Por Ricardo Brandt, Fausto Macedo e Julia Affonso Estadão
E-mails apreendidos durante as buscas e apreensão na casa do
presidente do Grupo OAS, José Aldemário Pinheiro Filho, o Léo Pinheiro,
indicam que as empresas do suposto cartel acusado de pagar propina a
altos funcionários da Petrobrás em troca de contratos bilionários
tratava diretamente com a Casa Civil e Ministério da Fazenda sobre as
obras e contratos de seus interesses na área de infraestrutura.
“Acertada, finalmente, com a Casa Civil nossa atuação direta junto
aos diversos ministérios. Casa Civil continuará atuando diretamente no
processo, mas as iniciativas serão nossas. O que nos dá liberdade e
agilidade”, escreve Rodolpho Tourinho Neto, no dia 3 de julho deste ano,
quando já havia sido deflagrada a Operação Lava Jato e as maiores
empreiteiras do País eram alvo notório de investigações da Polícia
Federal.
O autor do e-mail foi ministro de Minas e Energia no governo Fernando
Henrique Cardoso (PSDB), é político ligado ao DEM e atual presidente da
Associação Brasileira de Infraestrutura e Industrias de Base (Abdib).
Entre seus interlocutores estão alguns dos alvos centrais da Lava
Jato dentro do braço empresarial do esquema, principais executivos das
gigantes da construção: o presidente e o vice-presidente da Andrade
Gutierrez, Otávio Azevedo e Gustavo Barreto; o presidente do Grupo OAS,
Léo Pinheiro; os presidentes da Camargo Corrêa, João Ricardo Auler
(Construtora) e Dalton Avancini (Conselho de Administração); o vice
presidente executivo da Mendes Júnior, Sérgio Mendes; o presidente da
Galvão Engenharia, Dário Galvão Filho; e o presidente da UTC Engenharia,
Ricardo Ribeiro Pessoa. Além deles, representantes da Associação
Brasileira de Infraestrutura e Industrias de Base (Abdib)e do Sindicato
Nacional da Indústria da Construção Pesada (Sinicon).
Os e-mails escritos por Tourinho Neto foram interceptados pela PF nos
computadores de Léo Pinheiro, número 1 da OAS, quando ele e outros
executivos foram capturados por ordem judicial. Pinheiro pediu a um
funcionário da empresa que imprimisse o material e o guardasse.
O arquivo de Léo Pinheiro abarca temas como obras, nomes de contatos
nos ministérios da Casa Civil e da Fazenda, bem como indicativos de que o
grupo era consultado por setores do governo antes que decisões internas
fossem tomadas – todas relacionadas a obras de infraestrutura no País. No espaço “assunto”, o autor do e-mail escreveu “Comunicado GT
Interministerial”. Seus interlocutores são 13 executivos das
empreiteiras – a maioria deles a Lava Jato mandou para a cadeia no dia
14 de novembro, quando foi desencadeada a histórica Operação Juízo
Final.
Sétima etapa da Lava Jato, a Juízo Final desmascarou o cartel que,
desde 2004, controlava os negócios mais lucrativos da Petrobrás,
corrompendo agentes públicos para fraudar e fatiar obras na estatal
petrolífera. Atuando em parceria com funcionários graduados da
Petrobrás, nomeados por partidos políticos (PT, PMDB e PP), o grupo
chamado de ‘clube das empreiteiras’ pagava de 1% a 3% para manter seus
contratos bilionários com a estatal.
O e-mail apreendido no arquivo de Léo Pinheiro, da OAS, traz o
apontamento de atuação do grupo na Casa Civil e também no Ministério da
Fazenda. No mesmo e-mail que começa com os registros “Comunicado Ref.:
Acompanhamento de Oportunidades para o desenvolvimento da infraestrutura
brasileira”, Tourinho Neto apresenta informativos referentes aos dias 1
e 2 de julho de 2014.
“Para que o andamento de cada intel do Oportunidades possa ser
acompanhado pelas empresas, pela Abdib e pelo Sinicon, no que couber a
cada um, emitiremos informativos, sempre que houver alguma novidade”,
destaca o interlocutor ao grupo de executivos já denunciados pela
força-tarefa da Lava Jato por corrupção, lavagem de dinheiro e formação
de organização criminosa.
