagamentos como propina, disse que os deputados afastados Jorge Picciani e Paulo Melo, ambos do MDB, receberam recursos. Os parlamentares negam o recebimento de propinas.
— Não posso afirmar ser pagamento de propina. Não era eu quem fazia esse acordo com os agentes políticos — afirmou.
Questionado se outros políticos, além de Picciani e Paulo Melo, recebiam contribuições, ele respondeu:
— Com certeza.
Durante o depoimento, Bretas disse que Barata Filho devolveu espontaneamente R$ 80 milhões numa tentativa de reparação de danos. O empresário é réu no processo que está em primeira instância sobre o pagamento de propina de empresas de transporte para políticos. Um segundo processo, com os deputados que têm foro privilegiado, corre na segunda instância.
Barata Filho foi preso no Aeroporto Internacional do Galeão em julho do ano passado, quando tentava embarcar para Portugal. A prisão dele acabou antecipando a deflagração da Operação Ponto Final, que investiga o pagamento de propina dos empresários de ônibus ao ex-governador Sérgio Cabral (PMDB) e a outros políticos.
Ao todo, no ano passado, Gilmar mandou soltar Jacob Barata Filho em três oportunidades. A primeira foi em agosto, revogando decisão do juiz Marcelo Bretas, da 7ª Vara Federal do Rio de Janeiro, no âmbito da Operação Ponto Final. O magistrado, porém, determinou nova prisão preventiva, revogada mais uma vez por Gilmar. Em dezembro, o ministro reverteu decisão do Tribunal Regional Federal da 2ª Região (TRF-2), com sede no Rio, que também tinha mandado Barata para a cadeia como parte da Operação Cadeia Velha, em que foram levados para depor os deputados estaduais Jorge Picciani, Paulo Melo e Edson Albertassi, todos do PMDB.
FILHO DE PICCIANI TAMBÉM PRESTOU DEPOIMENTO
Réu no processo em primeira instância, Felipe Picciani, filho do presidente afastado da Alerj, também prestou depoimento a Bretas. Ele está preso há nove meses. Em delação premiada, o ex-presidente do Tribunal de Contas do Estado, Jonas Lopes, afirmou que foi a uma das fazendas da família Picciani junto com o presidente afastado da Alerj. O ex-presidente do TCE contou que comprou 100 novilhos da raça girolando, por R$ 600 mil. Lopes disse aos procuradores que combinou com Picciani e com Felipe que seriam emitidas notas com valores superfaturados. Por fim, os recibos feitos seriam 24 de R$ 50 mil, o que totalizaria R$ 1,2 milhão, o dobro do valor pago por Lopes.
— Ele (Jonas) devia estar numa enrascada muito grande para me envolver — disse Felipe. — Até hoje, fico meio surpreso.
24/08/2018
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