Segundo a delação premiada do empreiteiro Ricardo Pessoa, negociação do contrato de construção da Usina de Angra 3 serviu para que Valter Luiz Cardeal, diretor da Eletrobras que tem livre acesso ao gabinete da presidente, cobrasse do consórcio de construtoras “doação” à campanha petista do ano passadoPor: Daniel Pereira e Robson Bonin
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SINTONIA – O engenheiro Valter Cardeal, diretor da Eletrobras e braço-direito da presidente no setor elétrico: conluio com o tesoureiro João Vaccari Neto em Angra 3
(Alan Marques/Folha Imagem/VEJA)
Quando era presidente, Fernando Henrique Cardoso cultivou a fama de exterminador de crises, que, dizia-se, sempre saíam do Palácio do Planalto menores do que entravam. De Dilma Rousseff, fala-se exatamente o oposto. Centralizadora e avessa a negociações, a presidente semeou um quadro de recessão econômica e de derrotas no Congresso. Rejeitada por nove em cada dez brasileiros, ela também perde apoiadores no grupo de políticos e empresários que ditam o rumo do país. Até o ex-presidente Lula, seu mentor, lhe faz críticas cada vez mais contundentes. Com apenas seis meses de segundo mandato, Dilma está só, não exerce o poder na plenitude nem consegue mobilizar a tropa governista. De quebra, é acossada por investigações que podem destituí-la do cargo - entre elas, a Operação Lava-Jato, que esquadrinha o maior esquema de corrupção da história do país. Diante de uma conjuntura assim, a maioria dos governantes optaria por mais diálogo, sensatez e pés no chão. Dilma não. Ela reage à crise com argumentações destrambelhadas, otimismo exagerado e erros primários de avaliação. Pior: como de costume, alimenta a agenda negativa.
Na semana passada, a presidente, contrariando o mais elementar dos manuais de política, fisgou a isca dos adversários e abordou novamente em público a possibilidade de enfrentar um processo de impeachment. "Eu não vou cair, isso é moleza", desafiou em entrevista ao jornal Folha de S.Paulo, na qual chamou setores da oposição de golpistas. A resposta foi imediata: "Tudo o que contraria o PT é golpe", ironizou o senador Aécio Neves (PSDB). Nos regimes democráticos, a destituição de um mandatário depende de provas, do aval das instituições e do apoio da opinião pública (veja a reportagem na pág. 54). Em sua defesa, Dilma alega que jamais se locupletou de dinheiro sujo. Falta a essa versão o respaldo inequívoco dos fatos. VEJA teve acesso a mais um testemunho de que propina cobrada em troca de contratos - desta vez, no setor elétrico, a menina dos olhos de Dilma - abasteceu os cofres do PT em pleno ano eleitoral. Os operadores da transação criminosa foram o onipresente João Vaccari Neto, então tesoureiro do partido, e Valter Luiz Cardeal, diretor da Eletrobras, o "homem da Dilma" na estatal e um dos poucos quadros da administração com livre acesso ao gabinete presidencial.
O relato desse novo caso de desvio de verba pública para financiar o projeto de poder petista consta do acordo de delação premiada firmado entre o engenheiro Ricardo Pessoa, dono da construtora UTC, e o Ministério Público Federal. Num de seus depoimentos, Pessoa contou que em setembro do ano passado o consórcio Una 3 - formado por Andrade Gutierrez, Odebrecht, Camargo Corrêa e UTC Engenharia - fechou um contrato para tocar parte das obras da Usina de Angra 3. A assinatura do contrato, estimado em 2,9 bilhões de reais, foi precedida de uma intensa negociação. A Eletrobras pediu um desconto de 10% no valor cobrado pelo consórcio, que aceitou um abatimento de 6%. A diferença não resultou em economia para os cofres públicos. Pelo contrário, aguçou o apetite dos petistas. Tão logo formalizado o desconto de 6%, Cardeal chamou executivos do consórcio Una 3 para uma conversa que fugiu aos esperados padrões técnicos do setor elétrico. Faltava pouco para o primeiro turno da sucessão presidencial. O "homem da Dilma" foi curto e grosso: as empresas deveriam doar ao PT a diferença entre o desconto pedido pela Eletrobras e o desconto aceito por elas. A máquina pública era mais uma vez usada para bancar o partido em mais um engenhoso ardil para esconder a fraude.
A conversa de Cardeal foi com Walmir Pinheiro, diretor financeiro da empresa, escalado para tratar dos detalhes da operação. Depois dela, Vaccari telefonou para o próprio Ricardo Pessoa e cobrou o "pixuleco". "Quando soube que a UTC havia assinado Angra 3, João Vaccari imediatamente procurou para questionar a parte que seria destinada ao PT - o que foi feito pela empresa", relatou o empreiteiro. Aos investigadores, Pessoa fez questão de ressaltar que, segundo seu executivo, foi Cardeal quem alertou Vaccari sobre a diferença de 4 pontos percentuais entre o desconto pedido pela Eletrobras e o concedido pelas construtoras. Perguntado sobre o que sabia a respeito de Cardeal, Pessoa afirmou: "É pessoa próxima da senhora presidenta da República, Dilma Rousseff".Com reportagem de Adriano Ceolin
e Mariana Barros
11/07/2015
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