Em um desses informativos, referente ao dia 2 de julho, Tourinho Neto
escreve: “Casa Civil – Valdir Simão e Felipe Borim.” Ambos ocupam
cargos de confiança e foram indicados em 2014 pelo ministro-chefe da
Casa Civil, Aloizio Mercadante. Trata-se de Valdir Moysés Simão,
secretário executivo da Casa Civil, que trabalhava como coordenador do
Gabinete Digital da presidente Dilma Rousseff. Auditor da Receita
Federal de carreira, ele foi secretário da Fazenda do Distrito Federal e
presidente do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS). Felipe Borim
Villen é assessor especial da Secretaria Executiva da Casa Civil.
Entre os temas apontados nos e-mails há tópicos que, pelo teor dos
textos, indicam para a Polícia Federal o acesso a informações
privilegiadas por parte do grupo dentro do governo. No primeiro item,
por exemplo, com o tema “Licenciamento ambiental”, está escrito: “Sendo
preparada Portaria Interministerial para centralizar no Ibama a
coordenação de processo de licenciamento, com determinação de prazos
para cada órgão se manifestar.”
Logo abaixo, em negrito. “Portaria será encaminhada para nossa
avaliação.” Não há ilícitos aparentes no material apreendido, mas a PF
faz uma análise rigorosa sobre todo o conteúdo de correspondências
capturadas nos computadores de Léo Pinheiro e dos outros executivos das
empreiteiras sob suspeita da Juízo Final.
A PF busca identificar os crimes que transcenderam a Petrobrás e quer
averiguar também os contatos que foram mantidos em outras áreas do
governo pelo “clube das empreiteiras”.
Todas as empreiteiras negam prática de atos ilícitos. Os advogados
que representam os executivos aprisionados pela Operação Juízo Final
sustentam que a investigação contém falhas e que as denúncias formais já
apresentadas pelo Ministério Público Federal “são açodadas e não
individualizam condutas”. Os advogados alegam inocência dos empresários.
COM A PALAVRA, A CASA CIVIL DA PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA
A Assessoria de Comunicação Social da Casa Civil da Presidência da República, informou.
“Sempre que necessário o governo conversa com diversos segmentos da
sociedade, por meio de suas representações institucionais, para a
elaboração e aperfeiçoamento das políticas públicas. Não houve e nem
haverá submissão de medidas do governo ao setor. O setor foi
cientificado de alguns aspectos genéricos já consensuados dentro do
governo que vão ao encontro da expectativa de maior celeridade nas
decisões sobre licenciamento.”
“O Sinicon e a Consultoria McKinsey apresentaram à Casa Civil,
Ministérios da Fazenda, Planejamento, Transportes, Minas e Energia,
Cidades, Secretaria Especial de Portos e EPL um estudo sobre “Melhores
Práticas e Oportunidades para Desenvolvimento da Infraestrutura
Brasileira” (formato de apresentação, com 35 páginas). O estudo compara
as boas práticas de outros países para planejamento, regulação,
financiamento e execução de projetos de infraestrutura. O estudo é
datado de 24/02/2014 e pode ser obtido com as entidades responsáveis
pela elaboração do mesmo.”
“Na reunião de 02/07 foi dito ao Sinicon que o estudo subsidiaria a
agenda de aprimoramentos institucionais, já em curso, com o objetivo de
ampliar os investimentos em infraestrutura. Foi dito, ainda, que várias
medidas propostas no estudo já estavam em discussão ou implementação na
referida agenda, entre elas medidas sobre agilização dos processos de
licenciamento ambiental, e que novas boas práticas poderiam
eventualmente ser incorporadas, desde que alinhadas com as diretrizes
governamentais.”
“Foi dito ao Sinicon que somente as propostas constantes do estudo
que estivessem alinhadas com as diretrizes do governo seriam apoiadas.
Foi dito, ainda, que a Casa Civil continuaria participando da agenda de
desenvolvimento da infraestrutura, bem como que eventuais boas práticas
poderiam ser incorporadas na agenda. Não é possível precisar o que o
emitente da mensagem quis dizer com as expressões “as iniciativas serão
nossas” e “os empresários terão maior liberdade e agilidade”, mas pode
referir-se a investimentos de responsabilidade e iniciativa do próprio
setor ou mudanças legais pleiteadas no Congresso Nacional que não
contariam com o apoio do governo.”
“Um dos temas apresentados pelo Sinicon foi o prazo para conclusão
dos processos de licenciamento ambiental. Foi informado ao Sinicon que o
tema já estava em discussão no governo e que a Portaria
Interministerial 419 estava sendo revisada pelos Ministério do Meio
Ambiente, Justiça, Cultura e Saúde. Foram enviados para conhecimento do
Sinicon alguns aspectos genéricos já acordados com os órgãos
licenciadores, relativos aos prazos, para garantir eficiência e
celeridade processual. O inteiro teor da portaria não foi encaminhado,
mesmo porque nem estava pronto. Foi dito ainda que submeteríamos ao
Ministro da Casa Civil a proposta de consulta pública do referido ato,
quando pronto. O tema ainda está em discussão e não foi concluído.”
“O setor manifestou apoiar o texto do PLS 559 e algumas emendas. Ao
analisar as sugestões do setor concluímos que as mesmas não se coadunam
com a visão do governo sobre eventual mudança da 8.666. O PLS, até este
momento, não atende as diretrizes governamentais. O governo está
elaborando proposta de substitutivo ao referido PLS (fato já divulgado
pela imprensa). Essa proposta não foi concluída e não foi apresentada ao
setor. Quando pronta, será amplamente debatida, no âmbito do Congresso
Nacional.”
“Os temas trazidos pelo Sinicon integram a proposta de Pacto pela
Competitividade da Indústria, lançado no dia 19/11 e amplamente
divulgado. A elaboração do pacto conta com a participação de vários
órgão do governo e representação da CNI em oito grupos de trabalho e
contempla ações em 8 grandes temas: Assim que concluída, a proposta de
Pacto será amplamente debatida.”
“Registre-se que a reunião com o Sinicon foi pública e participaram
somente representantes institucionais da entidade. Não houve
participação de empresários do setor.”
COM A PALAVRA, A ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE INFRAESTRUTURA E INDÚSTRIAS DE BASE (ABDIB) Por meio de sua assessoria, a Abdib informou que “não vai se manifestar sobre este assunto”. COM A PALAVRA, O MINISTÉRIO DA FAZENDA “Faz parte das atribuições do Ministério da Fazenda manter reuniões
de trabalho com todos os setores da economia brasileira, inclusive o da
construção civil. É importante lembrar que o governo tem um grande
programa de concessões de infraestrutura, com uma série de leilões já
realizados e bem sucedidos, o que demandou várias reuniões e debates com
representantes do setor. O Ministério da Fazenda participou e continua a
participar desse processo, buscando contribuir para um modelo que
atraia o maior número de participantes nos leilões, reduzindo o custo
para os usuários e contribuintes.” COM A PALAVRA, A ANDRADE GUTIERREZ “A Andrade Gutierrez informa que é associada da ABDIB (Associação
Brasileira de Infraestrutura e Indústria de Base), que tem como um de
seus objetivos gerar discussões entre os setores público e privado na
intenção de fomentar o desenvolvimento da infraestrutura no Brasil.
Dessa forma, considera natural que o presidente da associação em questão
mantenha esse nível de contato exposto pelo email citado. É importante
ainda ressaltar que em um ambiente democrático e de livre concorrência,
em qualquer lugar do mundo, o diálogo entre os diversos setores da
economia e governos ocorre de forma transparente e com o objetivo de
propor as melhores soluções para o desenvolvimento.
Sendo assim, a
Andrade Gutierrez reitera que o documento (email) citado está em total
conformidade com os padrões éticos da sociedade e com a transparência na
qual esse tipo de relação deve ocorrer.
Cabe esclarecer ainda que o Sr.
Otávio Azevedo é membro do Conselho de Administração da ABDIB, o que,
mais uma vez, torna o envio do referido email um procedimento natural
dentro da instituição. Da mesma forma, a empresa lamenta qualquer tipo
de ilação descabida ou caluniosa que possa ser feita a partir desse
documento.”
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